Editorial
Derrota da proposta por um voto, em
comissão no Senado, reflete em parte desgaste de Temer, mas nada justifica o
descaso do Planalto com a votação do relatório
A
rejeição do projeto de reforma trabalhista, por um voto, na Comissão de
Assuntos Sociais (CAS) do Senado, se deve em parte a uma desorganização na base
do governo, em função da debilitação política do presidente Michel Temer sob
acusações — de delatores premiados, da Procuradoria-Geral da República e agora
da Polícia Federal. E isso abre espaço para todo tipo de interesses. Menos o de
melhorar a regulação do mercado de trabalho em que 14 milhões estão
desempregados, e metade dos que labutam não tem proteção da tão defendida CLT,
por simples fé ideológica e saudades de Getulio.
O
senador Renan Calheiros (PMDB-AL), por exemplo, adota a linha populista de
esquerda para tentar se salvar em Alagoas nas eleições de 2018. Já o senador
tucano Eduardo Amorim (SE) vota contra o relatório e o partido, alegando
atender a pedido da mulher, do Ministério Público Trabalhista, uma das
trincheiras contra a modernização das leis. E a oposição, por sua vez,
aproveita para fazer luta política. Assim, por um voto, o relatório foi
derrotado, depois de aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
Semana
que vem deverá ser apreciado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e
tudo ficará para ser decidido em plenário, onde a derrota de terça poderá ser
revertida.
O
governo Temer precisa demonstrar uma competência mínima na condução da base
parlamentar, e não repetir erros primários que depõem contra a imagem de sábios
da política que têm os do seu grupo. Foi bisonho levar na comitiva da viagem a
Moscou votos que fizeram falta na terça: Paulo Bauer (PSDB-SC) e o ministro
Antônio Imbassahy (PSDB-BA). Numa reação previsível, os mercados sinalizaram
negativamente — a Bolsa caiu2%,eo dólar subiu 1,27%. Num lapso, o Planalto
parece ter esquecido a relevância das reformas.
O
projeto desta já foi muito debatido. Sabe-se como é necessário dar
flexibilidade às relações patrão-empregado, permitindo-se que acordos entre as
partes, sem alterar direitos pré-definidos, sejam aceitos pela Justiça
Trabalhista. Também sabe-se como é estratégico acabar com o imposto sindical,
tornando-o uma contribuição espontânea, a fim de que os sindicatos ganhem
legitimidade e deixem de ser um desses grandes cartórios lucrativos que surgem
às sombras do Estado, para viver de dinheiro extraído compulsoriamente da
sociedade.
Por
ilustrativa coincidência, esta reforma chega à fase final de votação quando, na
França, um político jovem, o presidente Emmanuel Macron, faz maioria na
Assembleia Nacional, acenando com uma reforma como esta brasileira, entre
outras. Ganhou no voto de corporações sindicais como as que sabotam mudanças no
Brasil. Faz lembrar Millôr Fernandes: "quando uma ideologia fica bem
velhinha, ela vem morar no Brasil". É o caso.
O Globo
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