LU AIKO OTTA
Sem caixa e com faturas
atrasadas, governo joga para a frente pagamentos do Minha Casa e deve fazer o
mesmo com obras do PAC
Sem dinheiro para manter em dia os pagamentos de
programas que antes eram vitrine, como o Minha Casa Minha Vida e o Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC), o governo acumula faturas em atraso e trabalha
para empurrar os pagamentos para a frente. Na semana passada, foi proposto um
acordo pelo qual as construtoras que trabalham no programa habitacional
receberiam, até meados de agosto, R$ 1,6 bilhão devido pelo governo. Desses, R$
600 milhões foram depositados na quinta-feira.
Em troca, elas concordariam em receber os
pagamentos, de agora em diante, até 60 dias após o serviço ser realizado.
O setor argumenta que, desde o início do programa,
em 2009, a prática eram pagamentos imediatos. O Ministério do Planejamento
informa, por outro lado, que os atuais contratos do programa preveem pagamentos
em 30 dias.
Na semana passada, governo acertou pagar R$ 1,6
bilhão devidos a construtoras do Minha Casa Minha Vida
De qualquer maneira, o resultado prático é que o
governo vai empurrar para 2016 pagamentos que ocorreriam em 2015, caso o
cronograma original tivesse sido mantido.
É, nesse sentido, uma manobra cujo resultado é
semelhante ao das célebres “pedaladas” que tanto ajudaram a melhorar o
resultado das contas públicas entre o final de 2013 e meados de 2014. Nelas, o
governo retardou pagamentos de diversos programas para engordar o saldo do
Tesouro Nacional ao fim de cada mês. Os novos prazos de quitação das faturas do
Minha Casa Minha Vida também produzirão esse efeito sobre o caixa.
A diferença é que, no passado, essa manobra era feita
sem transparência e de forma ilegal, segundo indicam pareceres do Tribunal de
Contas da União (TCU). Por causa disso, o governo corre o risco de ter suas
contas rejeitadas.
Agora, os adiamentos são explícitos e acordados com
quem tem a receber. Com isso, a área técnica procura dar respaldo legal aos
novos prazos de pagamento. Além disso, o perigo de haver contestação das
medidas é muito menor, pois há um acordo envolvido. Nisso, o governo é ajudado
pela própria constatação de penúria do caixa federal.
A dilatação do cronograma de desembolsos do governo
não ficará restrita ao Minha Casa Minha Vida. Em reunião com a Câmara
Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), que congrega as construtoras,
exceto as gigantes do setor, representantes do Ministério do Planejamento
disseram que a postergação do pagamento servirá de parâmetro para outros
investimentos do governo, como o PAC.
Assim, deverá seguir os mesmos moldes a negociação
prevista para ocorrer esta semana, agora com as empreiteiras que trabalham nas
rodovias do PAC, em obras a cargo do Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes (Dnit). Elas alegam ter perto de R$ 2 bilhões a receber e se
queixam de atrasos médios de 120 dias.
Situação parecida enfrentam as construtoras
contratadas para obras de saneamento e mobilidade do PAC. A demora nos
pagamentos chega à casa dos 100 dias, segundo executivos do setor. Nesse caso,
os empreendimentos estão a cargo de prefeituras, em parceria com o governo
federal. Elas dizem que não têm recebido os repasses da União.
Abono. As negociações
para empurrar para a frente os pagamentos devidos pelo governo tampouco ficarão
restritas aos investimentos. Na semana passada, o governo conseguiu aprovar, no
Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), proposta que
adiará o pagamento dos abonos salariais. Com isso, jogará pagamentos de cerca
de R$ 9 bilhões para 2016.
Enquanto as construtoras de médio porte enfrentam
dificuldades até para pagar salários por causa dos atrasos do governo, as
gigantes do setor, que não integram a base da Cbic, não se queixam de
dificuldades tão agudas. Elas possuem caixa para suportar alguma demora, de
forma que não têm pressionado o governo. A cargo delas estão obras como a
transposição do Rio São Francisco.
Questionado, o Ministério da Integração Nacional
informou que não há atrasos nos pagamentos das obras da transposição. “Os
pagamentos são feitos de acordo com a execução das obras”, afirmou a pasta.
LU AIKO OTTA/ BRASÍLIA
O ESTADO DE S.PAULO
04 Julho 2015 | 16h 20
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