sábado, 31 de março de 2018

Quanta riqueza é suficiente ?

Stephen Kanitz

Chama atenção como alguns brasileiros perseguem riqueza sem parar, sem limites.

Por quê?
Pessoas como Abilio Diniz, já suficientemente rico, foi se meter numa aventura com a BRF, e perdeu fortuna.
O que mais ele queria que ainda não possuía?

Ou, Marcelo Odebrecht que acabou corrompendo e sendo preso?
Ou, um Sérgio Cabral e a turma do PT que roubaram, roubaram e roubaram dinheiro que jamais poderão gastar.

Quando cheguei aos 51 anos de idade eu alcancei o nível de riqueza que achava suficiente, que garantia tranquilidade, e tudo o que eu precisava para viver.
Era inclusive um objetivo de vida, a independência financeira, valor que eu calculara quando eu tinha 30 anos de idade.
Surpreendi todo mundo largando a edição de Melhores e Maiores aos 50, que eu havia criado e que me dava certa projeção nacional e centenas de contatos.
Passei a fazer o que se espera de pessoas financeiramente independentes.

Passei a ser voluntário e a me dedicar à filantropia.

Criei dois sites, o voluntarios.com.br e o filantropia.org, já no início da internet.
Novato, passei seis meses entrevistando e perguntando aos líderes do terceiro setor o que eles mais precisavam.
Dentre n coisas que eles mencionaram, precisavam urgentemente de reconhecimento público, divulgação do que faziam, projeção nacional.

Isso eu sabia fazer.
Assim, criei nos moldes de Melhores e Maiores, o Prêmio Bem Eficiente, premiando todo ano as 50 Melhores entidades desse país.
O Prêmio se tornou um dos projetos sociais mais eficientes do Brasil, custava R$ 700.000,00 por ano, e as entidades premiadas ganhavam R$ 50.000.000,00 de doações adicionais.

Por que pessoas mais ricas do que eu não fazem o mesmo?
No máximo devotam 2% do seu tempo para causas mais nobres, quando não doam um mísero milhão, e só?

Por que nossa Direita só pensa em dinheiro sem limites, por que nossos Liberais só pensam nos Direitos do indivíduo?

Se Abilio Diniz e Marcelo Odebrecht tivessem se aposentado aos 50 e passado a fazer trabalho filantrópico, descobririam que dinheiro não é tudo na vida.

blog.kanitz

31 de março de 1964 e hoje

Martim Berto Fuchs

Olhando pelo lado econômico, considero que o movimento de 31 de março de 1964 tenha seu embrião em 1956, quando da eleição de Juscelino

Disposto a investir sem olhar para os recursos à sua disposição, Juscelino foi o precursor do nacional-desenvolvimentismo. A construção de Brasília e de outras obras, teve todo apoio do Congresso, sempre disposto a gastança se dela pode participar.

O resultado do governo Juscelino foi a inflação, que estourou no colo do seu sucessor, Jânio, 1961. Este, sem contar com a ajuda do Congresso, avesso a regimes de contenção, tentou o golpe da renúncia para voltar com poderes excepcionais. Não teve respaldo dos militares de então, quem sabe por seu viés esquerdista, pois havia condecorado Che Guevara, e como sabemos hoje, os militares o deixaram esperando no avião em Cumbica, não o chamando de volta.

A inflação, não debelada por Jânio, sobrou para Jango, que mesmo sendo adversário de Jânio, se elegeu como Vice-Presidente (na época o Vice disputava isoladamente), na base da dobradinha Jan/Jan, que iludiu muitos eleitores, principalmente os analfabetizados, sempre em grande número, até hoje.

Os Ministros de Jango apresentaram o Plano Trienal, tanto para debelar a inflação, como para retomar o desenvolvimento. Sofreu severas restrições dos sindicatos laborais e também de parte dos empresários.

Um segundo plano mais moderado foi apresentado e novamente combatido, desta vez violentamente pelo cunhado Leonel Brizola.

Jango era um fraco e cedeu as idéias socialistas de Brizola e outros líderes da esquerda, do tipo Julião. O que começou como um problema econômico, inflação e recessão, transformou-se em problema ideológico, com a entrada em cena dos socialistas e comunistas, sempre dispostos a aproveitar uma brecha para tomar conta de um país.

Em 31 de março de 1964 os militares, nacionalistas mas não comunistas, deram um basta na agitação da esquerda.

Vinte e um anos depois, entregaram novamente o Poder para os civis, mas com uma inflação superior à que haviam recebido em 1964 e o país novamente em momento econômico delicado.

Governo Sarney que os sucedeu foi um desastre completo, tanto que passou a faixa presidencial para Collor, com uma inflação de 4.853% a.a.

Collor tentou, através da sua Ministra da Fazenda, dar um tiro na inflação. Foi um tiro no pé, sem falar que, assim como havia acontecido com Jânio, o Congresso o boicotou, pois mexer com “direitos adquiridos” da nossa “nomenklatura” e com as regalias dos empresários do alto escalão, para eles é crime inafiançável. Foi despedido.

Estamos em 2018 e os problemas que nos afligem são os mesmos;  descontada a inflação, que bem administrada pelo Ministro da Fazenda, auxiliado pelo diretores do Banco Central, e contando com grande auxílio da agricultura, ajudada pelo clima particularmente generoso, está, por enquanto, sob controle.

Digo por enquanto, pois outras medidas que deveriam ter sido tomadas, foram novamente boicotadas pelo Congresso e pouco auxílio tiveram dos empresários do alto escalão. Tanto é verdade, que os marajás do serviço público, amparados pela estrutura perversa que ainda nos amarra, tentam de todas as formas derrubar o atual Presidente da República.

Temos em Brasília o Presidente, 81 Senadores e 513 Deputados. Quantos desses não estão envolvidos em falcatruas para conseguir dinheiro para as campanhas políticas ? Poucos, bem poucos. Os órgãos de fiscalização não sabem disto ? Sabem. Então por que esperam a ocasião propícia para detonar com algum político ?

Tirando os juízes e promotores que giram em torno do Lava-Jato, até prova em contrário isentos, o restante dos poderosos do Poder Judiciário em Brasília, “julgam” de acordo com o réu e com a conveniência dos seus interesses.

Este é o grande desafio para o candidato Bolsonaro. Os militares de 1964 não mexeram com a estrutura de poder monárquico existente no Brasil:

1.Existência de partidos políticos, que não passam de organizações criminosas, sem outra finalidade que não seja o poder pelo poder e as vantagens que isto oferece. Se vendem com facilidade quando é para o Governo gastar dinheiro. Se insurgem, quando é para ser responsável.

2.A existência ainda de um Senado (Casa dos Lordes), que tem a prerrogativa de garantir e manter o status quo Reinante.

3.E a existência de um Supremo Tribunal Federal, com seus membros nomeados pelo Rei/Presidente, “aprovados” pela Casa dos Lordes (Senado), e encarregado de cuidar para que nada deixe de ser o que sempre foi:
uma feliz procura pelos ovinhos de páscoa, mas somente para aqueles que sabem de antemão onde estão “escondidos”.

Ou o candidato Bolsonaro - uma vez eleito-, se propõe a desmontar a estrutura de poder que vem desde o Império, ou perderemos mais esta oportunidade. Tenho consciência que será uma guerra suja, até com risco de vida para ele, sem contar que o mínimo que farão é tentar desacreditá-lo e derrubá-lo de todas as formas.

sexta-feira, 30 de março de 2018

Partidos brasileiros são mais do mesmo e poderiam ser reduzidos a 2, aponta pesquisa de Oxford

Nathalia Passarinho

Uma explicação comum para justificar o grande número de partidos políticos no Brasil é o fato de o país ser grande e heterogêneo. Portanto, várias legendas seriam necessárias para representar os diferentes grupos que fazem parte da sociedade.

Mas não é isso o que mostra uma pesquisa inédita da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e da Fundação Getulio Vargas (FGV), segundo a qual apenas dois partidos já seriam suficientes para representar a sociedade brasileira no Congresso Nacional.

"Tem muitos partidos desnecessários no Brasil, em termos de representação ideológica. Quando um partido é criado, normalmente é para atender a um grupo ideológico pouco representado, dar voz a grupos. Mas não é o que esta acontecendo. Os partidos no Brasil estão sendo criados por outras razões, não para defender bandeiras", afirmou à BBC Brasil o professor Timothy J. Power, diretor do Programa de Estudos Brasileiros da Universidade de Oxford.

Entre abril e setembro do ano passado, Power e César Zucco, professor da FGV, distribuíram a deputados e senadores um questionário com perguntas sobre diferentes temas – de economia e controle fiscal a reforma política e aborto. O levantamento, chamado de Brazilian Legislative Survey (BSL), é feito a cada quatro anos e tem o objetivo de captar a evolução do pensamento do Congresso Nacional desde a redemocratização.

A partir da resposta dos legisladores, os pesquisadores descobriram que as 25 legendas com representação na Câmara têm posições muito semelhantes.

Seria possível dividir esses partidos em dois grupos, um de centro-direita, composto pelo chamado "centrão", além de PP, PSDB e MDB, e outro de centro-esquerda, formado por partidos como PT, PC do B e PDT. O bloco de centro-direita têm hoje 60% das cadeiras na Câmara dos Deputados, e o de esquerda, 40%.

"No campo das ideias, pelos 20 assuntos que a gente mediu, dois partidos são suficientes e representariam razoavelmente e de forma coerente a sociedade. Um seria estaria mais à esquerda e outro mais à direita", disse o professor César Zucco à BBC Brasil.

Power traça um paralelo da distribuição atual de cadeiras no Congresso entre centro-direita e centro-esquerda com o cenário partidário do Brasil em 1979, ainda no regime militar, quando havia apenas dois partidos com representação no Congresso.

"Se você pensar, é parecido com o Brasil em 1979. Tinha dois partidos na época. O Arena (partido governista), com 60% das cadeiras, e o MDB (que fazia oposição ao governo militar), com 40%. Nós vemos a mesma coisa hoje: existem dois grupos, sendo que o de centro-direita tem maior representação no Legislativo", afirma.

A conclusão de que duas legendas já seriam suficientes para representar as posições dos grupos políticos existentes hoje no Congresso indica que a acelerada criação de partidos no país não é estimulada pela demanda de setores por representação, mas sim por estratégias políticas e interesses eleitorais.

"Isso confirma a ideia de que, claramente, esses partidos não existem para representar ideologias e ideias que precisam ser representadas. Eles representam ideias parecidas e existem por questões estratégicas dos deputados e senadores", afirma Zucco.

"Atendem a interesses locais, porque os políticos precisam de legendas diferentes para competir em eleições; a interesses em termos de financiamento, por causa do acesso a recursos partidários; e ao interesse de acesso a recursos dentro do Congresso Nacional, como pessoal, verba, participação em comissões", completa o professor da FGV.

A pesquisa não defende a mudança de modelo político para um sistema bipartidário ou com menos legendas, apenas demonstra que a posição dos 25 partidos que hoje têm representação no Congresso Nacional é similar a ponto de ser possível dividir o Legislativo em dois grupos.

O efeito impeachment: PT mais à esquerda e PSDB, à direita
Além de mapear a posição dos partidos quanto aos principais temas econômicos e sociais, Power e Zucco também mediram a percepção que parlamentares e senadores têm da ideologia das legendas com representação no Congresso.

Os dois pesquisadores perguntaram aos parlamentares onde eles classificariam cada partido político, numa escala de 1 a 10, sendo 1 "de esquerda" e 10, de "direita".

A análise histórica das respostas, captadas desde 1990, demonstra que partidos de centro e centro-esquerda, quando assumem a Presidência, tendem a dar uma guinada à direita, porque precisam fazer concessões a grupos conservadores para governar. Foi o caso de PSDB e PT nos governos dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

Setas mostram trajetória dos partidos, para esquersa ou para a direita no espectro ideológico. PT andou para a "direita" quando esteve na presidência, mas após o impeachment de Dilma deu uma guinada à esquerda | Fonte: BLS

Por causa da enorme fragmentação no Congresso e do excesso de partidos políticos, dificilmente o presidente terá, sozinho, maioria para governar. Por isso, forma coligações com outras legendas, ainda que elas não tenham semelhança ideológica com o partido vencedor da eleição.

No governo Lula, por exemplo, o PT se aliou a partidos de centro-direita e direita, como PMDB, PTB e PP. Nos dois mandatos, o Brazilian Legislative Survey captou um "salto" forte do partido para a "direita" em termos de ideologia.

"Se voltamos aos anos 1990, havia uma polarização no governo FHC por causa das políticas neoliberais adotadas. O PT fazia uma oposição forte a elas. Lula ganhou em 2002 e trouxe o PT e partidos mais de esquerda para o centro", disse Power à BBC Brasil.

Desde o governo Lula, a polarização vinha diminuindo no país. Os levantamentos com parlamentares entre 2002 e 2014 mostram a construção de consensos entre partidos em questões econômicas e sociais, como interferência moderada do Estado na economia, necessidade de responsabilidade fiscal e adoção de programas sociais baseados em transferência de renda – Bolsa Família, por exemplo.

Mas, segundo Power, o impeachment de Dilma Rousseff interrompeu o ciclo de aproximação entre partidos de esquerda e centro-direita.
"Durante o governo FHC, os partidos de esquerda eram mais isolados. Nos anos 2000, eles se aliaram a partidos de centro e centro-direita para permitir a governabilidade de Lula. O impeachment cortou essa aliança."
Com o rompimento dos laços com siglas como o MDB, o PT e demais partidos tradicionalmente vistos como de esquerda, como PC do B e PDT, tendem a voltar às raízes, adotando posições mais "esquerdistas", como maior presença estatal na economia.

"Agora que romperam com a direita, nada os impede de adotar uma ideologia de esquerda mais radical", avalia o professor de Oxford.
Enquanto isso, o PSDB deu um passo largo para a "direita", na percepção dos parlamentares, em comparação com o resultado dos levantamentos de 2014. "O PSDB vem andando para a direita desde que iniciamos o levantamento, em 1990. Mas agora o movimento foi bastante forte", diz Zucco.

"A percepção dos políticos de 'esquerdização' do PT e de 'direitização' do PSDB tem a ver com o impeachment", destaca.

Em que espectro estão os partidos
De acordo com a pesquisa de Power e Zucco, o partido hoje visto entre os parlamentares como mais "de esquerda" é o PSOL, seguido por PC do B, PT e Rede.
Esta é a forma como os deputados e senadores percebem a posição ideológica dos partidos. Os que aparecem mais à esquerda, são vistos como mais esquerdistas, enquanto os mais à direita, foram classificados como mais direitistas pelos parlamentares | Fonte: BLS Survey

O levantamento também captou a ascensão do chamado Centrão, partidos de médio porte que tiveram papel chave no impeachment de Dilma. Juntos, eles formam uma das maiores bancadas da Câmara e são essenciais à sobrevivência do governo Michel Temer.

Fazem parte desse grupo, visto como "de centro" pelos parlamentares, PSC, Pros, PTB e Podemos (visto na tabela acima com a sigla Pode). Classificados como centro-direita, estão MDB, PSDB, PSD e PR.

O partido visto como mais "de direita" é o Democratas, seguido por PP e PSL. O DEM é também a sigla que de forma mais consistente se manteve "à direita" na percepção dos legisladores desde que o BLS começou a ser feito, em 1990.

Com base nas respostas diretas dos parlamentares às perguntas que medem a posição ideológica, é possível dividir o Congresso em dois grandes grupos, segundo o estudo: um de centro-esquerda, composto por PSOL, PC do B, PT, Rede, PDT, PSB, PPS e PV, e outro de centro-direita, com os demais partidos.

O que esses achados dizem sobre o cenário pós-2018?
Em resumo, o Brazilian Legislative Survey captou um Congresso Nacional polarizado. E, embora existam 25 partidos com deputados eleitos, o legislativo poderia ter apenas dois se levada em conta a semelhança entre eles em questões ideológicas.

Embora haja movimentos na sociedade por uma renovação na política, os pesquisadores avaliam que a fotografia atual do Congresso tende a ser reeditada após a eleição de outubro. Com a restrição ao financiamento empresarial de campanha, candidatos dependerão do Fundo Partidário. E quem recebe mais dinheiro são os partidos tradicionais, que elegeram mais deputados em 2014.

O presidente que se eleger precisará, segundo Zucco e Power, captar o apoio de parte do bloco de "centro-direita" – que tem 60% das cadeiras –, principalmente dos partidos que hoje integram o chamado Centrão.
"Vai ter menos renovação do que o espírito das ruas sugeririam. Quem tem acesso ao dinheiro são os políticos que já estão no poder. O próximo presidente vai ter que fazer mais do mesmo. O grupo majoritário (Centrão) é o que dá apoio ao Temer e ele vai ter que ser cooptado pelo próximo governo. Não dá para esperar muita diferença", diz Zucco.

"O presidente que se eleger vai ter minoria no Congresso (por causa do grande número de partidos que devem eleger deputados), dificilmente terá 12% das cadeiras. Para governar, ele vai ter que formar alianças com, pelo menos, seis ou sete partidos", completa Power.

Da BBC Brasil em Londres


A esquerda esquecida de San Tiago Dantas

Cláudio de Oliveira

O presidente da República amplia o investimento público, expande a economia e melhora a renda da população. Desfruta então de alta popularidade. Porém, as contas públicas entram em desequilíbrio, a inflação se acelera e a atividade econômica declina. O presidente empurra os problemas para o seu sucessor, cujas medidas aumentam as dificuldades e levam o país a crises política e econômica. Sem apoio, o sucessor se vê fora do poder. O vice-presidente assume, tenta um ajuste e apresenta um programa de recuperação econômica. Procura um amplo entendimento em torno das medidas, mas elas enfrentam oposição no Congresso e na sociedade.

Essa sequência de acontecimentos nos parece familiar e as personagens poderiam ser o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a sua sucessora Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer. As autoridades econômicas envolvidas na busca de promover o ajuste e a retomada poderiam ser os ministros Joaquim Levy, Nelson Barbosa e Henrique Meirelles. Os leitores que viveram o final da década de 1980 poderiam lembrar que essa sequência de fatos se encadeia também com o presidente José Sarney, o seu sucessor Fernando Collor de Melo e o vice-presidente Itamar Franco. Os ministros que tentaram recolocar a economia nos trilhos poderiam ser uma sequência de nomes como Luiz Carlos Bresser-Pereira, Maílson da Nóbrega e Zélia Cardoso de Melo, até Fernando Henrique Cardoso, o titular da Fazenda que lançou o Plano Real em 1994.

Mas o livro Em busca da esquerda esquecida: San Tiago Dantas e a Frente Progressista, de autoria de Gabriel da Fonseca Onofre, recorda que essa sequência aconteceu bem antes e tem outras personagens: o presidente da República em questão era Juscelino Kubitschek, o sucessor, Jânio Quadros, o vice-presidente, João Goulart e os ministros eram Celso Furtado, do Planejamento, e San Tiago Dantas, da Fazenda. A dupla apresentou em dezembro de 1962, o Plano Trienal, com medidas que, num primeiro momento, buscavam ajustar as contas públicas, cujo déficit havia sido então de 36%. E outras para, no momento seguinte, recuperar a produção nacional, que havia caído de 7,7% em 1961 para 3,5% em 1962, e debelar a inflação de 50,1% do final do ano. Números preocupantes, mas ainda longe da inflação de 4.853% de 12 meses, em março de 1990, quando José Sarney passou a faixa para seu sucessor, Fernando Collor de Mello.

Segundo o livro, o Plano Trienal tinha o “objetivo de estabelecer regras e instrumentos rígidos para o controle do déficit público e o combate à inflação sem comprometer o desenvolvimento econômico”. E “as seguintes políticas eram a base do plano: restrição salarial, limites de crédito e preços e corte nas despesas governamentais. Afetava-se, portanto, interesses de capitalistas e trabalhadores”. Os sindicatos e partidos como PTB, PSB e PCB então se mobilizaram contra o plano, receosos de aceitar restrições salariais em troca de uma incerta expansão da renda no futuro.

Sem apoio tanto de sindicalistas quanto de líderes empresariais, o Plano Trienal é abandonado. Um anos depois, diante do agravamento da crise, o presidente João Goulart pede a San Tiago Dantas a articulação de uma base de apoio parlamentar em torno de um programa de reformas moderadas. Mesmo então fora do governo, San Tiago Dantas propõe a Frente Progressista, uma aliança reunindo o PTB do presidente João Goulart, mais os centristas do PSD de Juscelino Kubistchek, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães, e do PDC de Franco Montoro, as esquerdas representadas pelo PSB de João Mangabeira e o PCB de Luís Carlos Prestes, bem como setores ligados à conservadora UDN. Porém, o acordo foi bombardeado pela Frente de Mobilização Popular, criada em 1962 e liderada pelo deputado e ex-governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola.

Composta pelo Comando Geral dos Trabalhadores, o Pacto de Unidade e Ação (organização intersindical formada por representantes de ferroviários, marítimos e aeroviários e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria), a União Nacional dos Estudantes, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e diversos parlamentares da Frente Nacionalista, a FMP pressionou João Goulart a abandonar a articulação da Frente Progressista.

Com apoio das Ligas Camponesas, de Francisco Julião, deputado do PSB, a FMP pressionou para que o presidente adotasse um programa de reformas radicais, parte das quais reveladas no comício da Central do Brasil, realizado no Rio de Janeiro, em 13 de março de 1964. Foram então anunciadas a nacionalização de todas as refinarias de petróleo, a desapropriação de terras improdutivas à beira de estradas e ferrovias federais e a taxação da remessa de lucros de empresas estrangeiras. Sem apoio para a sua proposta de aliança entre o centro, a centro-esquerda e a esquerda, San Tiago Dantas retira-se da cena pública e dedica-se ao tratamento de um câncer de pulmão. Morreria meses depois. Como sabemos, João Goulart foi deposto pelo movimento civil-militar deflagrado na virada de 31 de março para 1º de abril de 1964.

O professor Gabriel da Fonseca Onofre narra em detalhes toda a trama de acontecimentos que levou ao abandono do Plano Trienal, ao fracasso da Frente Progressista e que desaguou no golpe de 1964. O livro nos conduz a uma reflexão sobre aqueles fatos históricos. Pelas propostas de San Tiago Dantas, talvez o regime autoritário tivesse sido evitado. E quem sabe as crises do impeachment de Fernando Collor de Melo, em 1992, e a do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, não existiriam. Porém, a história se repetiu não como farsa, mas como duas tragédias que nos levaram a fortes períodos de recessão. E o recente, teve uma das maiores retrações: queda de 8,2% do PIB e pico de 14,2 milhões de desempregados. Vale a pena conferir o livro. Na esperança de que nos ajude a evitar nova sequência de acontecimentos semelhantes.

Gilvan Cavalcanti de Melo

quinta-feira, 29 de março de 2018

Jornalista é condenado a 10 meses de prisão por difamar o juiz Sergio Moro

Da Redação
(*)

O jornalista Miguel Baia Bargas foi condenado a 10 meses e 10 dias de prisão no TRF-3 por ter publicado texto que ligava o juiz Sergio Moro a um caso de corrupção na prefeitura de Maringá

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou por unanimidade o jornalista Miguel Baia Bargas a 10 meses e 10 dias de detenção por calúnia e difamação por ter publicado uma matéria com informações inverídicas sobre o juiz federal Sergio Moro. Em 2015, o blog Limpinho & Cheiroso, mantido por Bargas, publicou um conteúdo que ligava Moro a um caso de desvio de recursos na prefeitura de Maringá.

O jornalista publicou em seu blog um texto com o seguinte título: “Paraná: Quando Moro trabalhou para o PSDB, ajudou a desviar R$ 500 milhões da Prefeitura de Maringá”. Ele reproduzia a informação publicada em outro site de que Moro havia trabalhado com um advogado que teria servido ao ex-prefeito de Maringá, Jairo Gianoto – este sim condenado de fato a devolver R$ 500 milhões aos cofres públicos.

O texto faz uma ligação entre Moro e o doleiro Alberto Youssef, um dos condenados pela Operação Lava Jato. O doleiro foi descrito como “laranja” do juiz.

Nem Moro, nem o advogado citado no texto, trabalharam para o ex-prefeito. “É manifesta a ofensa à honra do juiz federal Sergio Fernando Moro, a configurar a prática de crimes tanto pela referência direta quanto indireta ao magistrado”, escreveu o relator do caso, o desembargador federal André Nekatschalow.

“A notícia que atribui ao magistrado a vinculação a partido político e a réu de processo criminal relativo à Operação Lava Jato, em que exerce a jurisdição, claramente ofende sua reputação e, ao imputar-lhe falsamente crimes, patenteia o propósito de ofender sua honra, a caracterizar as práticas de difamação e calúnia”, completou Nekatschalow.

O relator destacou ainda que o réu tenha atuado com o simples propósito de informar. “O réu foi jornalista por anos e, dado o conteúdo da notícia e sua perícia na área, acaso movido pelo desejo de informar, teria adotado cautela mínima de verificação de seu conteúdo, considerando, ademais, haver promovido alteração do título que, expressamente, atribuiu o desempenho de atividade político-partidária e o cometimento de delito a juiz federal”, disse o desembargador.

O cumprimento da pena será em regime aberto.

Gazeta do Povo

(*) Comentário do editor do blog-MBF:  por que em regime aberto ? Este tipo de “reportagem” tem que ser punido com severidade. O ataque as pessoas de bem perpetrado principalmente pelos partidos de esquerda e seus simpatizantes, tem excedido o bom censo e o mais elementar respeito, mesmo em política. Atacam a honra alheia com a maior sem-cerimônia, pouco importando o mal que causam, e isto deliberadamente, de caso pensado, sem contar que tem formação superior, justamente em jornalismo. 10 meses e 10 dias em regime fechado, para aprender a respeitar.


Por que a data da Páscoa varia tanto? Entenda como ela é determinada

Caroline Wyatt

A Páscoa chegou mais cedo neste ano. Será celebrada no dia 1º de abril, enquanto, no ano passado, isso ocorreu no dia 16 do mesmo mês.
Na verdade, desde 2008, essa festa foi comemorada sempre em dias diferentes, com o domingo de Páscoa variando a cada ano entre os dias 23 de março e 24 de abril.

Mas por que não há uma data fixa para a Páscoa?
Segundo afirmava Beda, o Venerável, religioso inglês que viveu no século 7, a Páscoa se dá no primeiro domingo depois da primeira lua cheia após o equinócio da primavera no hemisfério norte (20 de março, em 2018).
"A astronomia está no coração do estabelecimento da data para a Páscoa. (A data) depende de dois fatos astronômicos - o equinócio da primavera e a lua cheia", disse Marek Kukula, astronômo no Observatório Real de Greenwich, em Londres.

Trata-se de um "feriado móvel", e isso se dá graças ao sistema complexo que foi desenvolvido para tentar calcular a Páscoa (e a Páscoa Judaica) a partir do céu, acomodando calendários diferentes.
A data mais frequente para a Páscoa nas igrejas ocidentais tem sido 19 de abril, mas o evento já chegou a cair até em 25 de abril.

O nosso calendário não combina exatamente com os ciclos astronômicos.
"Durante milhares de anos vêm sendo feitos cálculos e ajustes na tentativa de coincidir os calendários artificiais com a astronomia. Mas, exatamente pela falta de uma combinação precisa entre eles, são necessários cálculos complexos para se determinar o dia exato do equinócio e da lua cheia", acrescentou Kukula.

Apesar da famosa briga da Igreja Católica com Galileu, em 1633, por divergências em relação aos estudos de astronomia do físico, os religiosos sempre souberam que era preciso calcular as datas para a Páscoa e os dias santos - e que para isso era necessário recorrer ao estudo dos astros.
Com esse objetivo, a Igreja Católica construiu seu primeiro observatório em 1774.

Mistura
O complicado sistema de determinação da data da Páscoa é resultado da combinação de calendários, práticas culturais e tradições hebraicas, romanas e egípcias.
O calendário egípcio era baseado no Sol, prática adotada primeiramente pelos romanos e posteriormente incorporada pela cultura cristã. O judaísmo baseia o calendário hebraico parcialmente na Lua, e o islamismo também utiliza fases da Lua.
A data da Páscoa varia não somente pela tentativa de harmonizar os calendários lunares e solares, mas também há outras complicações que acabam interferindo, como o fato de diferentes vertentes do cristianismo usarem fórmulas distintas em seus cálculos.

Em 1582 foi criado o Calendário Gregoriano, adotado e promovido pelo papa Gregório para fazer com que a Páscoa caísse mais cedo e fosse mais fácil de ser calculada. Esse é o calendário que usamos até hoje.
Segundo a Bíblia, a morte e ressurreição de Jesus, os eventos celebrados pela Páscoa, ocorreram na época da Páscoa Judaica.
A Páscoa Judaica era celebrada na primeira lua cheia depois do equinócio da primavera no hemisfério norte.

Mas isso levou os cristãos a celebrar a Páscoa em diferentes datas. No fim do século 2, algumas igrejas celebravam a Páscoa junto com a Páscoa Judaica, enquanto outras marcavam a data no domingo seguinte.
No ano 325, a data da Páscoa foi unificada graças ao Concílio de Nicéia.
A Páscoa passaria a ser no primeiro domingo depois da primeira lua cheia que ocorresse após o equinócio da primavera (ou na mesma data, caso a lua cheia e o equinócio ocorressem no mesmo dia).

Domingos diferentes
Mesmo assim, tradições e culturas diferentes continuaram fazendo cálculos distintos para a data.
Um exemplo se deu na Inglaterra, no ano de 664. No reino de Northumbria, o rei Oswiu e sua esposa celebravam a Páscoa em domingos diferentes. O rei observava a tradição irlandesa, e a rainha, a romana. Ela era originária de uma parte do reino que tinha sido evangelizada segundo as tradições romanas, enquanto a cidade natal do rei Oswiu seguia a tradição irlandesa.
Em consequência, um certo ano o rei celebrou a Páscoa em um domingo, mas a rainha ainda estava no período da quaresma. Para acertar a data, o rei convocou um sínodo (assembleia de religiosos) na cidade de Whitby.
Na defesa da tradição irlandesa, estava o bispo Colman de Lindisfarne. São Wilfrid, um nativo de Northumbria treinado em Roma, defendeu a tradição romana.

"Em um ponto crucial do debate, ele mencionou São Pedro, o guardião das chaves do paraíso, que as recebeu do próprio Cristo. E o rei Oswiu, que presidia o sínodo, ficou muito impressionado", disse Michael Carter, membro do Patrimônio Histórico Inglês.
Com isso, a decisão foi tomada a favor da tradição romana.
"O Sínodo de Whitby garantiu que a Igreja na Inglaterra passasse a adotar a prática ocidental padrão. Isso significou a unificação da celebração do mais importante evento do calendário cristão pela igreja inglesa, o dia da ressurreição de Cristo. Isso persistiu no país (...) até a Reforma Anglicana, quando a Inglaterra rompeu com o padrão religioso e cultural da Europa", acrescentou Carter.

Ortodoxos
As tradições ortodoxas dentro do cristianismo continuaram usando o Calendário Juliano em vez de aceitar a reforma do calendário imposta pelo papa Gregório.
As igrejas ortodoxas, portanto, continuaram a celebrar a Páscoa e o Natal em datas diferentes das tradições ocidentais ou romanas.
Mas isso pode mudar? O papa Tawadros 2º de Alexandria, líder da Igreja Ortodoxa Copta, espera que as diferentes vertentes do cristianismo consigam chegar a um acordo sobre essa importante questão.
Pouco depois de reunir-se com ele, Justin Welby, arcebispo da Cantuária (o equivalente ao papa para a Igreja Anglicana), divulgou uma notícia surpreendente em janeiro deste ano: depois de muitos séculos de desacordo, surgiram novas esperanças de que a data da Páscoa possa ser uma data que todos os cristãos celebrem juntos.

"Durante nossa visita ao Vaticano, em 2013, o papa Tawadros falou novamente sobre o tema com o papa Francisco em Roma", disse o bispo Angaelos, bispo geral da Igreja Ortodoxa Copta na Grã-Bretanha.
"Parece haver uma disposição entre parte das lideranças da Igreja Cristã para pelo menos avaliar esta possiblidade."
No entanto, ele admite que o caminho parece ser longo. "A dificuldade é que todos precisam sacrificar algo, pois cada um de nós tem o seu próprio jeito de calcular a Páscoa e calculamos assim por séculos", disse.
Ainda não há um cronograma e o bispo Angaelos afirma que a "tarefa é monumental". "Estamos falando a respeito com muita gente, muitas culturas diferentes, igrejas diferentes e líderes religiosos diferentes. Será uma tarefa monumental. Mas a ideia está lá."

E o que os astrônomos acham de uma Páscoa unificada? "De certo modo, a astronomia ficaria fora da equação", disse Marek Kukula.
"Ainda seria necessário regular o calendário - você ainda precisaria ter anos bissextos e ajustar segundos - mas a Páscoa deixaria de ser um feriado móvel e isto tornaria bem mais simples coisas como o planejamento de feriados escolares. Entretanto, se as pessoas vão querer fazer isso ou não, passa por uma questão religiosa."
E, levando em conta toda a história por trás da data, o debate sobre a questão ainda poderá se estender por muito tempo.

BBC

quarta-feira, 28 de março de 2018

Esquerda deve tirar foco da pauta identitária para ser eleita

Patrícia Campos Mello

Em entrevista, cientista político afirma que causa precisa de menos manifestantes e mais prefeitos

RESUMO. Em entrevista à Folha, autor do artigo político mais lido do New York Times em 2016 defende que a esquerda precisa de menos manifestantes e mais vitórias eleitorais. Ele critica a política identitária abraçada pelos democratas e a falha do partido em conceber visão de país na qual diferentes grupos se reconheçam.

Mark Lilla se tornou o mais odiado dos pensadores de centro-esquerda ao criticar, em artigo no New York Times, em 2016, logo após a eleição de Donald Trump, a política identitária abraçada pelo Partido Democrata.

Para o cientista político e professor da Universidade Columbia, o discurso que enfatiza identidades e isola os eleitores de grupos minoritários é responsável pelas seguidas derrotas dos democratas nos Estados Unidos.

Ao segmentar o eleitorado e customizar a mensagem para hispânicos, negros, mulheres e cidadãos LGBT, os liberais americanos —no sentido que a palavra tem nos EUA, de pessoas de centro-esquerda que defendem atuação do Estado para reduzir desigualdade— teriam perdido a capacidade de formular uma visão de país que atraísse toda a população.

O texto "O fim do liberalismo identitário" foi o artigo político mais lido do jornal naquele ano, e acabou se transformando em um livro, "The Once and Future Liberal: After Identity Politics" (O liberal de então e o do futuro: depois da política identitária), lançado nos EUA em agosto do ano passado pela HarperCollins. Novamente, seu argumento foi recebido com críticas viscerais.

Lilla, que virá ao Brasil para participar de uma das conferências do ciclo Fronteiras do Pensamento, em novembro, diz que se transformou em um elemento "tóxico" para a esquerda, mas dobra a aposta. "Não se trata de parar de lutar pelos direitos das minorias, mas sim de começar a ganhar essas lutas", disse, em entrevista à Folha.

Para ele, uma outra prova de que as políticas identitárias são equivocadas é que líderes autoritários populistas de direita, como Vladimir Putin, o húngaro Viktor Orbán e até o grupo racista americano Ku Klux Klan fazem da identidade sua razão de ser.

• Folha - O senhor afirma que os liberais deveriam abandonar o discurso focado nas minorias para voltar a ganhar eleições. Mas ao fazer isso, os liberais não se arriscam a abandonar a luta pelos direitos das minorias, das pessoas que ainda não têm direitos assegurados?

Mark Lilla - As pessoas interpretaram meu livro da forma errada. Eu não defendo que se abandone a luta pelos direitos das minorias. O sentido de se lutar pelos direitos das minorias é conseguir governar de forma que seja realmente possível proteger esses direitos. Para isso, é preciso ganhar as eleições. Você não vai conseguir proteger ninguém se não vencer, você estará apenas envolvido em um teatro simbólico.

No governo americano, os estados têm muito poder. Por exemplo: no país, existe um direito constitucional ao aborto. Mas, em muitas partes do país, principalmente no Sul e no Sudoeste, uma mulher não consegue fazer um aborto porque os estados impõem muitos obstáculos para os médicos que fazem o procedimento, exigem que as mulheres passem por um período de espera ou se submetam a exames e testes humilhantes.

• Mas as legislaturas estaduais podem fazer isso, mesmo o aborto sendo um direito constitucional?

Sim, porque a Suprema Corte não diz exatamente o que é necessário fazer para garantir que uma mulher tenha direito ao aborto. Então, para proteger os direitos de uma jovem negra no Texas, você precisa ganhar um cargo eletivo naquele estado.

O único jeito de vencer eleições é persuadir texanos, que vivem em um estado religioso, de maioria branca, e para isso é preciso achar uma mensagem que ressoe com eles.

Ou seja, não estou dizendo que nós devemos deixar de lutar pelos direitos das pessoas ou nos voltar para outros grupos. Meu ponto é que os democratas perderam a capacidade de conceber e comunicar uma visão de país na qual pessoas de vários grupos diferentes se reconheçam, e sintam que o programa político é para elas também.

Se você falar em princípios gerais democráticos, como solidariedade e proteção de direitos, isso atinge igualmente o trabalhador branco e a jovem negra que acabei de mencionar.

Mas o problema da política identitária é que ela mudou o foco. Priorizaram a política simbólica de querer reconhecimento, em vez de ganhar eleições. E essa política enxerga o país apenas como uma série de tribos... Então como eles vão conseguir chegar a uma visão geral se eles não acreditam na nação como um todo?

• O senhor acredita que existe o risco de as minorias, que estão acostumadas a serem o foco da mensagem, sentirem-se excluídas se a esquerda passar a ter um discurso mais abrangente?

Eu acho que não. Não estou dizendo que não devemos falar em direitos das minorias, estou dizendo que não devemos falar nesses direitos em termos de identidade.

Tudo o que preciso fazer para ajudar a jovem negra é convencer o eleitor branco de que os princípios de solidariedade e proteção igualitária se aplicam aos dois. O eleitor branco não precisa reconhecer a concepção da jovem negra sobre ela mesma, sobre sua experiência como negra, sobre a história dos negros. Eu só preciso que os dois concordem em relação a um programa político, para que eles consigam nos eleger.

• O senhor é a favor de políticas que tentam mitigar as desvantagens e injustiças sofridas pelas minorias, como ações afirmativas e cotas?

Sim, acho que são um programa de reparações que funciona. Mas eu gostaria que conseguíssemos justificar esses programas para os eleitores brancos.

Hoje em dia, ao darmos a vaga a um estudante negro que não tem nota suficiente para ser admitido, ficará de fora um estudante branco. Mas não vai ser um branco da burguesia, vai ser um branco da classe trabalhadora. E a realidade é que ambos, o negro e o branco de classe baixa, precisam de ajuda para entrar na universidade.

Gostaria que pensássemos em formas de abordar essa questão. Porque hoje, isso ajuda a direita, ao voltar segmentos de baixa renda uns contra os outros.

• O senhor acredita que o fenômeno Donald Trump seja, em certa medida, uma reação à exacerbação da política identitária no país?

Há duas coisas acontecendo neste país. Uma é política eleitoral, a outra é uma espécie de revolução esperançosa na sociedade americana, ligada a minorias, a mulheres, à sexualidade.

Esse movimento é liderado pelas elites do país —nas universidades, em Hollywood, no mundo corporativo. Então Trump atrai as pessoas que sentem que a cultura delas está sendo modificada por pessoas de outra classe social, e elas não têm nenhum poder sobre isso.

Essas pessoas acham que não se trata de uma revolução democrática. E isso abre caminho para que os democratas sejam retratados como esnobes culturais, que desprezam essas pessoas e não estão nem aí para os interesses delas. O maior erro é que a política identitária impediu ativistas de pensar em termos de como se ganha uma eleição, impediu que desenvolvessem uma visão unificadora de país, que também incluiria as pessoas com as quais eles se importam.

Hillary Clinton não conseguiu articular esses temas e ficava constantemente mencionando esses grupos identitários. Ela não conseguiu unir o eleitorado.

• É possível comparar a popularidade de Trump e a ascensão de líderes autoritários populistas, como Vladimir Putin, na Rússia, e Viktor Orbán, na Hungria, como uma reação à exacerbação da política identitária e do politicamente correto?

Pelo contrário. Na realidade, esses líderes também usam a política identitária, por meio da identidade nacionalista. Historicamente, a política identitária era um reduto da direita, seja na Europa na primeira metade do século 20 ou agora, com esses líderes. E Trump também explora isso.

Nesses lugares, não existe a política identitária de esquerda de que estamos falando. Esse é um dos motivos pelos quais estou muito interessado em minha ida ao Brasil, um país multiétnico e multicultural. Quero ver que tipo de tensões políticas isso produz.

• No artigo, o senhor afirma que a Ku Klux Klan foi o primeiro grupo identitário. Mas será que a comparação é válida? A KKK estava tentando eliminar uma minoria, os negros, enquanto grupos identitários de hoje querem apenas conquistar mais direitos, não eliminar o dos outros...

Eu obviamente não estava comparando moralmente a KKK com os grupos atuais. Estava simplesmente apontando que a política identitária branca tem uma longa história nos EUA. E é por isso que os liberais precisam se afastar de políticas identitárias, já que elas representam um risco de reação negativa séria e perigosa. Como estamos vendo hoje.

• Entendo que o senhor enfatize que não está falando em abandono da luta pelos direitos das minorias...

As aspas corretas são: eu quero vencer essa luta. Não se trata de parar de lutar, mas precisamos começar a ganhar essas lutas.

• Neste momento, os Estados Unidos têm um presidente famoso por suas posições ou opiniões misóginas e até racistas. O senhor acha que é um bom momento para abandonar o discurso de defesa dos direitos das minorias?

É exatamente por isso que agora é o momento ideal, porque nós precisamos ganhar. Precisamos vencer, mais do que nunca, porque temos um presidente que se opõe a esses direitos. É o momento exato para começar a vencer eleições, em vez de ficar apenas levantando nossas espadas no ar e nos expressando. É hora de realmente destronar o Partido Republicano.

• O senhor esperava reações tão viscerais ao seu artigo publicado no New York Times?

Não, na verdade, não esperava. Eu escrevi aquilo em duas tardes, estava só desabafando, porque estava frustrado. Não esperava transformar aquilo em livro.

Mas a intensidade da reação na esquerda —uma crítica histérica que não abordava o meu argumento— apenas confirmou minha visão de que a política dos democratas foi simplesmente substituída por uma pseudopolítica de reconhecimento cultural.

• O senhor enxerga um tipo de censura que o impede de questionar se a abordagem da esquerda está sendo eficiente? Katherine Franke, que também é professora na Universidade Columbia, o acusou de tornar a defesa da "supremacia branca" respeitável de novo...

Se eu estivesse diante de um juiz, diria: meritíssimo, "I rest my case" [expressão usada em tribunais, quando se acredita que algo que foi dito prova que a pessoa estava certa]. Essas pessoas apenas corroboram minha tese.

Em relação a Katherine Franke: de todos os professores de Columbia, eu escrevi o livro mais polêmico do ano, e ninguém, nem um único professor da universidade, convidou-me para debater, ou falar para a classe deles, fazer uma palestra. Nada, silêncio completo.

• Na sua opinião, eles estão censurando o debate ou simplesmente não estão interessados?

Eles não querem debater, porque não querem legitimar uma discussão sobre isso.

Independentemente da enxurrada de críticas, o texto foi o artigo político mais lido do ano, tocou em algum ponto nevrálgico.

Houve uma reação histérica de gente que passa o tempo todo no Twitter e acha que apertar o botão "enviar" é um ato político. Mas fiquei muito feliz de também receber retorno de liberais que são muito comprometidos com reformas, mas estão cansados de perder eleições. Eles querem que os democratas ganhem, mas simplesmente não podem criticar a orientação do partido.

Uma líder de veteranos das guerras do Iraque e do Afeganistão me escreveu dizendo que tinha orgulho do país, orgulho de ser lésbica, e que estava esperando que alguém escrevesse um artigo como o meu.

Não apenas essas pessoas não podiam falar sobre esse direcionamento do partido, elas estavam sofrendo bullying. E não conseguiam articular sua crítica, pôr em contexto histórico, que foi o que tentei fazer no livro.

• O senhor mencionou que coleciona os tuítes mais engraçados ou cruéis sobre seu trabalho...

Sim, guardei alguns, os que eram engraçados —intencionalmente ou não. Mandei como cartão de Natal aos amigos, em vez da foto da minha família [há uma tradição nos EUA de mandar uma foto de família com mensagem natalina].

• Qual foi o papel das redes sociais no acirramento da polarização política e da controvérsia em relação ao seu livro?

Eu nunca tinha usado o Twitter. Foi a minha introdução ao pântano. E ficou claro algo que todos já sabem, que as pessoas tuítam um boato sobre um boato de um boato do que diz um livro. Passo muito tempo nas entrevistas corrigindo as pessoas porque elas não leram o livro.

• Como você responde à crítica relacionada ao seu lugar de fala, de que, como homem, branco e heterossexual, o senhor não estaria autorizado ou qualificado para falar sobre direitos das minorias?

Uma argumentação é uma argumentação, não importa quem faça essa argumentação. Quem diz isso está tentando evitar uma discussão.

• O senhor critica o movimento Black Lives Matter, dizendo que é o principal exemplo de como não lidar com a solidariedade, por causa das táticas agressivas de ativismo. Em que sentido o movimento é um desserviço à causa?

A rede Fox News é a única maneira de se comunicar com o eleitor republicano, e ela funciona como um filtro reverso: só deixa passar as coisas negativas sobre os democratas e deixa todo o resto de fora.

Então, se você faz maluquices como os ativistas do Black Lives Matter, que interromperam e acabaram com comícios de Hillary e Bernie Sanders, eles adoram.

Aquilo foi uma insanidade. E ficou passando sem parar na Fox News. Não à toa, Steve Bannon [ex-estrategista-chefe de Trump] disse torcer para que a esquerda continuasse falando em políticas identitárias, porque isso significa que os conservadores vão ganhar, e ele vai poder implementar sua agenda de nacionalismo econômico.

Todas as vezes que ativistas fazem algo desse tipo, eles estão servindo café da manhã na cama para Bannon.

• Os liberais continuam surdos às suas críticas ou há alguns que entendem o que o senhor quer dizer?

Alguns entendem, outros não. Um senador me pediu que conversasse com ele sobre o tema, e alguns arrecadadores de campanha democratas me disseram que estão cansados de perder e querem conversar. Eu tenho várias ideias para a próxima eleição, não sei se serão artigos acadêmicos ou algum outro tipo de contribuição. Mas quero fazer alguma coisa.

• O senhor acredita que, então, houve algum tipo de eco em relação a sua mensagem? Ela não foi em vão?

Com certeza. O argumento agora está presente, a questão é discutida com frequência. Eu também vejo pessoas que se denominam liberais ou de esquerda fazendo o mesmo tipo de argumentação que eu fiz, mas sem mencionar meu nome, claro, porque isso seria tóxico. Mas por mim tudo bem, o importante é a argumentação vencer.

• O senhor se tornou tóxico na esquerda?

Ah, certamente. Ainda bem que tenho "tenure" [estabilidade na carreira acadêmica; é um professor que não pode ser demitido].

• O que o senhor acha do movimento em que estudantes proíbem certas pessoas de fazer palestras nas universidades por questões ideológicas? Trata-se de uma forma válida de combater o chamado discurso de ódio, ou é simplesmente censura prévia?

Nós poderíamos falar sobre combater discurso de ódio, se as pessoas realmente se concentrassem no que é genuinamente discurso de ódio. Mas a definição foi ampliada e hoje inclui qualquer coisa com a qual eu não concorde e que eu não queira ouvir.

• O senhor diz que não precisamos de mais manifestantes, precisamos de mais prefeitos. Não dá para ter os dois?

Eu quis dizer que já temos manifestantes suficientes, e precisamos de mais prefeitos. A única maneira de você subir na hierarquia e virar governador é começar como prefeito ou legislador. É preciso começar a fazer a longa marcha pelas instituições.

Folha de São Paulo

Assunto: Convite


Jorge Serrão

A partir de hoje (27) o Movimento Avança Brasil começou ações cirúrgicas e diárias com os Ministros do STF. Cada dia será um ministro diferente que receberá uma mensagem no e-mail, às 15 horas. Você pode e deve participar desta ação cívica. O papo reto de hoje foi para a ministra Rosa Weber.

Copie o texto modelo abaixo e coloque o seu nome na assinatura da carta e envie para os e-mails relacionados abaixo:

“Sra. Ministra do STF

O julgamento do HC de Lula pautado para o próximo dia 4/4 não pode implicar em revisão da posição consolidada nessa corte de que a prisão em segunda instância não fere a presunção de inocência.

A revisão da jurisprudência em razão de um caso particular é de extrema gravidade especialmente de um cidadão que se julga acima da lei e que já se referiu a este tribunal como “corte acovardada”! 

Não façam os senhores com que se apequene o Tribunal, não se acovardem façam valer a segurança jurídica e preservem a independência da magistratura.

O Supremo tem que se manter digno da posição de corte constitucional e não de balcão de demandas da banda podre da política.

O acovardamento dos tribunais só interessa a tiranetes e ditadores.

E como se sabe o cidadão Lula por mais alto que tenha estado, a lei ainda está acima dele e de todos nós. Sem distinção. Sem privilégios.

Ass. (PONHA SEU NOME AQUI)

Avança Brasil

MINISTRA ROSA WEBER
Telefone: (61) 3217-4236”


Alerta Total – 27/0/18.

terça-feira, 27 de março de 2018

Considerações sobre o plano do economista Paulo Guedes para o candidato Bolsonaro - 7ª parte – “Banco Central”

Martim Berto Fuchs

7 – Banco Central
“Independência de gestão e mandato de quatro anos para a Diretoria, não coincidente com o mandato do Presidente da República”.

A história dos bancos centrais é uma história de amor e ódio. Criados para por ordem na emissão de dinheiro por parte de quem se achava no direito, suscitaram muitas dúvidas quanto a honestidade de propósitos da elite financeira, ou, dos acumuladores de capital, que os estimularam.

Mesmo nos EUA houve uma batalha feroz nos bastidores, tanto na arena política como na financeira, para que um Banco Central fosse aceito.

No Brasil não foi diferente, pois desde a criação da SUMOC em 1945, até a ata de fundação do banco em 1964, o mesmo só passou a operar plenamente em 1988.

Tem seu lado positivo, mas como tudo na vida, depende de quem administra. Se entregar nas mãos de nacionalistas desenvolvimentistas desvairados, para quem, em vez de NÃO compactuar com o desperdício da arrecadação pública em gastos correntes desnecessários, defendem como solução para o investimento a livre emissão de moeda, e depois trabalhar uma “contabilidade criativa”, para tornar a situação palatável.
O certo é que o país enfrentará sérios problemas logo adiante e que não serão os responsáveis pelo desastre que cobrirão o rombo; nem mesmo serão  responsabilizados.
Como de costume, a conta sobrará para a sociedade saldar, via de regra com mais impostos, empréstimos e o consequente aumento da taxa de juros, com a surrada justificativa de combate a inflação, quando na verdade precisam satisfazer os rentistas ressabiados.

Vamos torcer para que a atuação do economista Paulo Guedes como Ministro da Fazenda e responsável pela indicação dos Diretores do Banco Central no governo Bolsonaro, nos encaminhe finalmente para uma economia sustentada, onde os empresários possam investir sem medo de ver a economia desmoronar logo adiante.

http://capitalismo-social.blogspot.com.br/2017/12/10-impostos-taxas-royalties-multa.html

O preço da democracia

Marcus André Melo

Condenado pela Justiça mexicana por vários crimes —além de ligação com o cartel La Família Michoacana—, Godoy Toscano foi eleito para a Câmara dos Deputados em 2009. Foragido por 15 meses, conseguiu escapar do cerco policial, adentrar o recinto da Câmara e tomar posse, recuperando o mandato do suplente e, mais importante, o “fuero”.

No Brasil as imunidades são ainda maiores do que no México, segundo o único trabalho empírico existente sobre o assunto, de autoria de Karthik Reddy (Universidade de Harvard) e coautores. Os pesquisadores construíram um índice de imunidade parlamentar para os 78 países que são considerados democracias.

No Paraguai e na Inglaterra, as imunidades aos detentores de cargos eletivos são, respectivamente, as mais amplas e as mais restritas. O Brasil está muito próximo do Paraguai. A América Latina é a região onde as imunidades parlamentares são maiores: todos os países no quintil superior da distribuição dos escores são dessa região.

Jacques Lambert em 1963 sublinhou a relação inversa entre democracia e imunidade parlamentar. A relação é “endógena”: há mais imunidade onde a demanda é maior!

As imunidades na América Latina foram produto de uma coalizão de interesses associados à defesa do Parlamento contra o abuso de poder, por um lado, e de interesses voltados para assegurar a impunidade das elites quando seus interesses individuais estão em jogo, por outro.

Na medida em que os países se tornam menos autoritários, as questões relativas à “inviolabilidade” do mandato perdem valor e as voltadas para a imunidade enquanto obstáculo à ação do Judiciário adquirem maior importância.

O Brasil vinha em trajetória virtuosa com a aprovação da emenda à Constituição 35/2001, que eliminou a licença prévia para ação penal contra parlamentar. Mais ainda, com a decisão do STF, em 2016, permitindo a execução provisória da pena após julgamento em segundo grau.

Eis que a aprovação do instituto da delação premiada produziu um choque nessa trajetória virtuosa: o risco real para as elites deixou de ser o foro mas a prisão após decisão de segundo grau —condição sine qua non do novo instituto.

Aliança espúria entre garantistas e os que estão interessados em impedir a prisão de Lula a qualquer preço ameaça o equilíbrio. O preço a ser pago por sua liberdade —viabilizada por um casuísmo ou pela derrubada do instituto— é a derrocada do STF.

O precedente é o caso de Ronaldo Cunha Lima, que renunciou ao mandato de deputado (e ao foro), em 2007, quando o STF estava pronto para condená-lo, 14 anos após tentativa de matar o ex-governador Tarcísio Burity. Nunca foi preso.

Folha de São Paulo