quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Por que é tão difícil investigar e comprovar corrupção no Brasil e no mundo

Fernanda Odilla e Nathalia Passarinho

O principal ponto de controvérsia em julgamentos importantes de corrupção, como do mensalão e aquele que confirmou a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na última quarta-feira, é a necessidade ou não de provas diretas sobre o suposto recebimento de propina por um agente público e o uso do cargo para beneficiar quem fez o pagamento.

Corrupção, por natureza, é um crime que se mantém nas sombras. E, quanto mais alta a posição ocupada pela pessoa julgada, menores são as chances de que deixe rastros óbvios dos crimes cometidos. Por isso, um conjunto de provas, que incluem delações e relatos de testemunhas, acaba sendo usado para juntar as peças do quebra-cabeça.

E essa dificuldade em comprovar casos de corrupção não é exclusividade brasileira. Segundo especialistas ouvidos pela BBC Brasil, encontrar provas diretas de propina, especialmente quando há políticos e empresários poderosos envolvidos, é um "desafio global".

Os mais críticos, contudo, afirmam que interpretações baseadas em evidências indiretas podem ferir a presunção de inocência e trazer riscos ao devido processo legal.

"Parte da dificuldade de análise acadêmica e também jurídica é justamente a coleta de dados. No caso da corrupção, o desafio é coletar evidências de links causais do tipo A pagou B que passou para C que, por sua vez, se beneficiou de algo", observa o pesquisador brasileiro Armando Martins de Castro, da universidade britânica London School of Economics (LSE),
Enquanto pesquisadores normalmente usam medidas que se baseiam na percepção da corrupção ou experimentos para medir níveis de tolerância ou como as pessoas se comportam em determinadas situações, policiais, procuradores e juízes têm se fiado cada vez mais no relato de colaboradores para tentar coletar indícios.

Rede complexa de corrupção
O professor Alamiro Velludo Salvador Netto, do Departamento de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP), destaca que as práticas de corrupção ganharam sofisticação ao longo do tempo.

Grandes corporações, com divisão de tarefas internas, passaram a adotar práticas corruptas, inclusive com ramificações no exterior, aponta ele.
"Hoje o fenômeno da corrupção não é só aquele do particular com o funcionário público, com uma repartição clara de benefícios. Temos grandes empresas com divisão de tarefas. E, na medida em que essas empresas são grandes, há também uma infiltração internacional", destaca.

"É muito diferente do pagamento ao guarda de trânsito. A corrupção envolve, às vezes, compras internacionais, obras internacionais, e tudo isso leva a uma dificuldade maior na identificação dos atores."

O pesquisador Martins Castro, da London School of Economics, destaca que esquemas "mais sofisticados de corrupção têm intermediários, que usam offshore (empresa ou conta aberta em um território com menor tributação) e contas secretas para receber e fazer pagamentos", o que dificulta identificar os reais beneficiários do dinheiro e os mandantes.

"Se não tiver um colaborador ou um denunciante, fica quase impossível rastrear empresas de fachada usadas normalmente para fazer transferências em poucas horas e em jurisdições onde não há obrigatoriedade de se revelar quem são os titulares das contas ou o dono do dinheiro", completa o pesquisador, que também leciona no departamento de administração da LSE.

'Nenhum político inteligente deixa rastro'
Para Matthew M. Taylor, professor de política da American University, em Washington, em "lugar nenhum do mundo é fácil comprovar corrupção entre autoridades graduadas".

"Nenhum político inteligente que pratique corrupção permitiria deixar rastros claros do crime," diz Taylor, também pesquisador do Woodrow Wilson Centre, na capital americana.

Por isso, alguns tribunais deixaram de exigir a existência comprovada de um "ato de ofício" concreto por parte do agente público em troca da vantagem indevida que recebeu.

Isso aconteceu no julgamento do mensalão, em 2012, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou o entendimento de que a oferta da vantagem e o aceite por parte do funcionário público já caracterizam o crime de corrupção.

Taylor defende que, na falta de uma prova que aponte um "link direto", é possível justificar uma condenação a partir da existência de uma "preponderância" de evidências que apontem para o crime de corrupção.
"É importante compreender que os julgamentos de casos de corrupção, muitas vezes, precisam se fiar numa preponderância de evidências. Não há, normalmente, um quid pro co, uma clara troca de um benefício por outro, mas sim evidências que, juntas, apontam para a ocorrência do crime", diz.
Para o professor Alamiro Velludo Salvador Netto, da USP, no caso do Brasil, seria necessária uma mudança no Código Penal brasileiro para permitir condenações sem a comprovação de um ato concreto do agente público direcionado a retribuir a propina.

"Esse tipo de construção demanda uma alteração legislativa. No caso brasileiro, temos dificuldade em fazer isso, porque os dispositivos que tratam de corrupção fazem referência direta aos atos de ofício", diz o especialista em Direito Penal, que discorda da interpretação atual do Supremo.

"Outros países já superaram isso na legislação. Compete ao Parlamento rever se, para tornar efetivo o combate da corrupção, é adequado ou não suprimir o ato de ofício ao condenar", defende.

Ocultação do dinheiro
Outro argumento usado pela defesa do ex-presidente Lula no processo em que foi condenado é o de que o Ministério Público não foi capaz de identificar o chamado "caminho do dinheiro", ou seja, a relação entre o dinheiro usado pela OAS para as reformas do tríplex e recursos desviados de contratos da Petrobras.

Essa dificuldade em especificar claramente o "trajeto" e origem dos recursos usados em trocas de propina existe em grande parte das investigações de esquemas de corrupção no Brasil e no mundo, apontam os especialistas ouvidos pela BBC Brasil.

Sem citar o caso do ex-presidente, Martins de Castro, da London School of Economics, explica que dificilmente dinheiro da corrupção aparece como tal na contabilidade das empresas.

"O dinheiro da corrupção normalmente não é colocado em balanço de empresa. Algumas empresas da Lava Jato, por exemplo, afirmaram que pagavam propina por meio de consultorias", diz o pesquisador, que se dedica a pesquisar corrupção, com foco nas empresas, mas sempre observando a interação do mundo privado com o público.

Além disso, ressalta ele, assumir o envolvimento com casos de corrupção compromete a imagem das empresas e assusta acionistas. Isso seria mais um motivo para manter oculta ou tentar dar fachada legal a transações ilícitas.

O uso de delações como meio de prova
Na Lava Jato, a atuação do Ministério Publico e do Judiciário também tem sido alvo de polêmicas pelo amplo uso de delações de investigados interessados em reduzir as próprias penas.

O ex-procurador italiano Raffaele Cantone, que atuou na investigação da máfia Camorra, destaca que, no crime de corrupção, normalmente não há "conflito de interesses" entre os criminosos envolvidos. Portanto, as provas costumam ser eficientemente ocultadas, o que torna o mecanismo da delação essencial para a investigação, segundo ele.

"A descoberta da corrupção só surge através desses mecanismos (de colaboração), porque, por sua natureza, não há conflito de interesses que possa tornar esse crime público", diz Cantone, que é atualmente presidente da Autoridade Nacional Anticorrupção da Itália, órgão administrativo responsável pela supervisão das medidas de prevenção.

"A corrupção é baseada na omertà (o silêncio cúmplice típico da máfia). Se não criarmos uma vantagem para quem optar por colaborar, enviamos a mensagem ao corrupto de que vale à pena tentar. Como ganhamos da máfia na Itália? Através do sistema de colaborações. Os criminosos passaram a não se sentir mais invencíveis. É uma escolha utilitária, mas fundamental."

É possível confiar no delator?
O professor de Direito Penal da USP Alamiro Velludo Salvador Netto também destaca o caráter "secreto" do crime de corrupção.

"Na medida em que eu não tenho uma vítima concreta, todas as pessoas que participam do delito estabelecem uma lógica comum de ocultá-lo."
As delações, portanto, servem como instrumento para estimular a quebra desse "contrato de sigilo". Mas, para Netto, a colaboração de suspeitos só serve como ponto de partida para as investigação e para facilitar a obtenção de provas, não para embasar condenações.

"Não nego que é um meio de obtenção de prova útil. O problema é saber até que ponto a palavra do delator tem força. Ele vai receber benefícios na exata medida da informação que der. Então, no afã da obtenção de maiores benefícios, ele vai tentar falar tudo o que sabe e talvez até o que não sabe", argumenta.

Salvador Netto defende ainda que as delações sejam oferecidas de forma estratégica, com a finalidade de penalizar os chefes das organizações criminosas. Para ele, a possibilidade de firmar delações está sendo oferecida de forma indiscriminada no âmbito da operação Lava Jato.

"Vejo que as colaborações são oferecidas para um número indistinto de pessoas. Às vezes, as mesmas operações têm diversos colaboradores. Não se sabe nem mais quem é réu e quem é colaborador. E os benefícios oferecidos ultrapassam os previstos na lei."

Provas no caso Lula
No caso do julgamento de Lula, a defesa do ex-presidente argumentou que o Ministério Público baseou as acusações em delações de colaboradores, principalmente de ex-executivos da construtora OAS.

O petista é acusado de receber, a título de propina, um apartamento tríplex no Guarujá. Em troca, teria atuado para beneficiar a OAS em contratos com a Petrobras.

Para o professor Taylor, da American University, os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que condenaram Lula a 12 anos e um mês de prisão, se dedicaram em demonstrar que basearam a decisão em um conjunto variado de evidências que se complementam e que incluem provas documentais, relato de testemunhas e delações.

"Não há um quid pro quo, uma troca clara de um benefício específico pelo apartamento. Mas o tribunal procurou responder a isso mostrando que havia uma preponderância de evidências de diferentes fontes, incluindo documentos relacionados ao apartamento e a nomeação de diretores da Petrobras", diz o pesquisador, que é autor de três livros sobre corrupção, sistema judicial e política brasileira.

O professor Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais, salienta que a coleta de evidências relacionadas a crimes de corrupção tende a ser mais complexa, justamente pela natureza oculta das transações.

"Em diversos casos você não tem a prova material, mas o conjunto probatório aponta para uma mesma direção", avalia o professor, que pesquisa e já organizou livros sobre corrupção.

Na avaliação de Avrizter, contudo, isso não aconteceu no caso do ex-presidente. Ao contrário do que pensa Taylor, para o professor da UFMG "não existe um conjunto probatório para uma direção" que aponte que o tríplex foi entregue a Lula e reformado para atender a exigências dele como pagamento de propina.

Novas discussões
Na avaliação de Martins de Castro, a Lava Jato em alguns casos tem adotado determinados posicionamentos similares ao chamado "direito comum", ou "common law", que teve origem na Inglaterra.

No direito inglês, um juiz se baseia na jurisprudência, ou seja, em interpretações de decisões anteriores, e em costumes comuns. As decisões são tomadas por um juiz por meio da troca de argumentos e provas apresentados por defesa e acusação, sem a necessidade de ter normas pré-definidas escritas.

O sistema jurídico adotado pelo Brasil é diferente. Chamado de "civil law", segue leis e uma série de códigos e regras escritas. Assim, o que não está especificado no texto não pode ser tido como ilegal.

No caso de corrupção, o Código Penal brasileiro tem, segundo especialistas, uma descrição restrita. Pelo texto da lei, limita-se na forma passiva a solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem ou promessa de vantagem indevida. E, na forma ativa, oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público.

"Julgamentos como o do Lula abrem caminho para novas discussões tanto no Legislativo quanto no Supremo sobre a forma como se segue e interpreta as leis no país", afirma Martins de Castro, dizendo que ao aplicar elementos do "common law" em países como o Brasil pode gerar insegurança jurídica.

Com colaboração de Alfredo Spalla, em Roma.

BBC Brasil em Londres


A deriva para o centro

Luiz Carlos Azedo

O PT fracassou porque o poder levou seus quadros à cooptação patrimonialista e à adesão ao programa que havia dado errado no governo Geisel

A crise ética, o impeachment de Dilma Rousseff e a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em segunda instância, a 12 anos e 1 mês de prisão em regime fechado, levaram a liderança petista a realizar um movimento de “esquerda, volver!”, na esperança de reagrupar forças para tentar sobreviver. Já não se trata de voltar ao poder, com Lula na Presidência, porque esse projeto se inviabilizou.

É sobrevivência mesmo, inclusive para alguns dos que mais se destacam na narrativa do “golpe” e da “fraude”, como a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman (PT-PR), e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que deverão deixar o Senado e disputar uma cadeira na Câmara. A estratégia é transformar Lula numa vítima da “ditadura do Judiciário”, organizar uma suposta “resistência democrática” e, com isso, reagrupar forças políticas e sociais, como o PSol e o MST, que haviam se descolado do projeto petista por seu “transformismo” numa “frente de esquerda” pela democracia entre aspas.

O conceito de “transformismo” foi cunhado por Karl Marx no livro O 18 de Brumário, de Luís Bonaparte, que analisa a crise política que levou à restauração da monarquia na França, no período que vai de 1848 a 1851. No calendário da Revolução Francesa, a data corresponde ao 9 de novembro do calendário gregoriano. Foi escrito nos meses de dezembro de 1851 e março de 1852, originalmente para um semanário político de Nova York, que fracassou com a morte prematura de seu editor, Joseph Weydemier. Os artigos foram publicados pela revista Die Revolution.

Nessa época, o jovem Marx, como nos mostra o filme em cartaz assim intitulado, sobrevivia dos recursos que ganhava como jornalista e escritor. O livro começa com uma frase que se tornou lugar-comum: “Hegel observa, em uma de suas obras, que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Tem tudo a ver com o que está acontecendo com o PT.

Destaca Marx logo no parágrafo seguinte, também famoso: “Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. De nada adianta, agora, os petistas buscarem “os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens”, sem fazer uma autocrítica dos erros tremendos que cometeram quando estavam no poder.

Aggiornamento
É que a passagem de Lula pelo poder e a de Dilma não representaram um “aggiornamento” político. O termo italiano significa atualização e foi consagrado pelo papa João XXII no Concílio Vaticano II. O “transformismo” é outra coisa: significa uma mudança ditada pelo pragmatismo e pelo oportunismo, no qual um determinado partido e sua representação parlamentar se descolam da base social que lhes deu origem e passam a cuidar dos seus próprios interesses. Foi isso o que aconteceu com os partidos na crise francesa que levou à ditadura do sobrinho de Napoleão, dando origem a um outro conceito muito conhecido: “bonapartismo”. De certa forma, até corremos o risco de um governo bonapartista após as eleições de 2018.

Não é preciso chover no molhado e tecer detalhes do fracasso petista, mas é importante assinalar que a tentativa de renascer das cinzas com o velho discurso radical, nacional-libertador, é uma farsa política que dará com os burros n’água. A deriva petista para o centro fracassou porque a chegada ao poder levou seus quadros à cooptação patrimonialista e à adesão a um programa que já havia dado errado no governo Geisel, durante o regime militar. Não foi um aggiornamento verdadeiro, no qual o maior partido de esquerda do país, surgido da transição à democracia, houvesse se atualizado programaticamente. Isso tem um preço, simples assim.

E o que aconteceu com a esquerda moderada, socialdemocrata, que confrontou o PT e apostou no impeachment de Dilma? Está diante do mesmo problema, precisa se atualizar programaticamente, com autocrítica e revisão teórica, e não apenas aderir a teses ultraliberais por pragmatismo político. Esse é outro tipo de “transformismo” que contribui para a fragmentação das forças de centro do espectro político porque não há uma real convergência com os liberais em termos de construção de um novo projeto democrático para o país. A ultrapassagem da crise de financiamento do Estado brasileiro e a construção de um novo consenso nacional pressupõe um programa exequível de governo, em sintonia com a sociedade, e não com as forças que ainda se locupletam do velho patrimonialismo.

Correio Braziliense


terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Macri reage à piora de humor dos argentinos e corta 25% dos cargos de confiança

CARLOS E. CUÉ
(*)

Presidente argentino congela salários do Governo e proíbe contratação de familiares

Mauricio Macri, presidente da Argentina, teve um começo de ano muito mais complicado do que o esperado. A oposição, muito enfraquecida, tenta ganhar forças. O ano de 2017 terminou com uma polêmica reforma da Previdência que provocou graves confrontos entre manifestantes e policiais no Congresso — desde então, a satisfação dos argentinos com os rumos do país caiu 14 pontos. O dólar sobe desde então, algo que sempre assusta os argentinos. E a inflação não dá trégua, com novos aumentos das tarifas de energia elétrica, combustíveis e saúde privada. Neste contexto, o presidente argentino estava perdendo popularidade nas pesquisas e decidiu frear essa sangria com um gesto simbólico: congelou seu salário e o de cerca de 500 funcionários do alto escalão — o que equivale a uma forte redução de salário em um país com uma inflação de 25% —, ordenou a demissão de 25% dos cargos de confiança do Governo e proibiu que ministros tenham familiares trabalhando no Executivo.

A decisão responde especialmente à polêmica causada pelo ministro do Trabalho, Jorge Triaca, que tem parte de sua família em cargos de confiança no Executivo, algo que acontece também com outros ministros.
Alguns meios de comunicação pressionaram para que Macri fizesse uma mudança no Governo e demitisse Triaca, que também se envolveu em um escândalo ao confirmar que havia contratado uma empregada doméstica sem carteira assinada, mas a resposta do presidente foi diferente. "Sei que vamos perder colaboradores muito valiosos [com a decisão de proibir a contratação de familiares], sinto muito, mas queremos transparência.

Espero que este exemplo seja seguido por todos", disse Macri como mensagem sobretudo aos governadores.

Na Argentina, é costume colocar toda a família na administração, e são frequentes nas províncias casos de irmãos que se alternam na presidência, como em San Luis, ou casais que cobrem todos os cargos-chave. O macrismo chegou ao Governo com a mensagem que acabaria com essas tradições peronistas, mas alguns casos nos últimos meses mostraram o contrário. Macri, que desperdiçou nessas semanas parte do crédito que conseguiu com a última vitória eleitoral em outubro, pretende com este começo de ano enviar a mensagem de que está disposto a dar exemplo. Sua própria família, uma das mais ricas do país, está no centro de polêmicas sempre que o conglomerado Macri aparece como beneficiado em uma licitação ou uma decisão do Governo. O presidente argentino parece disposto a acabar com os arranhões em sua imagem.

O presidente, que acaba de voltar de uma viagem a Davos, Rússia e França, começou o ano com força e uma mensagem de resposta a todas as análises políticas e pesquisas publicadas nas últimas semanas, nas quais foi instalada a ideia de que Macri já assumiu que é impossível fazer uma mudança profunda naArgentina e se limitará ao pragmatismo de modificar o que for possível, sem procurar grandes reformas que desagradem os sindicatos e possam gerar outro enfrentamento brutal nas ruas, como aconteceu em dezembro.

Macri nega esse raciocínio e tenta dissipar o pessimismo que atinge outra vez a Argentina, um país que passou a maior parte de sua história recente convencido de que não tem remédio. O presidente rejeita esse fatalismo. “A mudança está ocorrendo de fato. O que propusemos é muito mais do que uma mudança econômica; é uma mudança cultural. Queremos mudar a cultura do poder na Argentina. Todos temos que ceder um pouco em função do conjunto. É preciso abandonar para sempre a ideia de que não se pode mudar o país”, insistiu, visivelmente irritado com as análises que são reproduzidas de forma cada vez mais dura pelos meios de comunicação, inclusive entre analistas que apoiaram a mudança.

O presidente, os ministros e os altos funcionários da Argentina têm salários altos para os padrões de um país com enormes diferenças salariais, que possui 30% de pobreza e milhões de pessoas que, embora trabalhem e recebam salário, não podem ter uma vida digna. Macri recebe 200.000 pesos brutos por mês (pouco mais de 32.000 reais); já os ministros, cerca de 150.000 (24.000 reais). No entanto, no mundo da elite das empresas privadas, de onde provém boa parte dos ministros, esses salários não são os mais altos. O congelamento teria um efeito forte porque, em um ano, a inflação pode abocanhar mais de 20% do valor.

A redução de assessores e da equipe de trabalho é ainda mais significativa. Segundo o presidente, vai gerar uma economia de 1,5 bilhão de pesos (240 milhões de reais) por ano. O macrismo foi muito criticado quando chegou ao poder porque não diminuiu o número de ministérios nem os cargos de confiança do kirchnerismo, depois de censurar durante anos o uso da administração como uma espécie de “cabide de empregos da política”. Agora, o ajuste é forte e significaria demissões de mais de 500 pessoas em todos os centros de poder importantes. “A austeridade tem que partir da política”, afirmou. Um gesto simbólico que não soluciona o problema importante que a Argentina tem com o déficit público, mas que envia uma mensagem de que Macri está disposto a combater o pessimismo e a desilusão que atingem parte de seus eleitores.

EL PAÍS

(*) Comentário do editor do blog-MBF:  quando ele foi eleito, tentou demitir 150.000 empregados públicos. O protesto dos sindicatos foi de tal ordem, que ele conseguiu demitir apenas 13.000.

Este é o motivo porque a economia não está reagindo às medidas econômicas: o gasto público, principalmente em salários desnecessários, ainda é muito elevado. Consome o dinheiro dos impostos sem nenhum retorno.

O Livro Sobre o Governo Trump

Sthepen Kanitz
(*)

Acabei de ler “Fire and Fury”, o livro do momento, e algo me preocupou de cabo a rabo.

A semelhança com algo que pode ocorrer no Brasil.

Os americanos votaram em alguém novo, fora da política, porque estavam cansados dos políticos de sempre como Sarney, Calheiros, Lobão; que os Lulas, Marinas, Ciros Gomes e FHCs faziam acordos para governar.

Acontece que esses velhos caciques têm muito mais poder que se imagina.
Pior ainda, Steve Bannon, o assessor novo, melhor aluno da HBS, queria fazer as mudanças prometidas na eleição.

Por azar, duas pessoas influentes e ainda mais “novas”, o genro de Trump e especialmente a sua filha Ivanka, mais neófitos na política ainda, se apavoraram com as ameaças da imprensa e da velha guarda.

E foram os primeiros a se aliar com os velhos caciques, se esqueceram de todas as promessas eleitorais e mantiveram tudo na mesma.

Conseguiram colocar Bannon para fora, o mais competente da turma.

blog do kanitz

(*) Comentário do editor do blog-MBF:  compartilho com este receio. Dos candidatos lançados a Presidência da República, o único que está disposto a enfrentar os donos da política brasileira, é o Jair Bolsonaro. O problema é depois de eleito.
Até que ponto ele terá condições de lutar contra os Três podres Poderes, todos eles corrompidos ? Jânio Quadros tentou o apoio das FFAA e não teve êxito. Caiu. Collor tentou mudar o status quo e foi derrubado. E Bolsonaro ?

Na minha opinião, só tem uma maneira de lidar com o problema. Uma vez eleito, encaminha para o Congresso as mudanças prometidas em campanha. Se for barrado, apela para o artº 142 da Constituição e chama as FFAA para garantir as mudanças. Depois de promulgada uma nova Constituição, e com as mudanças efetuadas, convoca novas eleições para o Congresso Nacional, dentro das novas regras.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Fiscal melhora, mas não afasta risco de insolvência

Editorial

O quadro fiscal brasileiro mostra uma melhora nada desprezível a partir do final do ano passado e, pelo que tudo indica, os principais indicadores deverão ter um desempenho mais favorável em 2018 do que o inicialmente previsto. São boas notícias, que merecem ser comemoradas depois de uma sequência de seis anos desapontadores. Mas seria um erro concluir, a partir de flutuações cíclicas de indicadores fiscais, que o desequilíbrio estrutural nas contas públicas esteja equacionado.

Segundo adiantou o jornalista Ribamar Oliveira, em nota publicada no Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, na última quarta-feira, o Ministério da Fazenda espera que a dívida bruta do governo geral feche em 75% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2018. Essa projeção foi confirmada, no dia seguinte, pela secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, que informou em entrevista coletiva que no novo cenário central da Fazenda o indicador encerrará este ano em 74,8% do PIB. Pelo último dado, de novembro, a dívida bruta está em 74,4% do PIB.

A projeção da Fazenda é mais favorável do que a apresentada algumas semanas antes pelo Banco Central, que prevê que a dívida bruta terminará o ano em 79,8% do PIB, muito próximo da perigosa marca de 80% do PIB. Uma parte menor da diferença de projeções entre Fazenda e BC se deve, possivelmente, a questões técnicas, como o uso de diferentes deflatores. Outra diferença importante é que, nas contas da Fazenda, está incluído o pagamento antecipado de R$ 130 bilhões de dívidas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com o Tesouro.

Mas uma parcela importante se deve à melhora na situação fiscal que vem ocorrendo desde fins do ano passado, em grande medida determinada pela perspectiva de crescimento mais forte do Produto Interno Bruto (PIB) e também pela reação da arrecadação tributária à atividade econômica, que até outubro de 2017 não estava clara que iria de fato ocorrer.

Graças ao déficit primário menor do que o esperado em 2017, o ponto de partida da dívida bruta em 2018 - um dos mais importantes indicadores fiscais acompanhados pelos investidores - deverá ser menor. O Congresso Nacional havia estabelecido uma meta de déficit primário de R$ 159 bilhões para o ano passado, mas o resultado ficará abaixo de R$ 130 bilhões, segundo informou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, durante as reuniões em Davos. Alguns analistas econômicos do mercado apostam em déficit próximo de R$ 120 bilhões.

Outro fator que deverá contribuir para um resultado fiscal mais positivo é a perspectiva de maior crescimento da economia neste ano. Quando enviou proposta ao Congresso para mudar as metas fiscais de 2017 a 2019, o governo esperava uma expansão do PIB de 2% em 2018; hoje, já projeta 3%. O crescimento mais forte da economia tem impacto favorável sobre a dívida bruta esperada porque esse indicador é calculado como proporção do PIB. Além do mais, a arrecadação tributária costuma reagir à atividade econômica e, em tese, ganhos reais de receita tendem a reduzir o déficit primário, caso a regra de crescimento do gasto pela inflação seja respeitado.

A comparação entre as projeções do BC e da Fazenda para a dívida bruta também dá uma ideia da importância, do ponto de vista fiscal, do pagamento antecipado da dívida do BNDES ao Tesouro. A quitação do valor de R$ 130 bilhões permitirá que a dívida bruta termine 2018 quase dois pontos percentuais menor do que sem ela.

O risco é o Congresso Nacional entender, a partir desse cenário mais favorável no curto prazo, que o problema fiscal está equacionado. O Brasil segue registrando déficits primários perto de 2% do PIB. Os gastos com juros da dívida caíram porque a Selic foi fixada em níveis mais baixos para estimular a economia - o mercado já prevê alta entre fins de 2018 e começo de 2019. Pela estimativa do Tesouro, a dívida bruta subiria a 76,8% do PIB em 2019 e seguiria crescendo nos anos seguintes, até atingir um pico de 79,6% do PIB em 2024. O indicador só passaria a cair em 2026.

O cenário básico do Tesouro prevê que será cumprido o teto para o crescimento dos gastos em todo o período, que, por sua vez, depende da aprovação da reforma da Previdência no Congresso. Sem ela, a dívida bruta seguirá crescendo até levar o país à insolvência.

Valor Econômico


Macri à AFP: Argentina "não vai reconhecer" as próximas eleições na Venezuela

AFP

O presidente argentino, Mauricio Macri, afirmou neste sábado em uma entrevista à AFP que seu país "não vai reconhecer" o resultado das próximas eleições presidenciais na Venezuela, das quais foi excluída a coalizão opositora por decisão judicial.

"A Argentina não vai reconhecer essa eleição", afirmou o mandatário argentino, ao estimar que o dirigente venezuelano, Nicolás Maduro, tranformou a Venezuela em uma "ditadura".

A Corte Suprema da Venezuela - acusada pela oposição de servir ao governo - excluiu nesta quinta-feira à coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD) das eleições presidenciais antecipadas que se celebrarão antes de 30 de abril, deixando o caminho livre para Maduro renovar seu mandato.

A decisão causou surpresa e frustração entre uma oposição dividida e sem um líder claro, que agora deverá buscar candidatos para enfrentar Maduro.
"Maduro preocupou toda a região e o mundo inteiro, gerou otimismo com as mediações de líderes mundiais, mas a única coisa que ele fez foi continuar subjugando os direitos humanos", disse Macri, em uma entrevista em Paris, onde concluiu neste sábado uma viagem internacional.

Novas sanções? 
Em relação a possíveis sanções latino-americanas contra Caracas, Macri disse que é uma questão que continuará a ser explorada". Mas ele é pessimista. "Tudo o que estava ao nosso alcance já foi feito".

Na sexta-feira, o presidente francês Emmanuel Macron, que abordou a crise venezuelana com Macri, se declarou "favorável" a ampliar as sanções europeias contra a Venezuela, considerando-se o "viés autoritário inaceitável do regime" de Maduro.

O presidente francês ressaltou, no entanto, que a eficácia das medidas da União Europeia é limitada e apontou a necessidade de que outros países "que tenham maiores laços econômicos" com a Venezuela também apliquem sanções.

Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil, fundadores do Mercosul, suspenderam no ano passado de forma unânime e indefinida a Venezuela do bloco por "ruptura da ordem democrática".

Mas na prática, essa decisão mudou pouco ou nada a situação do país caribenho, que já se encontrava suspenso do Mercosul desde dezembro de 2016 por descumprir obrigações comerciais contraídas quando se incorporou ao bloco.

Perguntado sobre a possibilidade de ser mediador na crise venezuelana, Macri descartou totalmente esta opção. "Eu expressei, talvez tenha sido o primeiro, com força, qual é a minha opinião sobre o que Maduro está fazendo, motivo pelo qual não sou a pessoa indicada", disse ele.

E acrescentou: "neste ponto, acho que [Maduro] não está interessado, ele deixa claro que quer ter um domínio sobre a Venezuela por muitos anos e que quem não gostar do que ele faz deve sair da Venezuela ".
Nicolás Maduro espera renovar seu mandato no meio a uma profunda crise política e econômica.

'Me voy de Francia con buenas noticias'
O presidente argentino concluiu sua viagem internacional na França neste sábado. Ele foi à Rússia, onde se encontrou com o presidente Vladimir Putin, e ao Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, onde disse que "confirmou vários investimentos" em diversas áreas, como a mineração. e infraestruturas.

Macri, que durante essa viagem fez uma forte defesa das reformas empreendidas por seu governo, disse que sentiu "tranquilidade" entre os investidores europeus, especialmente após a vitória da aliança governante Cambiemos nas eleições de outubro do ano passado.

"Eles sabem que estamos no caminho certo, que vamos cumprir os objetivos que estabelecemos para diminuir o déficit em um ponto por ano, reduzindo a inflação para um dígito", afirmou.

Macri, de 58 anos, enfrenta o desafio de cumprir as promessas eleitorais que o levaram ao poder em 2015, como a redução da inflação, que continua alta, com 25% em 2017, e a atração de investimentos estrangeiros, que nos últimos dois anos apenas se concentraram no setor financeiro de curto prazo.

O presidente argentino, que conversou com a AFP em um hotel parisiense antes de assistir à partida de futebol disputada entre PSG e Montpellier, também se referiu ao acordo comercial em negociação entre a União Européia e o Mercosul, que está em desenvolvimento há quase duas décadas.

"Estou partindo [da França] com boas notícias", disse ele, enfatizando as declarações feitas por Macron de que o acordo comercial entre os dois blocos "pode ser bom para ambas as partes" e que é "pertinente concluí-lo rapidamente".

A próxima semana será "uma semana-chave" em Bruxelas, assegurou, torcedo para que se chegue a um acordo.

Agence France-Presse

domingo, 28 de janeiro de 2018

Desvio de rota

Celso Ming

Não é mais possível aceitar que o único projeto do PT e das esquerdas brasileiras seja o de salvar o Lula.

Há tanta coisa a reconstruir, a começar pelas ruínas financeiras da Previdência Social, que hoje comprometem gravemente a aposentadoria das novas gerações. Seguir afirmando que esse rombo foi criado pelas elites é tentar ignorar a trombada que vem vindo aí.

Há, por exemplo, uma indústria a reidratar depois de tantos anos de descuido, de despejo de recursos nas contas bancárias de meia dúzia de futuros campeões nacionais e de tantas barbeiragens em matéria de política industrial produzidas pelos governos do PT.

Se o agro tivesse sido confiado ao MST e ao João Stédile, o Brasil não estaria produzindo 240 milhões de toneladas de grãos. E não teríamos hoje mais do que o jogo miúdo que mal supera programas de economia de subsistência e a sistemática destruição de experimentos agrícolas de empresas e de institutos de pesquisa.

O mundo passa por impressionantes mudanças tecnológicas, que estão dizimando empregos e criando novas formas de atividade econômica e de trabalho. E, no entanto, as esquerdas comportam-se como os taxistas contra o Uber, contra o Cabify e contra os aplicativos. Aferram-se à preservação do imposto sindical e à manutenção de postos de trabalho de profissionais que vão sendo substituídos por formas novas de atividade remunerada. Bancários, carteiros e telefonistas são ocupações em extinção (ou em forte redução), e não há como mudar esse jogo.

Há um sistema educacional a reconstruir diante da grande explosão da nova revolução industrial, da tecnologia da informação, da inteligência artificial e da internet das coisas. Mas a pregação das esquerdas é de que a principal coisa a fazer aí é inculcar nas crianças o catecismo da luta anti-imperialista.

E há um sistema de saúde a remodelar, num momento em que o aumento da expectativa de vida reduz a importância da luta contra doenças infecciosas e aumenta a da luta contra doenças degenerativas.

Se é para construir a democracia, não podem os dirigentes das nossas esquerdas pregar a desobediência civil e o desacato a algumas decisões da Justiça e não a outras.

Aí já tem munição para muita conversa da qual esta Coluna não fugirá ao longo deste ano. É cada dia com sua agonia, como diz o Evangelho de Mateus (6,34). Mas não posso deixar passar este espaço sem algumas considerações sobre as contas externas em 2017.

O Estado de São Paulo


2019 - Assembléia Nacional Constituinte Exclusiva

Martim Berto Fuchs

A A.N.C.E. a ser convocada na primeira semana de 2019, impreterivelmente, para elaborar uma nova Constituição, terá que debater, entre outros, estes três temas:

- Acabar com o Senado (Casa dos Lordes), permanecendo só a Câmara (Casa do Povo), sistema unicameral.
- Acabar com o STF, sendo a última instância o STJ, Superior Tribunal de Justiça, e a escolha dos Ministros NÃO poderá ser por indicação política.
- Acabar com o Foro Privilegiado.

Prisão após condenação em 2ª instância, doa a quem doer. Pode recorrer ao STJ, mas da cadeia. Sem contar o fato que só milionários podem arcar com as custas de um processo, para levar o caso até 2ª instância e mais além. Classe média para baixo já vai em cana após condenação na 1ª instância, e pobre vai em cana, e lá fica, SEM julgamento.

E isto tem que ocorrer, portanto, é melhor JAIR se acostumando. A atual classe política e seus financiadores, que dominam nosso país, transformaram o Estado-Nação em Estado-Ladrão. Somos reféns do crime organizado.

sábado, 27 de janeiro de 2018

Conta que não fecha

Hélio Schwartsman

Alguns comentaristas claramente identificados com o campo da esquerda já começam a dizer que uma reforma da Previdência é necessária, mas não esta que está aí. Entendo o mau humor com o governo Temer, mas não consigo ver bem como se possa fazer uma reforma da Previdência que atenda às nossas necessidades e seja substancialmente diferente da que o governo propõe.

O diagnóstico do nosso problema não é complicado. A Previdência (servidores públicos e INSS) consome hoje cerca de 13% do PIB brasileiro, o que é uma enormidade para um país que não completou sua transição demográfica. Por aqui, os idosos (65 anos ou mais) são pouco mais de 10% da população economicamente ativa (PEA), mas já estamos gastando a mesma fatia do PIB que países como Japão, Suécia e Suíça, onde os velhos são 30% da PEA.

O vetor da reforma, portanto, é inequívoco: precisamos gastar menos, muito menos. Isso implica fazer as pessoas receberem menos ou trabalharem por mais tempo, ou uma combinação menos agressiva dos dois. Não há mágica que permita manter intactos todos os direitos previdenciários e gastar menos.

Agora com a PEC do teto de gastos, se os desembolsos previdenciários, que são obrigatórios, continuarem crescendo, estarão automaticamente comendo o espaço de despesas não obrigatórias e investimentos.

Isso não significa que não haja espaço para fazer justiça social. O regime do INSS já é meio socialista, uma vez que a diferença entre a menor e a maior remuneração é da ordem de seis vezes. As maiores distorções estão no regime dos servidores públicos, que permitirá, ainda por vários anos, aposentadorias integrais de até R$ 30 mil.

Lamentavelmente, como os sindicatos de servidores integram a base de muitas legendas de esquerda, é improvável que elas venham a defender uma reforma da Previdência que elimine os privilégios.

Folha de São Paulo

Um silêncio desesperador tomou conta da zona industrial venezuelana

Fabiola Zerpa
(*) 

Na Venezuela de Nicolás Maduro, fábricas estão em recesso desde o Natal, matérias-primas são escassas, trabalhadores estão deixando o país e os que ficaram se deparam com a violência  

Fábricas no entorno de Caracas fecharam para os feriados antecipadamente em outubro, em meio ao quase desaparecimento de suprimentos, inflação disparada e uma onda crescente de saques violentos. Desde então, poucas reabriram. 

Na semana passada, durante uma incursão aos antes agitados polos industriais de Guarenas e Guatire, as avenidas principais – com suas indústrias farmacêuticas, fábricas de cimento e produtores de peças automobilísticas – estavam desoladas. A explosão de trabalhadores em busca de emprego no começo de janeiro havia desaparecido. 

“Não paramos de trabalhar aqui”, disse Angel Requena, um vigilante de 45 anos em um depósito de bebidas. “Mas dos 20 caminhões de entrega que faziam cinco viagens diárias para Caracas no ano passado, agora temos 14 caminhões fazendo uma viagem por dia”, contou, apontando para uma garagem vazia. 

O barulho comum desse polo industrial a apenas 40 quilômetros da capital foi silenciado pelo controle de câmbio, o colapso da economia baseada em petróleo, a regulamentação dos preços e uma espiral de inflação que subiu mais de 2.300% no último ano. Com a economia do país quase parando, a vida é definida por crime, fome e necessidade. 

A diminuição de matérias-primas levou a um aumento constante de preços que resiste aos esforços do governo em pará-lo. Na quinta-feira passada (18), o governo venezuelano se reuniu com a Nestlé e a Procter & Gamble para pedir que abaixassem seus preços, e o vice-presidente Tareck El Aissami anunciou nesta semana que as fábricas teriam que reduzir os seus preços para o nível registrado em dezembro. 

“A força total da lei será aplicada contra as empresas que não cumprirem isso”, disse El Aissami.

Previsões desanimadoras
Na sexta-feira, a associação de comércio da indústria alimentícia, Cavidea, disse em uma nota pública que a medida representa “uma paralisação forçada”. Uma pesquisa de novembro da Conindustria, uma das maiores organizações de negócios do país, mostrou que um em cada quatro membros estavam considerando fechar as portas em 2018 devido às condições desanimadoras. 

No centro industrial do estado de Carabobo, 300 empresas de plástico não receberam matéria-prima de uma subsidiária da companhia de petróleo estatal, PDVSA, e estão estendendo o seu recesso de Natal até 15 de fevereiro. 

A situação das cidades irmãs de Guarenas e Guatire, no estado de Miranda, é um microcosmo da manufatura na Venezuela. Em 2016, as cidades irmãs abrangiam oito quilômetros quadrados de instalações produzindo 20% dos medicamentos do país, 65% das fraldas descartáveis, 90% dos pães industrializados e 22% do plástico, de acordo com a associação industrial Fedeindustria. Fábricas localizadas nas duas cidades produziam baterias de carros, colchões, comidas congeladas, sapatos utilitários e componentes veiculares, entre outros produtos. Em 2015, 400 companhias estavam registradas nos municípios. 

Nesta semana, apenas uma escassez de trabalhadores e pedestres passavam por lá. Quiosques de lanches, geralmente cheios de clientes, estavam vazios. Em frente a um deles, três trabalhadores entraram pela porta principal de uma empresa de processamento de alimentos, com papéis nas mãos – não eram currículos, mas cartas de demissão. O grupo tentaria a sorte no Peru, segundo eles. 

Jose Gregorio Palacios, 41, chefe de segurança da empresa, disse que já estava prevendo o êxodo. 
“Não é nem meio dia e eu já recebi quatro cartas de demissão”, disse. 
Desde novembro, 25 dos 240 funcionários da empresa saíram. Palacios mostrou imagens das câmeras de segurança que filmam as linhas de produção. Elas não estavam se movendo. Os funcionários foram gravados conversando. 
“Os trabalhadores estão aqui, mas eles não estão fazendo nada”, disse Palacios. “Não tem material para trabalhar.”

Sobrevivência
Os obstáculos também estão presentes do lado de fora. Multidões de venezuelanos desesperados começaram a parar caminhões e tomar as mercadorias, distribuindo os bens na estrada mesmo, enquanto outros veículos passam por eles. De acordo com o Observatório Venezuelano de Conflito Social, ocorreram 107 incidentes ou tentativas de saqueamentos em todo o país nos primeiros dez dias do ano. 

Victor Ciao, 59, gerente de setor de uma fábrica de armações de aço para emplacamentos industriais, disse que a empresa retomou as operações nesta semana, mas faltavam suprimentos, matérias-primas e produtos. 
“Agora temos que pedir para os clientes materiais como aço, algo que nunca tínhamos feito antes”, disse. A velocidade com que os preços sobem também é um problema. “Nossos orçamentos duram apenas 24 horas.” 
Conforme a possibilidade de lucro – ou até mesmo sobrevivência – diminui, a força de trabalho também recede. 

Cinco homens com macacões azuis sentam na calçada do lado de fora de uma empresa de baterias, o único lugar da região em que é possível escutar barulhos de trabalho. 

“Nosso salário não é suficiente. As pessoas estão indo embora para a Colômbia ou outros países”, disse Ovidio Palomo, 34. Venezuelanos com condições para isso estão correndo para cruzar a fronteira. 

Porfirio Tamayo, presidente da câmara das indústrias do estado de Miranda, disse que a migração de trabalhadores qualificados é a ameaça mais terrível de todas. 
“Sem eles, não podemos operar”, disse.

Tradução de Andressa Muniz.

Gazeta do Povo

(*) Comentário do editor do blog-MBF:  e pensar que é este modelo econômico que o PT e nossos partidos de esquerda querem para o Brasil.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

“Brasil é vítima do seu Congresso”, diz instituto francês

Jean-Philip Struck

Em relatório, grupo de estudos do renomado Sciences Po aponta que próximo presidente não terá forças para "romper inércia política" e que Lava Jato não vai ser sustentável sem reforma ampla do sistema.

O Observatório Político da América Latina e do Caribe (OPALC), ligado ao renomado Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), fez um balanço pessimista sobre as chances de o Brasil superar seus problemas políticos e apontou que o Congresso é o grande obstáculo para que o país realize mudanças profundas no seu sistema.

O capítulo do relatório dedicado ao Brasil afirma que o país "entrou em 2017 em um período de estabilização mas também de estagnação econômica" e é "bastante improvável que o próximo presidente conte com influência política junto ao Congresso" para "tirar o país da inércia".

"Uma visão intuitiva e ingênua sugeriria que a pressão ligada à multiplicação de escândalos poderia levar os atores políticos a trabalhar em conjunto em uma reforma política de grande escala. Uma análise mais detalhada dos fatos mostra que não é assim", diz o texto.

"As elites no poder conseguem resistir à mudança e geram uma força de inércia que retarda ou bloqueia qualquer projeto destinado a transformar o cenário, as regras e as práticas políticas."

O documento detalha como o Congresso é capaz de derrubar ou preservar um presidente, conforme as vantagens políticas que pode obter, sempre em nome da preservação dos privilégios de seus membros.

"Michel Temer não sofreu a mesma iniciativa de demolição política que a experimentada por Dilma Rousseff em 2016. Podemos ver aqui o papel decisivo desempenhado pelo Congresso na manutenção dos equilíbrios políticos", afirma o relatório.

"Mas os congressistas não só têm o poder de derrotar um presidente ou de preservar um. Eles também são os cérebros do sistema político, prevenindo há várias décadas qualquer iniciativa de reforma política que possa pôr em perigo os seus próprios interesses e prejudicar a sua vida política. Como o próprio Michel Temer afirmou em 2015, quando ainda era vice-presidente da República, 'o Congresso é o senhor absoluto da reforma política'."

Lava Jato não é suficiente
O capítulo brasileiro no relatório foi elaborado por Frédéric Louault, vice-presidente do OPALC e professor da Universidade Livre de Bruxelas, na Bélgica. No texto, Louault aponta que, apesar dos avanços, a operação Lava Jato não é suficiente para pressionar o Congresso e forcar mudanças, e que iniciativas mais amplas nos campos eleitoral e constitucional são necessárias.

"É improvável que a onda de choque causada pela operação Lava Jato signifique no curto prazo uma alternância do quadro político e das práticas. Mesmo que uma limpeza do sistema pareça inevitável, as elites políticas brasileiras já demonstraram no passado a sua capacidade de resistir a mudanças, de recuperação ou mesmo de regeneração", diz o relatório.

O relatório segue o raciocínio afirmando que iniciativas como a lei anticorrupção de 2013 e a repressão contra crimes de corrupção "não são suficientes" para "quebrar os hábitos políticos que se perpetuam há séculos". "O impacto das ações policiais e judiciárias não pode ser sustentável sem uma reforma profunda do sistema político."

O texto ainda aponta que "o Brasil é, portanto, vítima de seu Congresso e prisioneiro de seu sistema eleitoral, estabelecido pela Constituição de 1988". Ainda segundo o OPALC, o complicado sistema de eleições proporcionais estabelece "um presidencialismo de coalizão baseado na individualização do comportamento político, fragmentação e instabilidade de alianças".

"Incapaz de confiar uma maioria estável no Congresso, o presidente da República torna-se 'refém' de uma base aliada heterogênea e deve fazer largas concessões para governar."

Repensar a Constituição
Segundo o OPALC, foram realizadas algumas iniciativas para reformar o sistema eleitoral, como a criação de um fundo de campanhas e o estabelecimento de um teto de gastos em campanhas. Só que qualquer iniciativa de reforma apenas focada no aspecto eleitoral não é suficiente.

Também é preciso repensar aspectos mais amplos, especialmente a Constituição.

"O tema da reforma política, que está no cerne da agenda legislativa a cada grande crise do sistema representativo (Collorgate em 1992, Mensalão em 2005, Lava Jato em 2015) produziu até agora apenas alguns efeitos concretos sobre as condutas políticas", afirma o relatório.

"Como o cientista político Sérgio Abranches apontou em 2005, é improvável que uma reforma política eleitoral tenha um impacto significativo e sustentável se ela não ocorrer paralelamente a uma reflexão mais profunda sobre a reforma constitucional."

Por fim, o relatório prevê com pessimismo que o próximo ocupante do Planalto não deve conseguir romper o ciclo de estagnação junto a um Congresso avesso a mudanças e que só tem em mente os seus próprios interesses.

"Enquanto o Brasil celebra em 2018 o trigésimo aniversário da Constituição de 1988, os debates sobre a reformulação desta Carta não estão na agenda", dizem os estudiosos franceses. "Dado o contexto atual – marcado por uma crescente polarização política, a fragilidade do sistema partidário e a prioridade dada às políticas de estabilização macroeconômica – é pouco provável que o próximo presidente da República tenha influência junto ao Congresso para romper com a inércia política e tomar uma iniciativa nesse campo."

DW-Deutsche Welle

O labirinto eleitoral

Míriam Leitão

Os tribunais superiores precisam ser mais efetivos na proteção da Presidência. Ela não pode ser o esconderijo perfeito de um condenado da Justiça

O ex-presidente Lula se lançou candidato como parte da estratégia no processo criminal. A ideia é que, se ele ficasse forte politicamente, estaria protegido da Justiça. Ontem, ele foi condenado em um órgão colegiado e por unanimidade. Se Lula puder ser candidato, por alguma brecha legal, ou pelo tempo dilatado do julgamento de recursos, o país estará no seguinte labirinto: um réu não pode ser presidente da República, mas um condenado — e réu em diversas ações — pode se candidatar ao cargo. E, caso vença, todos os processos são suspensos porque os crimes foram anteriores ao mandato. Então quebra-se o princípio constitucional. Se a Justiça eleitoral for lenta, leniente ou falha, o país estará em situação perigosa.

A candidatura do presidente Lula tem agora poucas perspectivas. O PT disse que vai mantê-la, mas, se não acionar logo um plano B, é o grupo político que estará numa armadilha.

O cenário possível é de prisão de Lula, ao fim dos embargos de declaração, que, como se sabe, são apenas para esclarecer pontos obscuros. São poucos e mais rapidamente julgados. A ordem do desembargador Leandro Paulsen já foi dada ontem: assim que forem esgotados esses recursos, o juiz de primeira instância deve expedir a ordem de prisão.

O PT diz que vai “radicalizar” e que não reconhece as decisões da Justiça. Qual o próximo passo? O partido precisa ter a resposta para essa pergunta, por estratégia de sobrevivência.

Os desdobramentos desse caso colocam em questão muito mais do que o futuro do Partido dos Trabalhos ou o destino do ex-presidente Lula. O Judiciário terá que desatar o nó criado por desencontros legais. Parece óbvio que um réu em diversas ações não pode concorrer à Presidência. A Lei da Ficha Limpa socorre em parte esse imbróglio por estabelecer que o réu que for condenado em segunda instância não pode ser candidato, após todos os recursos. Mas os tribunais superiores precisam ser mais efetivos na proteção da Presidência da República. Ela não pode ser o esconderijo perfeito de um condenado da Justiça.

O Globo


quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Deu errado

Luiz Carlos Azedo

O PT não tem outro candidato competitivo para disputar a Presidência. “Vitimizar” Lula e manter sua pré-candidatura enquanto for possível faz parte da estratégia de sobrevivência eleitoral dos petistas

Toda estratégia tem fricção, não importam a sua natureza ou os objetivos, porque as coisas nunca acontecem como foram planejadas. Por isso mesmo, precisa ser sempre avaliada, corrigida, repensada, para redução de danos e correção de rumos. Quando a estratégia é construída a partir de um conceito errado, não tem a menor chance de dar certo, o desastre é completo. Foi o que aconteceu com ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no julgamento de ontem, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, no qual sua condenação a 9 anos e meio de prisão pelo juiz federal Sérgio Moro não somente foi mantida, como ampliada para 12 anos e 1 mês.

Lula pressionou o tribunal e tentou desmoralizar o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, com uma agressiva campanha de solidariedade e a acusação de que o julgamento estava armado para favorecer uma fraude eleitoral. Seria um julgamento político. Essa estratégia foi um fracasso total do ponto de vista jurídico, porque os desembargadores da 8ª Turma rechaçaram o recurso que pedia a anulação da sentença de Moro e ainda aumentaram a pena com base nas provas que a defesa insistia em dizer que não existiam.

Foram votos duríssimos, principalmente o do presidente da Turma, desembargador Leandro Paulsen: “O cometimento de crimes de corrupção por um presidente ou ex-presidente em razão do cargo, além de constituir uma violação seriíssima à ordem jurídica, torna vil o exercício de autoridade. Submeter a conduta de um presidente ao crivo da censura penal torna presente o que bem destacou o magistrado de primeira instância ao finalizar sua sentença: ‘Não importa o quão alto você esteja, a lei ainda está acima de você’.” Ao contrário do que argumentava a defesa de Lula, o julgamento foi essencialmente técnico. Estava na cara que o tipo de mobilização e narrativa construída pelo PT não se sobreporiam às provas dos autos.

Candidatura
O melhor resultado possível nas circunstâncias de uma condenação de Lula seria uma votação na qual não houvesse unanimidade. Essa decisão poderia dar à estratégia fracassada algum sentido, pois tornaria possível levar a decisão para o pleno do tribunal, por meio de recursos infringentes, e empurrar a decisão com a barriga, e criar condições mais favoráveis para registrar a candidatura de Lula a presidente da República nas eleições de 2018. Nessas circunstâncias, ele seria candidato sub judice, não haveria tempo para retirar seu nome da célula e a decisão final poderia ficar para depois das eleições. Isso daria eficácia à estratégia, mas não foi o que aconteceu.

Com a decisão unânime, a primeira consequência é o fato de Lula não poder recorrer da sentença na própria Corte, poderá apenas protelar sua execução com um embargo de declaração, obrigando os desembargadores a prestar esclarecimentos sobre a sentença. Esse tipo de recurso tem eficácia limitada, pode protelar a execução da sentença em até dois meses. Pela jurisprudência vigente, Lula pode ser preso, mesmo que o processo não tenha transitado em julgado, como já acontece com outros condenados da Operação Lava-Jato. Dificilmente, porém, isso deve ocorrer; se acontecer, será por pouco tempo, porque já há uma maioria no Supremo Tribunal Federal (STF) a favor da revisão da súmula que determina a execução imediata da pena após julgamento em segunda instância.

Entretanto, a condenação em segunda instância nos termos em que já aconteceu — unanimidade na Turma — implica perda de direitos políticos por um período de oito anos, com base na Lei da Ficha Limpa, que é explícita quanto a isso, e não de jurisprudência, que pode ser alterada pelo STF. Nesse caso, sua candidatura poderá ser impugnada a partir do pedido de registro, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Como essa Corte é mais sujeita às pressões políticas, a estratégia de confronto e desqualificação da sentença condenatória adotada pelo PT deverá ser mantida, agora para forçar uma decisão política na Justiça Eleitoral, desconsiderando as provas. Não será a primeira vez.

Há um certo desespero em tudo isso, porque o PT não tem outro candidato competitivo para disputar a Presidência. “Vitimizar” Lula e manter sua pré-candidatura enquanto for possível faz parte da estratégia de sobrevivência eleitoral dos petistas. De certa forma, a decisão de hoje praticamente sepultou a possibilidade de Lula ser candidato, mas não afastou o líder petista da disputa eleitoral. Caso não seja preso, mesmo inelegível, poderá percorrer o país e fazer campanha para seu substituto na chapa, mesmo que seja alguém sem grande prestígio nacional. Os petistas examinam dois nomes possíveis, ambos muito ligados a Lula, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Hadad e o ex-governador da Bahia Jaques Wagner, que poderiam, inclusive, compor uma dobradinha. Fala-se também no ex-governador do Paraná Roberto Requião (PMDB-PR), mas ele teria que se filiar ao PT.

Correio Braziliense

Depois de Porto Alegre: veja os próximos acertos de contas de Lula com a Justiça

Kelli Kadanus

Ex-presidente responde a outros seis processos na Justiça comum e pode ser condenado ainda neste ano pelos juízes Sergio Moro, em Curitiba, e Vallisney Oliveira, em Brasília

O julgamento no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4) que confirmou a condenação no processo do tríplex do Guarujá, nesta quarta-feira (24), não é o único problema jurídico que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai precisar enfrentar em 2018. Ele é réu em mais seis processos em primeira instância, em Brasília e em Curitiba, que podem gerar novas condenações contra ele ainda antes das eleições, em outubro.

Só em Curitiba, nas mãos do juiz federal Sergio Moro, são dois processos relacionados à Lava Jato. O processo referente ao terreno do Instituto Lula e ao aluguel de um imóvel em São Bernardo do Campo (SP) já passou da fase de interrogatório dos réus. Ainda faltam as alegações finais do Ministério Público Federal (MPF) e das defesas, mas o processo aguarda uma definição sobre a autenticidade dos recibos de aluguéis entregues pela defesa de Lula. É o processo mais adiantado contra o petista nas mãos de Moro.

O juiz paranaense também vai julgar o processo em que o MPF acusa Lula de ser o dono de um sítio em Atibaia (SP). Nesse caso, o processo ainda está na fase de oitiva de testemunhas de acusação e defesa, e deve demorar um pouco mais para chegar ao fim. Mesmo assim, Moro não costuma demorar para colocar um ponto final nos processos que correm em Curitiba e pode sentenciar o ex-presidente ainda neste ano.

Zelotes
Outros quatro processos contra o ex-presidente correm na Justiça Federal de Brasília, envolvendo casos das operações Lava Jato e Zelotes. Os juízes responsáveis pelos casos são Vallisney de Souza Oliveira e Ricardo Leite, respectivamente titular e substituto da 10ª Vara Federal em Brasília.

O processo mais avançado é o de obstrução de Justiça no caso envolvendo a suposta compra do silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. A ação penal é conduzida por Ricardo Leite e o MPF pediu a absolvição de Lula no processo por falta de provas, além de pedir a anulação do acordo de colaboração premiada do ex-senador Delcídio do Amaral (sem partido).

Também relacionado à Lava Jato, o processo da Operação Janus é o segundo da lista de mais adiantados. O MPF aponta que Lula atuou para liberar verba do BNDES em obra da Odebrecht em Angola.

Lula responde a outros dois processos, da Zelotes, em Brasília. O primeiro é sobre suposta aceitação de R$ 6 milhões em propina para favorecer montadoras na edição de uma medida provisória.

O segundo envolvendo Lula é sobre negociações que levaram a compra, pelo governo brasileiro, dos caças Gripen da sueca Saab. O petista também é acusado de atuar na renovação de uma medida provisória que favorecia montadoras de automóveis.

Gazeta do Povo

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Para que serve o Ministério do Trabalho?

Tábata Viapiana

Por trás da polêmica em tomo da posse da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) no Ministério do Trabalho, há outra discussão ainda mais importante e que tem sido deixada de lado. Para que serve o Ministério do Trabalho?

Qual sua importância para o País? Justifica todo orçamento e estrutura que possui?

A pasta conta, segundo o Portal da Transparência, com 7.046 servidores. De acordo com dados da Contas Abertas, o órgão gastou, no ano passado, R$ 3,3 bilhões apenas com pessoal e encargos sociais e investiu pouco mais de R$ 94 milhões. A previsão orçamentária para 2018 é de aproximadamente R$ 9 bilhões para administração direta - sendo R$ 3,4 bilhões para despesas com pessoal e encargos social e apenas R$ 64 milhões para investimentos.

Conforme consta em seu site institucional, o Ministério do Trabalho possui competências previstas na Constituição: política e diretrizes para a geração de emprego e renda e de apoio ao trabalhador; a modernização das relações do trabalho,- fiscalização do trabalho, inclusive do trabalho portuário, bem como aplicação das sanções previstas em normas legais ou coletivas; política salarial. Porém, muitas dessas atribuições acabam ficando com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e com a Justiça do Trabalho.

O combate ao trabalho escravo e infantil, por exemplo, é uma das responsabilidades do MPT, assim como a aplicação de sanções a empregadores que desrespeitam os direitos de seus funcionários cabe à Justiça trabalhista. Ações trabalhistas, dissídio coletivo, resolução administrativa de conflitos, nada disso passa pelo Ministério do Trabalho mais.

Antigamente, o ministério era mais robusto. Administrava o imposto sindical, uma aberração existente desde a época de Getúlio. "Era o paraíso dos sindicatos e dos sindicalistas. Com o fim do imposto, a pasta ficou com apenas duas funções básicas: a gestão dos fundos (FGTS e Fundo de Amparo ao Trabalhador) e a manutenção das cartas sindicais", afirmou Gil Castelo Branco, presidente da ONG Contas Abertas.

Para ele. num momento de ajuste fiscal e aperto das contas públicas, o órgão até poderia ser extinto, gerando grande economia aos cofres públicos: "Os fundos podem ser geridos pela Fazenda, o que. de fato, já ocorre. A fiscalização do trabalho pode ser incorporada na fiscalização previdenciária. E os sindicatos são entidades privadas que devem aprender a viver às custas dos filiados".

Apesar da ociosidade do principal gabinete da pasta, quase ninguém, nas últimas semanas, sentiu falta do Ministério do Trabalho. É a prova de que, para além da posse de uma nova ministra, é hora de questionar e debater sua real importância. Ou, ao menos, maneiras de incrementá-lo.

Revista Isto É