Luiz Felipe Pondé
A
política é um circo. Quanto menos você tiver esperança política, menos você se
iludirá sobre a realidade política. O ceticismo em filosofia sempre aconselhou
uma postura mais conservadora e cuidadosa quanto às promessas políticas. Desde
que a política se tornou objeto de fé, passamos a ter expectativas
salvacionistas através da política. E a política não passa da conquista,
gestão, manutenção e distribuição do poder.
Não há
nenhuma dimensão "ética" na política, nem nunca houve. O que há são
sociedades mais ricas em que seus políticos destruíram outras sociedades no
mundo para garantir o aspecto de santos nas suas próprias (e a população goza
dessa santidade na mesma medida).
Eu,
pessoalmente, espero o mínimo da política. Que não nos atrapalhe em demasia,
por isso, que seja mínima.
O erro
crasso de quem espera uma redenção política é não prestar atenção na política
mais próxima dele. É comum grandes canalhas cotidianos agirem de modo
politicamente canalha nas instituições em que trabalham, mas sustentarem um
discurso "ético" na "grande política" (esse mito de
gabinete).
Por
exemplo, mentir, manipular o cotidiano institucional, usurpar ganhos alheios,
destruir carreiras de colegas em universidades, igrejas, sindicatos de classe,
grupos artísticos, corporações de todos os tipos, enfim, fazer política real.
Mas quando se trata de falar da "grande política", enche os olhos de
lágrimas em nome da justiça social.
A
redenção do mundo via política virou um mercado para canalhas específicos.
Pense bem e verá que há um perto de você.
O mundo
não é perfeito, claro. Mas o Brasil parece, nos últimos tempos, trabalhar duro
para destruir nosso cotidiano. O homem é um animal frágil moralmente, sempre
foi e sempre será. Mas vivemos agora, de fato, a ruína moral dos Poderes no
país.
Em
matéria de Poderes da República no Brasil, o Executivo sempre teve vocação
getulista, ou seja, a vocação de ser o "pai ou mãe dos pobres". A
miséria no país sempre foi um importante capital para correntes
coronelistas-populistas como a do PT.
O
Legislativo é a representação perfeita do fisiologismo corrupto. Trabalha para
si mesmo. Basta ver a corrida dos insetos em busca das misérias pós-Temer.
Dane-se a estabilidade econômica. Querem a miserável Presidência por alguns
meses.
A
economia é a única coisa que importa nisso tudo, mas, infelizmente,
semiletrados de todos os tipos pensam que, quando se diz que é a economia que
importa, estamos a defender "O Capital". Chega a ser ridícula a força
desse mito ("Das Kapital") no pensamento.
Não,
"economia" aqui significa que você perde o emprego, deixa de comprar
coisas, e os outros perdem o emprego porque você deixou de comprar coisas.
Estágios são fechados, lojas também. Tudo para de circular. Mas você, que
acredita em Papai Noel, ainda não entendeu que é a economia que sustenta tudo,
inclusive coisas fofas, como os direitos humanos. E o dinheiro nunca foi
produzido pela Chapeuzinho Vermelho.
E o
Poder Judiciário? Esse mesmo que até pouco tempo muita gente pensava ser um
produto real da Marvel. Uma mistura de Batman, Super-Homem, Capitão América,
Homem de Ferro e Thor. Não. O Poder Judiciário não é um monólito de pureza.
Se o
Executivo tem vocação ao populismo, e o Legislativo à corrupção pedestre, o
pecado do Judiciário é a arrogância e a onipotência. Juízes se julgam deuses,
procuradores santos, advogados representantes da ética nacional. Risadas?
Para
ingênuos talvez, mas não para quem já leu mais do que dois livros na vida. O
Poder Judiciário, inclusive, ou principalmente o STF, é também um poder
"político" na medida em que sofre a mesma pressão para articular,
privilegiar, perseguir, em nome dos interesses materiais ou ideológicos de seus
membros.
E em
meio a isso tudo, vem a moçada das diretas já, como num surto de gozo dos anos
1980. Como se a maioria desses (afora os ingênuos) não fossem os fanáticos da
soberania popular "pura" ou não fossem os coronelistas do PT
apostando na ressurreição do seu Drácula de bolso.
Folha de São Paulo
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