Editorial
O
resultado de se manter uma legislação trabalhista arcaica e onerosa é o
desestímulo ao emprego formal e o incentivo a um improdutivo contencioso
jurídico
Desembarcar
de forma desavisada no longo debate que se trava sobre a modernização da
anacrônica legislação trabalhista pode levar a equívocos. Motivos para
atualizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não faltam. Na sua
essência, trata-se de uma legislação forjada na década de 40, no Estado Novo de
Getulio, inspirada no controle da sociedade pelo fascismo de Mussolini.
Assim
tem sido, mesmo que o Brasil pouco industrializado daquela época haja mudado de
patamar de desenvolvimento — e também de problemas. O próprio avanço econômico
e a urbanização do pós-guerra teriam de levar a adaptações naquele modelo
paternalista e, com o passar do tempo, desincentivador do emprego formal. Não
foram feitas reformas de peso, e, para tornar tudo mais difícil nas relações
trabalhistas, a revolução da microeletrônica e a internet, bases da
fragmentação das linhas de produção, pulverizaram o que restava da ideia de
emprego embutida na CLT, sob a proteção do Estado. Eis por que a legislação
trabalhista foi convertida numa usina de litígios, dada a sua inadequação
crescente à forma como funcionam os mercados globalizados. Mesmo com Trump na
Casa Branca.
Apenas
no ano passado, a Justiça Trabalhista — inexistente em vários países — recebeu
3 milhões de novas ações, estatística impulsionada pelo desemprego. Com uma CLT
arcaica tudo pode justificar uma reclamação trabalhista, e sempre haverá um
escritório de advocacia especializado em arrancar um acordo com o patrão e uma
indenização com deságio, parte da qual remunerará advogados. É uma indústria
rentável. Por isso, segundo o sociólogo José Pastore, especialista em relações
de trabalho, o Brasil é campeão mundial de processos trabalhistas.
Mas todo
este aparato criado para supostamente defender o assalariado não consegue obter,
por exemplo, o que os trabalhadores chineses têm conseguido em um país sem a
miríade de direitos incluídos na CLT: os salários chineses triplicaram na
última década; o pagamento por hora já é maior que o praticado em toda a
América Latina, com exceção do Chile. E já representa 70% da remuneração
salarial nas economias menores da zona do euro. Por exemplo, Portugal. Não se
sustenta, portanto, o argumento de que a regulação excessiva do mercado de
trabalho ajuda o emprego e a melhoria de remuneração. É o oposto. Outra prova
disso é que, enquanto o salário dos chineses tem subido, o dos brasileiros e
argentinos — dois dos mais “protegidos” assalariados — tem caído. Também em
função dos equívocos das políticas econômicas kirchneristas e lulopetistas, ambas
intervencionistas.
É por
isso que há inclusive segmentos do sindicalismo a favor da proposta de reforma
pela qual, com a exceção de certos itens da CLT, questões acertadas entre as
partes serão aceitas pelos tribunais trabalhistas, independentemente da legislação.
Será um choque de bom senso.
O Globo
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