Chico
Marés
Em um pronunciamento no Maranhão, a presidente Dilma Rousseff pediu aos
brasileiros que pensassem no país, e não em partidos. É uma escolha de palavras
um tanto curiosa: nos protestos contra seu mandato, é comum ver pessoas
gritando que “seu partido é o Brasil” ou “que sua bandeira é verde e amarela, e
não vermelha”.
Mais que curiosa, a coincidência é reveladora. Por
um lado, há o vazio retórico do nacionalismo. Amarrar uma bandeira do Brasil no
pescoço é a forma mais fácil de fingir se posicionar politicamente sem dizer
nada. Defender o país pode ser derrubar a Dilma para nos livrarmos dos
petralhas, pode ser proteger Dilma para garantir a legitimidade do voto, pode
ser qualquer coisa. Discorda de mim? Tá contra o Brasil. E fim de papo.
Bem mais importante que isso, porém, é o apelo para
a rejeição dos partidos políticos. Não é de hoje que as legendas viraram a Geni
da vida política brasileira. Diga-se de passagem, com toda a razão: é quase
impossível pescar na sopa de letrinhas uma instituição confiável. O problema é
que ninguém parece estar disposto a iniciar uma discussão para solucionar esse
impasse. E sem esse debate, o Brasil vai continuar girando sem rumo entre uma
crise política e outra.
Não há como solucionar a crise política no longo
prazo sem debater o papel e o funcionamento dos partidos. O motivo é simples:
esses clubes privados detêm o monopólio da política formal no país – afinal,
por lei, só se candidata quem é filiado a um deles.
A primeira questão que tem que ser posta é
justamente o monopólio. Afinal, devemos manter um sistema eleitoral no qual
apenas quem é filiado a um partido tenha a chance de colocar seu nome na
disputa? Se não, qual modelo adotar? Em que níveis e para quais poderes?
Seja qual for a resposta, o funcionamento dos
partidos existentes também precisa ser questionado. Na prática, a maioria deles
não representa qualquer projeto de país e funciona como uma federação de
interesses pessoais. Eles operam como uma rede de comissões provisórias em
nível municipal e estadual, efetivamente controlada por um grupo de “caciques”.
As direções dos partidos escolhem, na prática, quem
pode se candidatar e quem não pode, além dos posicionamentos da legenda em
relação a cada esfera de governo. Não é difícil chegar à conclusão de que só se
candidata quem bate continência para o “cacique” e que qualquer projeto de
país, estado ou município é menos importante que a conveniência política de
quem está no comando.
Isso tem tudo a ver com a crise política do governo
Dilma. Por um lado, os arranjos corruptos que o PT fez ao longo dos anos para
conseguir formar uma base aliada – e conseguir a tal da governabilidade – está
na raiz dos desvios revelados pela Operação Lava Jato e no mensalão.
Por outro, a fragilidade da aliança do governo no
Congresso é resultado, em parte, de partidos que escolhem suas posições no
tabuleiro político não pelos programas defendidos pelos governos, mas sim pela
conveniência – ou, melhor dizendo, que se decidem entre situação e oposição de
acordo com a popularidade de cada um dos grupos. É mais fácil pular de galho em
galho quando o partido não tem um programa e não tem vinculação com nenhum
segmento da sociedade civil.
Existem milhares de medidas que poderiam ser
discutidas para melhorar essa situação. No Congresso, porém, apenas pequenas
medidas cosméticas chegaram à pauta da reforma política. Pouco interessa aos
deputados uma reforma sincera em um modelo partidário que foi decisivo para que
tivessem sucesso na política.
Nesse caso, só a pressão da sociedade poderia
iniciar esse debate. Mais que isso: ela precisa iniciar esse debate.
E, de preferência, de forma franca – sem nenhuma
bandeirinha do Brasil servindo de escudo contra o dissenso.
Gazeta
do Povo
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