Maynard Marques de Santa Rosa
A sensação de insegurança e a incerteza do mercado
de trabalho são os traços da conjuntura que marcam a realidade brasileira
atual. A elas somam-se a desconfiança criada pela corrupção e a falta de
esperança no futuro.
A realidade maquiada pela mídia, no entanto, mostra
um mundo diferente, como a sugerir que não se vive o que se sente. Essa
manipulação confunde o discernimento das pessoas, gera insegurança e lhes afeta
o senso de julgamento. Como é inerente à natureza humana interpretar a
realidade segundo as próprias aspirações, a versão que tende a prevalecer é a
dos sofismas que encantam o povo. Por isso, é fácil enganar a opinião pública.
Em acréscimo, o comportamento do brasileiro é
notoriamente imprevisível. Essa instabilidade provém do descaminho do
inconsciente coletivo, um cadinho de arquétipos herdados dos povos formadores
da raça, que provoca impulsos emocionais imponderáveis. Segundo Gilberto
Freyre, é uma característica da mestiçagem psicológica, um traço da
personalidade coletiva de consolidação mais lenta do que a miscigenação
biológica.
Diante dessa realidade, interpretar o cenário
brasileiro é tarefa arriscada para qualquer analista. Por isso, faço a ressalva
de que os comentários a seguir retratam apenas a minha visão pessoal, sem a
pretensão da verdade absoluta.
Dito isto, passo a abordar o tema, começando pelo
cenário do momento, para, depois, projetar os possíveis cenários de transição e
chegar às considerações finais.
O CENÁRIO POLÍTICO-SOCIAL
O Brasil ainda não superou o estágio da
adolescência sociológica. Porém, é inegável o progresso político já alcançado,
fruto de uma evolução não linear, pela vivência histórica de alternativas
diversas, correspondente aos ideais civilizatórios de cada época. Uma conquista
recente que comprova o avanço político é a Lei de Responsabilidade Fiscal, por
não mais permitir artifícios como a emissão de moeda, para cobrir os rombos das
contas públicas.
No campo da política brasileira, estudos demonstram
que as coligações são sempre pragmáticas, isto é, formadas por interesses e não
por ideias. A exceção à regra pertence aos socialistas militantes que,
investidos de cargo executivo, tendem a usar a ideologia como uma espécie de
muleta, para a solução de problemas que transcendem a sua capacidade de
resolvê-los.
A guinada do Brasil para a esquerda começou com
FHC. Com um passado de militância socialista, sua aparente conversão ao
neoliberalismo ocultava uma intenção transformadora de longo prazo, nos moldes
da Escola Fabiana britânica. Seu governo conseguiu afastar a influência
nacionalista dos militares do centro decisório político, ao relegar o Conselho
de Defesa Nacional e criar o Ministério da Defesa.
Esse ministério nasceu sob a inspiração da doutrina
preconceituosa do “Controle Civil Objetivo”, criada pelo estrategista americano
Samuel Huntington. Na prática, enquanto adotava a receita econômica do Consenso
de Washington, para contentar seus padrinhos estrangeiros, FHC, paralelamente,
fomentava os movimentos sociais, com a criação da Lei das OSCIPs, que permite o
financiamento público dos movimentos sociais, pavimentando o caminho para o PT.
Para chegar ao poder, o PT abriu mão do seu
discurso messiânico. A carta de Lula ao povo brasileiro, de 22 de junho de
2002, avalizada pela aliança pragmática com o PMDB, firmou o compromisso
partidário de respeitar os contratos e as regras do jogo democrático, para
acalmar as correntes conservadoras.
Em sua origem, o PT acalentava o pensamento do
jurista Raimundo Faoro. Em seu livro Os Donos do Poder, Faoro mostra que o
sistema econômico brasileiro não é capitalista nem socialista, mas
patrimonialista, e que o responsável pelo atraso da economia nacional é o que
chamou de estamento burocrático. Essa opinião era consenso nos meios
intelectuais do país e, a partir da década de 1970, incorporou-se como bandeira
de esquerda.
A chegada de Lula à presidência da República, no
entanto, fez prevalecer a perspectiva de poder ilimitado, que se abria sob os
auspícios da ideologia de Antonio Gramsci. Essa doutrina, descrita nos
“Cadernos do Cárcere” daquele filósofo comunista italiano, foi acolhida pelo
Foro de São Paulo, que é a matriz de quase todos os movimentos sociais da
América Latina.
O Foro de São Paulo foi criado por Lula e Fidel
Castro, em 1990, após o colapso do comunismo na Europa, para ser a
Internacional Socialista da América Latina. Na sua primeira conferência, tratou
de discutir o futuro do socialismo e as compensações ao regime cubano pela
perda dos subsídios soviéticos, que representavam 40% do PIB de Cuba. Orienta a
política de relações exteriores do Brasil, com o propósito de fomentar a
integração política, econômica e cultural da América Latina, dentro dos
parâmetros socialistas. Atualmente, congrega mais de 100 entidades, legais e
ilegais, inclusive o PT, PC do B, PSTU, PDT, o MST, o PC de Cuba, o PSUV
(Venezuela), as FARC (Colômbia) e o MIR (Chile).
A doutrina Gramsci é um plano de campanha psicológica,
que tem como meta “desconstruir” os fundamentos da sociedade “burguesa”, a fim
de impor a sociedade marxista; em outros termos, reverter a liberdade
individual, conquistada a duras penas a partir da Revolução Francesa, a um
estágio civilizatório estalinista e pré-feudal. Para isso, preconiza a
infiltração generalizada da administração pública e dos setores dominantes da
sociedade, mediante a “ocupação de espaços”, a fim de conquistar a “hegemonia”,
isto é, o consenso da opinião pública em torno das teses do partido,
legando-lhe a hegemonia política, social e econômica.
Ao assumir o poder, o PT passou a priorizar o seu
projeto subterrâneo, com o uso da propaganda de massa e do Terceiro Setor,
enquanto agia pragmaticamente na condução dos negócios públicos. Sem um plano
de ação, simplesmente, improvisou a sua gestão, dando sequência à administração
anterior. A “ocupação de espaços” já atinge 22,7 mil cargos de nível DAS,
somente na administração direta e nas estatais. O escritor Olavo de Carvalho
afirma que a mesma estratégia foi aplicada às redes de ensino e cultura,
reduzindo-as a instrumentos de formação de militância. Como resultado, a
cultura no país degradou-se e a opinião pública perdeu a sua capacidade
crítica.
O projeto de transformar os costumes foi codificado
em política pública no PNDH-3, contando com os contratos milionários de
propaganda e a utilização dos movimentos sociais na mobilização permanente da
população.
Meus amigos, o Estado é um leviatã biruta, que não
tem o direito de impor costumes à sociedade, sobretudo quando guiado por um
partido que a corrompe, para dominá-la.
Paralelamente, no papel de “intelectual coletivo”,
o partido passou a fomentar os “movimentos de minorias”, ironicamente,
plantados por fundações internacionais com interesses inconfessáveis. Essa
estratégia tem subvertido o quadro de valores da maioria e contribuído para
semear a confusão, levar a opinião pública à anomia e a população urbana à
criminalidade.
Contudo, teve de lançar mão das grandes empresas
privadas, para atender ao compromisso ideológico de socorrer os regimes e
movimentos de esquerda da América Latina. Numa imitação do modelo chinês,
passou a investir recursos do BNDES e dos fundos de pensão em setores
estratégicos que impactam o PIB, como a construção civil, o petróleo e a
indústria automobilística, criando mega-empresários dependentes do Estado. Na
verdade, a política de fomentar “players” internacionais embute uma armadilha
ideológica: numa fase posterior, esses setores podem vir a ser estatizados.
Ironicamente, o artifício fez crescer ainda mais o patrimonialismo no Brasil,
frustrando os intelectuais de esquerda fiéis ao ideário original.
Em pouco tempo no poder, o Partido se deu conta de
que o apoio da sua coalizão parlamentar era incerto, por exigir uma negociação
para cada projeto do governo. Para garantir apoio contínuo, o então ministro da
Justiça, Márcio Thomaz Bastos, concebeu o chamado “mensalão”, como descrito
pelo delegado Romeu Tuma Jr., à página 144 do seu livro Assassinato de
Reputações. O sociólogo Marco Antonio Villa, em Um País Partido, afirma que a
administração petista transformou o Palácio do Planalto em um grande balcão de
negócios; o Poder Executivo ganhou o controle dos outros dois poderes e o
próprio STF passou a ser um “puxadinho” do Palácio do Planalto.
A condenação posterior dos principais dirigentes
partidários por corrupção erodiu o discurso petista pela ética na política.
Graças ao fenômeno do lulismo, a corporação petista teve uma hipertrofia
considerável nos últimos doze anos, mas a sua alma parece ter decrescido na
mesma proporção, arrefecendo o ardor da militância.
Recentemente, a operação “Lava-Jato”, da Polícia
Federal, trouxe a público a notícia de corrupção generalizada na Petrobras,
transformada pelo PT em instrumento político. Somente a parte já comprovada dos
recursos envolvidos na fraude equivale à soma dos orçamentos nacionais da
Bolívia e do Paraguai. A planilha entregue por Pedro Barusco torna pública a
distribuição de R$ 1,2 bilhão de propina ligada aos 89 maiores contratos, no
montante de R$ 97 bilhões. O próprio balanço de 2014 da estatal estimou as
perdas totais por má gestão em R$ 44,6 bilhões. O prejuízo foi contabilizado em
R$ 21,6 bilhões, inclusive o valor das propinas, orçado em R$ 6,2 bilhões.
Por essa mesma operação, descobriram-se ligações
ilícitas com outras estatais, envolvendo recursos de vulto do BNDES e dos
Fundos de Pensão, parecendo demonstrar que a corrupção tornou-se endêmica no
País e que não se restringe à militância do PT, mas implica, também, políticos
dos partidos da base aliada e até mesmo da oposição.
Nos últimos 12 anos, potencializou-se a crise do
setor público, por gestão ineficiente e falta de transparência. A administração
não tem sido capaz sequer de executar o orçamento anual. Não há segurança
jurídica para os grandes empreendimentos. O Estado foi hipertrofiado e o seu
custo vegetativo tornou insuportável a carga tributária. A economia estagnou-se
em 2014, enquanto a taxa de inflação continua a crescer. O governo não cumpriu
o superávit primário de R$ 99 bilhões e ainda teve de postergar débitos no
valor de R$ 226 bilhões, como restos a pagar em 2015. Segundo o ministro
Joaquim Levy, o déficit das contas públicas foi de 7,5% do PIB (= R$ 90,3 bi);
e a dívida interna chegou a R$ 3 trilhões.
Atualmente, o governo tenta aplicar o ajuste fiscal
e aumentar a carga tributária, para estabilizar a economia, mas mantém intocada
uma estrutura gigantesca de 38 ministérios. Somente a despesa anual dos
aluguéis de imóveis necessários para abrigá-los custa R$ 1bilhão. Os
indicadores do ajuste demonstram frustração da meta, pois que a receita já caiu
4,4%, devido à recessão, enquanto que a redução da despesa foi de apenas 0,8%.
Por sua vez, o sistema representativo está,
igualmente, hipertrofiado e caro, o que causa a paralisia do Legislativo. São
32 partidos políticos, muitos deles criados para sigla de aluguel; 513
deputados federais e 81 senadores. O gigantismo contribui para retardar a
solução de problemas candentes, como o da segurança pública, e faz o
Legislativo ceder espaço aos demais poderes.
Os sintomas gerais são de crise política. O apoio
do PMDB ao governo não é mais confiável. A popularidade da presidente caiu para
um dígito. Ela havia se afastado do seu vice, desde que ele apoiou a candidatura
de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, mas viu-se forçada a delegar-lhe
as relações institucionais com o Congresso, o que implica as negociações dos
cargos de 2º e 3º escalões. Portanto, o Executivo não consegue esconder a
própria fraqueza, e isso gera uma distorção do sistema presidencialista,
forçando a presidente a aceitar uma espécie de “status” parlamentarista. E a
insegurança pública, sobretudo nos grandes centros, é tida como alarmante pelo
historiador Bóris Fausto. Por sua vez, os decantados avanços sociais
restringiram-se a uma camada clientelista, em detrimento do progresso geral.
A oposição, no entanto, não consegue se afirmar
como alternativa de mudança, talvez por estar contaminada da mesma sequela
esquerdista. Enquanto isso, grande parte da classe média parece despertar da
apatia de mais de uma década, como ficou patente na última eleição e nas
manifestações recentes, gestadas nas redes sociais.
Sob pressão da crise, o PT não consegue mais
enxergar a realidade. Surpreendido com as manifestações de março, a providência
adotada foi convocar os marqueteiros, para tentar mudar a imagem. Parece que,
de tanto semear ilusões, os ideólogos passaram a acreditar nelas. Eles ainda
não se deram conta de que o objetivo final de todo projeto socialista – a
eliminação da propriedade privada, com a centralização dos meios de produção
nas mãos do Estado – é inviável, como ficou demonstrado na tentativa soviética
de 70 anos e em meio século de marxismo chinês.
O fato é que o projeto socialista fracassou, e a
bandeira da igualdade absoluta está superada pelas conquistas sociais de mais
de um século de evolução contínua. As esquerdas terão que se contentar com os
limites do “welfare state”, em parâmetros não muito diferentes dos de John
Maynard Keynes.
Atualmente, o setor que se mantém como sustentáculo
da economia é o agronegócio, responsável por quase 40% do PIB, um ramo de
atividade difícil de ser cooptado politicamente, mesmo sob a chantagem de uma
legislação preconceituosa, trabalhista, indigenista e ambientalista.
O resultado das eleições de 2014 não convenceu. O
Historiador Marco Antônio Villa classificou-as como as mais sujas da história
da República, consistindo em uma batalha de marketing, em que não sobrou espaço
para o debate de programas. Dilma venceu com 54.490.000 votos, correspondendo a
51,64% dos votos válidos, enquanto Aécio Neves recebeu 51.040.000, isto é,
48,36 %. Foi uma vitória apertada, alcançada por meio da “desconstrução”
da imagem pessoal de Marina Silva no primeiro turno e de Aécio Neves no
segundo, e dos 15 milhões de famílias que recebem o benefício do programa
“Bolsa Família”. E não ficou clara a lisura do processo eleitoral,
pendente de rumores não desmentidos de insegurança das urnas.
O governo saiu enfraquecido, e seu apoio
parlamentar encolheu. Tornou-se refém do mercado e do PMDB e não terá força
para promover as reformas econômicas necessárias, e muito menos para um projeto
de desenvolvimento do país.
O comentário que bem resume a conjuntura atual
partiu do próprio ex-presidente, na reunião com religiosos, organizada por
Gilberto Carvalho, em junho, dentro do Instituto Lula: “Dilma e eu estamos no
volume morto. O PT está abaixo do volume morto”. Na oportunidade, ele ainda
lamentou o resultado de uma pesquisa recente no berço do PT (Santo André e S.
Bernardo do Campo): “A nossa rejeição chega a 75%. Entreguei a pesquisa para
Dilma, em que nós só temos 7% de bom e ótimo”.
Para complicar, veio a repercussão do julgamento
das contas públicas de 2013 e 2014 pelo TCU, depois que uma auditoria feita na
CEF e nos Ministérios do Trabalho e de Desenvolvimento Social comprovou que
foram usados recursos próprios no pagamento de despesas da União com os
programas Bolsa Família, Seguro Desemprego e Abono Salarial. Diligências
posteriores comprovaram a mesma prática pelo Banco do Brasil e BNDES, como
artifício para encobrir o déficit fiscal. O procedimento foi batizado pela
mídia como “pedalada fiscal”, porque viola a lei de Responsabilidade Fiscal. Se
condenada, a presidente fica vulnerável a um processo de “impeachment”.
A classe média já se deu conta da enganação. As
redes sociais viraram caixas de ressonância da opinião pública. O clima de
contestação existente tende a potencializar as manifestações e gerar desordem e
anarquia, com repercussão no Congresso Nacional.
Em evento recente, promovido por um jornalista em
S. Paulo, observei que a pressão só não se tornou irresistível, por falta de
alternativa para o poder, pois os partidos atuais não se apresentam como
solução confiável. Nesse contexto, parece menos mal manter a presidente eleita,
embora limitada por um viés parlamentarista do Congresso, enquanto o cenário
não se define.
Sempre considerei inviável a chamada intervenção
militar constitucional, proposta por um grupo paulista. A meu ver, essa solução
seria fruto de uma minoria alienada e radical, mas fui surpreendido com as
opiniões de três desembargadores, que concordaram com a sua legitimidade. No
debate ocorrido, houve convergência dos civis; ironicamente, apenas eu e o Gen
Castro, que representava o Clube Militar, contrariamos o consenso.
A sociedade clama por mudança. O PT dispersou a sua
oportunidade histórica, com um projeto alienante. O modelo petista entrou em
exaustão, por fadiga política. No entanto, a oportunidade da mudança e a
composição de um governo mais legítimo são variáveis imprevisíveis.
CENÁRIOS FUTUROS
Em vez de projetar cenários alternativos, prefiro
intuir a evolução da conjuntura a partir da situação de fato. O futuro vai
depender do tipo de desfecho da atual crise e da maneira como serão enfrentados
os paradigmas que retardam o progresso. Quase todos esses desafios requerem uma
abordagem de cunho social-liberal, o que me faz crer que essa será a feição do
cenário de transição futuro.
A história política brasileira tem demonstrado que
a maior responsável pelas nossas crises periódicas é a dialética da hegemonia,
uma cultura dos partidos que dificulta a conciliação nacional. O Brasil anseia
por um pacto de conciliação das diversas correntes partidárias em favor do
progresso. O caso histórico da Espanha sinaliza como uma grave advertência.
Após a morte do Gen Franco, os partidos espanhóis conseguiram fechar suas
contas internas no Pacto de Moncloa, ajustadas que foram por uma guerra civil que
perdurou por cinco anos e consumiu 700.000 vidas.
Dentre os desafios ao governo, o primeiro consiste
em recuperar a credibilidade. Para isso, é indispensável racionalizar o
Setor Público, a fim de reduzir a despesa e aumentar a eficiência; enxugar a
máquina administrativa e profissionalizar os quadros, como ocorreu nos Estados
Unidos, após a crise da década grantista.
Na Economia, terá de ser enfrentado o paradigma
patrimonialista, começando por uma legislação que assegure segurança jurídica e
garanta o direito de propriedade, a fim de estimular os investimentos. O
propósito de desenvolver a economia amazônica no contexto do mercado nacional é
uma parte do todo que merece urgência, para responder às pressões
ambientalistas e indigenistas do exterior, que forçam a adoção de uma virtual
zona de exclusão econômica à Região, mediante uma legislação interna
crescentemente restritiva. E a recuperação da competitividade industrial vai
exigir um programa abrangente, voltado para a educação, com a substituição do
modelo atual e desideologização dos quadros docentes.
No campo psicossocial, ressalta a questão da
insegurança pública, cuja solução passa pela revisão da maior parte da
legislação existente, a fim de recuperar a eficácia da punibilidade. A desintoxicação
da opinião pública vai exigir um investimento psicológico monumental em novos
condicionamentos, para recuperar a identidade nacional e os valores
fundamentais da tradição, como: honestidade, solidariedade, patriotismo e
cumprimento da palavra empenhada. Vai ser preciso reeducar o povo pelo bom
exemplo; proteger a família, ensinar as noções de livre-arbítrio individual,
dignidade e respeito e valorizar o mérito das pessoas. Não vejo como encarar o
desafio sem cooperação religiosa.
A solução dos problemas que se acumularam no país
requer uma abordagem sistêmica, condição difícil de se obter, quando não existe
um projeto de futuro. Um país continental de 200 milhões de habitantes não pode
avançar sem planejamento. É preciso superar o atavismo da improvisação, herdado
do colonizador português, como reza Sérgio Buarque de Holanda. Por ironia, foi
o método de planejamento estratégico introduzido por Stalin na União Soviética,
que impulsionou o desenvolvimento das economias capitalistas do Ocidente nas décadas
de 1960/1970.
Feitas essas considerações, vejo dois cenários de
transição possíveis, em função das hipóteses de desfecho da crise: mudança de
governo dentro da ordem e mudança por ruptura.
No primeiro caso, a solução do “impeachment” pode
demandar tempo e pressão popular, em face do compadrio e do comprometimento de
grande parte do Legislativo. O desfecho favorece o PMDB, mas contraria o
interesse do PSDB, que já começa a defender a idoneidade da presidente. Outro
processo menos desgastante, preferido pelo PSDB, é o do julgamento pelo TSE dos
possíveis crimes no financiamento eleitoral, que podem resultar na anulação da
chapa vencedora. Uma pesquisa de opinião recente indicou a probabilidade
de vitória de Aécio Neves em nova eleição. Ironicamente, porém, esta solução
divide o partido, pois elimina as aspirações de Serra e Alckmin, da ala
paulista. Mas, a variante menos traumática seria a renúncia negociada. Essa
alternativa favorece o PMDB; mas, sendo ele o atual avalista do PT, terá
dificuldades em implementar mudanças importantes na transição.
Assim, qualquer que seja a solução legal, e desde
que não haja alteração de paradigmas, as reformas necessárias tenderão a ser
postergadas até uma próxima crise. Portanto, este cenário deve desaguar no
padrão do príncipe Fabrizio Salina, personagem principal do romance de
Lampeduza: “Mudar, para tudo continuar como está”.
O segundo caso, por ruptura da ordem legal, pode
ensejar a adequação da Carta Magna e um programa de reformas, desde que surja
uma liderança esclarecida e obstinada. Esta hipótese é pouco provável no
momento, uma vez que a insatisfação ainda não ameaça o funcionamento das
instituições, a lei e a ordem. Diferentemente das crises de 1930 e 1964, a
conjuntura ainda viabiliza alternativas constitucionais para um desfecho legal.
Contudo, o cenário não pode ser descartado no Brasil, pelas razões arquetípicas
já comentadas.
Por outro lado, considerando o estado de degradação
a que chegou a sociedade, um arranjo emergencial não pode dispensar a contribuição
das instituições que preservaram a credibilidade e os seus valores
fundamentais. De alguma forma, tende a retornar a influência militar
moderadora, o que sugere prevenir o antigo messianismo dos tenentes, a fim de
evitar rejeições.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É evidente que as condições da ordem política atual
não permitem transformações substanciais do “status quo”, mesmo com a
substituição da presidente. A vantagem da mudança seria apenas o descarte do
PT, não obstante constituir esse fato um benefício inestimável ao país.
O método cartesiano nos ensinou que conhecer o
problema é parte da solução. Portanto, é nosso dever esclarecer a opinião
pública da manipulação e dos abusos que vêm sendo perpetrados no Brasil, em
nome da democracia e dos direitos humanos. A juventude precisa ter acesso a
informações outras, de fontes distintas da propaganda oficial.
Mudar é preciso. Neste momento de crise, toda
consciência autônoma, livre e de bons costumes, precisa despertar para a luta
patriótica, contribuindo para o retorno da auto-estima nacional, do orgulho de
ser brasileiro e da esperança no futuro.
Maynard Marques de Santa Rosa é General
de Exército na reserva. Palestra proferida no último dia 15 de julho na
Associação dos Ex-Combatentes do Brasil, no Distrito Federal.
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
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