Edwin Lane
(*)
Michiyo
Nishigaki encheu-se de orgulho quando seu único filho, Naoya, conseguiu um
emprego em uma grande empresa de telecomunicações japonesa, assim que concluiu
a universidade.
Naoya
adorava computadores, e o novo emprego parecia ser uma ótima oportunidade
profissional no competitivo ambiente corporativo japonês.
Dois
anos depois, porém, a mãe começou a notar problemas.
"Ele
me dizia que estava ocupado, mas que estava bem", relembra Michiyo.
"Até
que ele veio para casa para comparecer ao velório do avô e não conseguia sair
da cama. Ele me dizia: 'Me deixe dormir um pouco. Não consigo levantar. Desculpe, mãe, mas me deixe dormir",
acrescenta.
Mais
tarde, ela soube por intermédio de colegas que o filho estava trabalhando dia e
noite.
"Em
geral, ele trabalhava até o horário do último trem, mas se perdesse esse
acabava dormindo no escritório", conta a mãe. "Em casos extremos,
trabalhava a noite toda até 22h do dia seguinte, totalizando 37 horas de
trabalho."
Naoya
morreu aos 27 anos, de overdose de medicamentos. Seu caso foi oficialmente
considerado um de "karoshi" - termo japonês para descrever a morte
por excesso de trabalho.
O Japão
tem tradicionalmente uma das jornadas laborais mais longas do mundo, e o
fenômeno não é novo - o "karoshi" começou a ser identificado nos anos
1960. Mas casos recentes têm colocado o tema na pauta de debates no país.
Jornada
No Natal
de 2015, Matsuri Takahashi, funcionária da agência de publicidade Dentsu,
cometeu suicídio aos 24 anos.
Logo
veio à tona a informação de que ela estava em estado de privação de sono e
havia acumulado mais de 100 horas extras nos meses que antecederam sua morte.
Não é
algo incomum, sobretudo entre jovens recém-iniciados no mercado de trabalho,
explica Makoto Iwahashi, funcionário da Posse, organização que dá ajuda
psicológica telefônica para essas pessoas.
Ele diz
que a maioria dos telefonemas que recebe consiste em reclamações quanto a
longas jornadas de trabalho.
"É
triste, porque esses jovens profissionais acham que não têm alternativa",
diz Iwahashi à BBC.
"Ou
você pede demissão ou trabalha 100 horas. E se você pede demissão, você não
consegue viver", acrescenta.
Para
Iwahashi, a redução da estabilidade profissional aumenta a insegurança dos
trabalhadores.
"Havia
karoshi nos anos 1960 e 70, (mas) a diferença é que, ainda que eles tivessem
que trabalhar por muitas horas (naquela época), eles tinham emprego garantido
para a vida. Não é mais o caso."
Cultura da hora extra
Dados
oficiais apontam que há centenas de casos anuais de "karoshi" no
país, incluindo enfartos, derrames e suicídios decorrentes da estafa
profissional extrema. Mas ativistas acreditam que o número real seja muito mais
alto.
Quase um
quarto das empresas japonesas tem empregados que excedem 80 horas extras
semanais por mês - muitas vezes sem ganhos extras -, diz um estudo recente.
E, em
12% das empresas, os funcionários fazem mais de 100 horas extras por mês.
São
números significativos: é a partir de 80 horas extras no mês que se nota um
aumento da possibilidade de morte do funcionário.
O
governo japonês está sob crescente pressão para conter o problema, mas se vê
diante de uma tradição corporativa antiga - quem vai embora do escritório antes
que seus colegas ou seu chefe passa a ser mal visto.
No
início deste ano, o governo lançou as "sextas premium", estimulando
as empresas a permitir que seus funcionários saiam mais cedo - às 15h - na
última sexta-feira do mês. Também incentivam os funcionários a tirar mais dias
de folga.
Os
trabalhadores japonees têm direito a 20 dias de férias por ano, mas atualmente
35% deles não usam nenhum dia sequer.
Luzes apagadas
Nos
escritórios do governo distrital de Toshima, no centro de Tóquio, recorreu-se à
ideia de apagar as luzes às 19h, para forçar os funcionários a irem embora na
hora certa.
"Queríamos
fazer algo de visibilidade", diz o gerente do escritório, Hitoshi Ueno.
"Não se trata de apenas reduzir a jornada. Queremos que as pessoas sejam
mais eficientes e produtivas, para que todos possam resguardar e aproveitar seu
tempo livre. Queremos mudar o ambiente profissional em geral."
O foco
na eficiência pode fazer sentido: enquanto o país tem uma das jornadas laborais
mais longas do mundo, é o menos produtivo entre os países do G7, grupo das
nações mais ricas.
Mas
críticos dizem que tais medidas são muito fragmentadas e incapazes de lidar com
o problema central: que jovens profissionais estão morrendo por estarem
trabalhando muito duro e por muitas horas.
Para
alguns, a solução passa em estipular um limite legal às horas extras.
No
início deste ano, o governo propôs restringir as horas extras a 60 horas
mensais, permitindo que "em períodos de maior demanda" esse limite
subisse a 100 - já na zona de perigo de "karoshi".
Muitos
acusam o governo de priorizar interesses econômicos ao bem-estar dos
trabalhadores.
"O
povo japonês conta com o governo, mas está sendo traído", diz Koji
Morioka, acadêmico que estuda o fenômeno do "karochi" há 30 anos.
Enquanto
o debate avança, mais jovens têm morrido, e grupos de apoio a famílias
enlutadas ganham cada vez mais membros.
Michiyo
Nishigaki, mãe de Naoya, diz que seu país está "matando" sua mão de
obra, em vez de valorizá-la.
"As
empresas focam apenas nos lucros de curto prazo", opina.
"Meu
filho e outros jovens não odeiam trabalhar. São capazes e querem se sair bem.
Deem a eles a oportunidade de trabalhar sem uma longa jornada ou problemas de
saúde, e eles se tornarão um privilégio do país", conclui.
Do
Serviço Mundial da BBC no Japão
(*) Comentário do editor do
blog-MBF: enquanto em alguns países
trabalham demais, em outros nem querem trabalhar.
Por exemplo: num país chamado
Brasil, o Estado emprega 11 milhões de pessoas, sendo que a metade não tem
trabalho, só emprego, sem contar que são os melhores salários do país.
Se não bastasse, essa casta que não
trabalha é quem faz as Leis e as impõem, à revelia de quem trabalha; trabalha, quando
encontra onde trabalhar, pois a atividade econômica não está entre as preocupações
da casta de parasitas entrincheirados no Poder Público.
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