domingo, 14 de fevereiro de 2016

A ‘agenda Brasil’ que aterroriza os políticos

Geraldo Samor

10 ideias heréticas para melhorar já a vida do brasileiro

Para o Brasil mudar, você tem que colocar o dedo na(s) ferida(s).
Não tem outro jeito.
O Governo está trabalhando na “Agenda Brasil”, uma longa pauta econômica pactuada entre o Senador Renan Calheiros e o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
A coluna sugere uma outra agenda, ainda mais ousada, com 10 ideias que o País deveria adotar agora.
Se são ideias heréticas — ou puro bom senso — cabe a você julgar como leitor, eleitor e contribuinte.

1) Fica proibido aos titulares do Executivo Federal, Estadual e Municipal organizar ou participar de cerimônias de inauguração de obras. Primeiro, porque elas quase nunca significam que a obra está pronta — só que o governante está louco para aparecer bem na foto. Segundo, elas custam dinheiro e dão a muitos eleitores a sensação de que o governante lhes fez um favor quando, em realidade, não fez mais que a obrigação. A partir de agora, se a hidrelétrica ficou pronta, liguem as turbinas e vida que segue.

2) Os membros dos três poderes passarão a se referir aos cidadãos brasileiros como “o patrão.” Esta obrigatoriedade valerá para documentos públicos, discursos nas tribunas do Congresso e decisões dos tribunais superiores, onde o ar costuma ser mais rarefeito. Semanticamente, já tentamos o caminho aberto pela Revolução Francesa: a palavra ‘cidadão’ tentou nivelar a todos (governantes e governados), mas nem por isso conseguimos fundar uma ‘Res’ pública. Tentemos agora a perspectiva protestante, anglo-saxã: quem paga a conta é que manda. Os brasileiros trabalham um terço do ano para pagar impostos. Os políticos são seus funcionários. Tá na hora de mostrarem respeito e tratarem o chefe pelo nome.

3) Lei Cristóvam Buarque: Os filhos de todo aquele que conquistar mandato eletivo, se em idade escolar, deverão ser matriculados em escolas públicas e ali permanecer durante todo o exercício do mandato do pai ou da mãe. Não haverá exceções. Guardem o mimimi até que a rede pública esteja a cara de um internato suíço.

4) O Código Penal tipificará como ‘crime contra as finanças públicas’ qualquer empréstimo do BNDES a empresas na lista das 100 maiores do Brasil. É pra elas começarem a usar uma novidade aí… chamada ‘mercado de capitais’.  Coisa fina. (Pra você que não é do ramo: o BNDES é o táxi, e o mercado de capitais é o Uber do dinheiro.) Parágrafo segundo: o BNDES muda de nome e passa a ser o BPME: o Banco da Pequena e Média Empresa, com guichês de atendimento em todos os Estados e análise de crédito centralizada em sua sede na Avenida Chile, no Rio. O banco também criará fundos — o FIP Garagem I, Garagem II e assim por diante — para um grande esforço de investimento em startups e capital semente. Está na hora de oxigenar a economia com inovação e turbinar quem tem talento, não só quem já é grande o suficiente para contribuir nas campanhas.

5) A CVM (o xerife da Bolsa) e o COAF (o xerife da lavagem de dinheiro) terão dotação orçamentária própria, autônoma e não-contingenciável. A remuneração de seus diretores, gerentes e analistas será em linha com salários do setor privado. A quarentena será de dois anos. E como todo xerife precisa impor respeito, a sede da CVM será transferida para um daqueles prédios de granito e mármore na Faria Lima, que os bancos de investimento ocupam para tentar impressionar os clientes. As multas da CVM, cujos valores máximos hoje são fixados, por lei, em reais (e assim ficam defasados com a inflação), passarão a ser atreladas à cota do Fundo Verde.

6) Presidentes e ministros cujos ajustes fiscais atingirem o fornecimento de medicamentos de uso contínuo para pacientes de câncer, AIDS e diabetes serão punidos com exposição direta ao HIV, radiação cancerígena ou doses cavalares de açúcar.

7) Revoga-se a tarifa de importação de servidores, roteadores, desktops e laptops, num empurrão à produtividade do País. Esta reserva de mercado é da época dos militares. Eles foram embora há 30 anos e já há até infelizes aí pedindo a sua volta, mas a reserva de mercado ainda está aí, firme e forte. Ao contrário do que seus defensores esperavam, ela não pariu uma Apple brasileira, mas garantiu que um computador importado custe aqui quase três vezes mais do que lá fora. Quando vamos acabar com esta palhaçada? (Rachid, mata essa no peito, cara!)

8) No mercado de construção pesada, o Governo fará um grande e espetaculoso esforço para atrair empreiteiros internacionais. Vamos recebê-los como os parisienses receberam os americanos em 1945. Faremos uma brochura promocional com as fotos de todos os empreiteiros encarcerados na Lava Jato, mostrando que instauramos a moralidade e prometendo que, como diz a canção, “daqui pra frente, tudo vai ser diferente.” Os americanos não precisarão ficar de fora do Brasil por temer que uma propina paga aqui os leve à cadeia lá. (Cena cômica: Já imaginaram o Vaccari pedindo um ‘pixuleco’ — em inglês — a um empreiteiro alemão?)

9) Nos três poderes da República, ficam proibidos carros oficiais, garçons nos gabinetes e ascensoristas nos elevadores. Estes benefícios, concebidos para facilitar o trabalho de deputados, senadores, ministros e juízes de tribunais superiores, transformaram-se com o tempo em símbolos do descolamento da realidade, do desalinhamento destes servidores com o interesse público. Ministros, deputados e desembargadores dirigirão seus próprios carros (ou contratarão um motorista com seus salários), e não há motivo algum que impeça alguém de pegar seu próprio café e apertar o andar de destino no elevador (contanto que não seja o “13”. Neste caso, vá de escada.)

10) O haraquiri fica instituído como a saída jurídica preferencial para os ocupantes dos três poderes que traírem o interesse público. A outra é a Papuda.

Se você gostou dessas ideias, compartilhe-as no Facebook ou num email para seu deputado ou senador. Só dá pra consertar o Brasil reinventando-o — e questionando tudo, de cima pra baixo.

Site da Veja em 20/08/2015



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