A Voz do Cidadão
Neste domingo de manifestações que se espalham por pelo menos 257
cidades, todas as atenções estão voltadas para os “malfeitos” (termo
citado pela presidente da República, mas que se tornou um triste
deboche, face aos bilhões de reais “diuturna e noturnamente” roubados do
poder público) dos detentores do poder federal, seus assessores,
apaniguados e que-tais. Um show dos horrores com que a grande mídia nos
brinda em diversas doses ao longo do dia.
Que tal um olhar diferente;
o olhar do cidadão comum? Você acompanha o que o prefeito e os
vereadores do seu município andam fazendo com o dinheiro dos seus
impostos? E não é pouco. Somente este ano, através do Fundo de
Participação dos Municípios, os 5.565 municípios receberam um total de
40 bilhões de reais. Fora os impostos arrecadados localmente como IPTU,
ITBI e outros. E vale lembrar que são os vereadores os responsáveis por
fiscalizar prefeitos e secretários.
Mas a responsável por esta onda
midiática – a Operação Lava Jato, baseada em Curitiba, no Paraná –
também é uma grande fonte de inspiração para os cidadãos atuantes. Por
sua influência no imaginário social, cidadãos de diversas cidades do
interior do estado decidiram tomar para si as rédeas da situação
política. E começaram a pressionar suas câmeras de vereadores por mais
eficiência, salários menores e até menos vagas nas casas legislativas.
O
caso pioneiro aconteceu na pequena Santo Antônio da Platina. Mês
passado, os vereadores da cidade decidiram aumentar seus próprios
salários e o do prefeito em pouco mais de 50%. Ante a indignação dos
moradores, capitaneados por uma empresária local, não só o aumento foi
cancelado como, a partir da próxima legislatura, eles vão diminuir.
Rapidamente
a notícia se espalhou pela região norte do estado e cidadãos de outras
cidades passaram a seguir o mesmo caminho e a pressionar seus
vereadores. O exemplo de Jacarezinho, distante 380 quilômetros de
Curitiba, é o mais emblemático. Ao ver chegar cada vez mais cidadãos
para uma sessão que discutiria o aumento, um dos vereadores debochou, e
disse que eram só “uns gatos pingados”. Na sessão que bateria o martelo,
com tudo pronto para a aprovação do aumento, a casa ficou lotada de
manifestantes, que começaram a miar em resposta ao político. Assim, o
miado virou símbolo dessa forma de protesto e de fiscalização que tem
atraído a atenção de outros cidadãos e organizações civis dedicadas ao
controle social sobre mandatos, políticos e governos. Resultado em
Jacarezinho: revogação da emenda que tinha aumentado de nove para 13 o
número de vereadores na cidade, e aprovação de um corte de 30% nos
salários.
Enquanto em Ribeirão do Pinhal e Rolândia a sociedade já
conseguiu fazer tramitar projetos de lei para diminuição dos vencimentos
de vereadores e prefeitos, em Wenceslau Braz, Colombo e Ponta Grossa,
se não conseguiram o objetivo, pelo menos tiveram sucesso na diminuição
do número de cadeiras nas câmaras. Menos vereadores, menos custos para a
sociedade.
E a boa nova ultrapassou as fronteiras do Paraná. Os
integrantes do movimento de Jacarezinho contam que recebem diariamente
diversas ligações de outros municípios por todo o país, para saber
detalhes da organização e das propostas debatidas com os políticos. São
João do Rio do Peixe, na Paraíba, já conseguiu a redução no número de
vereadores na cidade. Chapecó (SC), São Caetano (SP), Foz do Iguaçu
(PR), Monte Alto (SP) e dezenas de outras começam a seguir o mesmo
caminho. E sempre sob a pressão firme da sociedade.
Cabe aqui nossa
crítica aos produtores de conteúdo da grande mídia. Notícias como estas,
que inspiram a mobilização da sociedade, a compreensão do correto
conceito de cidadania política e controle social, a construção no
imaginário social de uma cultura política participativa e
verdadeiramente republicana, raramente alcançam as editorias nacionais. O
obsessivo denuncismo presente na grande mídia resulta numa
desmobilização da cidadania para a atuação política, na alienação dos
cidadãos e na confusão do legítimo conceito da cidadania política, vista
como apenas a estéril e pontual participação nas eleições e não como
uma atividade intrinsecamente voltada ao interesse público.
Se, na Educação, perdemos tempo com um mal disfarçado ativismo
ideologizante, sem a formação de valores, e se a Justiça ainda se mostra
tão desconectada da sociedade como a classe política, teríamos na mídia
a grande indutora desta virada da cidadania atuante no país.
Infelizmente, produtores de conteúdo do jornalismo e do entretenimento
não se dão conta de suas responsabilidades. Por isso, iniciativas como
as dos cidadãos do norte do Paraná são bem-vindas e merecem a maior
publicidade possível.
Com eles, vamos mostrar que os “gatos pingados”
da cidadania deixaram de miar pelos cantos e começam a rugir em todo o
país.
A Voz do Cidadão
Nenhum comentário:
Postar um comentário