Pedro Valls Feu Rosa
Dia
desses, lendo um jornal europeu, deparei-me com uma daquelas notícias que
deveriam ensejar uma longa reflexão sobre alguns conceitos relativos à vida
democrática – uma conquista da humanidade, fruto de sacrifícios imensos ao
longo de milênios.
A notícia
dizia que um membro do Parlamento Europeu fora flagrado desperdiçando dinheiro
público a um ponto tal que teria solicitado reembolso da compra de um elefante!
O simpático paquiderme teria sido adquirido por precisos 2.200 Euros. A
notícia, como não poderia deixar de ser, causou espécie na opinião pública.
Eis que,
em meio à paquidérmica confusão instalada, veio o esclarecimento: tratava-se,
apenas e tão somente, da compra de livros junto à editora “Ephelant” – que
alguém registrou como “Elephant”, ou “elefante” em inglês.
Notei
que o esclarecimento sobre erro tão grave ocupou meras duas frases, em
contraste com o amplo noticiário desfavorável que fora criado – afinal, se
verdadeira a notícia, não é todo dia que um deputado adquire um elefante
com dinheiro público! O problema é que ela não era – de verdadeiro só restou o
irreparável dano causado à imagem.
E assim
segue a vida democrática no Ocidente, fiel à acusação de Bacon: “caluniar
audaciosamente, algo sempre pega”. É assim que as pessoas de bem começam a,
desgostosas, abandonar a vida pública, para desdouro de uma democracia a
cada dia mais desacreditada.
Fiquei a
pensar em Hisayasu Nagata, um parlamentar federal japonês. Não faz muito tempo
ele acusou, em plena sessão do Parlamento, o filho do Secretário-Geral do
Partido do Governo, Tsutomu Takebe, de receber ilegalmente de uma dada
empresa cerca de R$ 540.000,00.
Esta
grave acusação, endossada por seu Partido, o DPJ, foi objeto de rigorosa
apuração, e constatada manifestamente infundada. A imprensa passou a
qualificá-la como “fiasco”.
O
acusador, o parlamentar federal Hisayasu Nagata, sob pressão da imprensa e da
opinião pública, renunciou ao mandato – considerou-se que tinha sido
irresponsável para com a honra alheia em sua função de oposicionista.
No mesmo
dia em que o parlamentar Nagata renunciou ao mandato toda a cúpula de seu
partido político, o DPJ, igualmente renunciou aos seus cargos de direção –
desde o presidente até o secretário-geral. A opinião pública considerou
inadmissível o fato de um partido de oposição endossar denúncias sem checar a
procedência das mesmas.
Entrevistado
pelo jornal Yomiuri, o presidente do partido, Seiji Maehara, declarou-se
culpado por ter permitido que denúncias sem fundamento fossem tão longe.
Enquanto
isso, naquela época, Takemasa Moriya, Vice-Ministro da Defesa do Japão, era
condenado a dois anos e meio de prisão. O crime dele: aceitar de uma empresa
três viagens para jogar golfe e ter mentido ao Parlamento. Sob o rótulo de
“disgraced”, foi afastado definitivamente da vida pública. O presidente da
empresa que lhe deu o presente não foi poupado – vai amargar 18 meses de
prisão.
Não
menos desafortunado foi o parlamentar Takanori Sakai: após um curto processo,
viu-se condenado a 32 meses de prisão por omitir doações eleitorais
equivalentes a R$ 3 milhões. Ele também foi afastado definitivamente da
vida pública.
Todos
estes fatos, que reputo profundamente ilustrativos, aconteceram há alguns meses
no Japão, aquele pequeno e pobre país desprovido de petróleo, minérios e quase
todos os recursos naturais essenciais, mas cujo PIB, de quase US$ 6
trilhões, o conduz ao posto de terceira maior economia do planeta.
O Japão,
evidentemente, não é um país perfeito – tem lá suas graves falhas por corrigir.
Mas eis aí alguns bons exemplos de combate à impunidade e igualmente de
respeito à honra e à imagem dos homens públicos.
Pedro
Valls Feu Rosa é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo.
Diário do Poder
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