Alfredo Lopes
É curioso lembrar que o projeto Zona Franca, um
modelo que a Constituição de 1946 já havia desenhado para reduzir as
desigualdades regionais entre Sudeste e Norte/Nordeste - com a adoção de
mecanismos de renúncia fiscal - dormia na gaveta do descaso federal há 10 anos,
e só voltou à tona em 1967, pela necessidade de "deter a cobiça
internacional."
A refinaria instalada em Manaus pela dupla Moysés
Israel e Isaac Sabba mostrou a importância do setor privado na mobilização das
ações públicas complementares. De quebra, o continente estava fervendo com os
conflitos esfarrapados da guerra fria entre Moscou e Washington, convivendo com
as pretensões explícitas de corporações estrangeiras de acesso e posse da
biodiversidade e recursos minerais. E o Brasil, reativo como sempre, criou a
ZFM, sob a ideologia do “integrar para não entregar”, como dizia o slogan do
governo militar.
Na semana passada, entre graves alertas para o
descaso crônico da União, na reunião com as entidades do setor produtivo, a
convite da FIEAM, o general Theóphilo de Oliveira destacou a necessidade de
convidar os cientistas estrangeiros para enfrentar a obviedade dos promissores
desafios. A paranoia da cobiça deu lugar à partilha de saber e fazer, num mundo
sem fronteiras e carente de sólidas parcerias para fazer da pesquisa opções de
prosperidade com projetos não predatórios, eficazes na promoção humana e no
combate à sinistra economia do tráfico.
E o que é o Pró-Amazônia do general além desta
percepção das potencialidades que ultrapassam US$ 4 trilhões? Aqui resiste o
aquífero Içá-Solimões, algumas vezes maior que o segundo maior do Brasil,
também situado na Amazônia, Alter-do-Chão, dizem estudos avançados da Geologia
da USP. E a água se tornou o bem natural mais precioso do terceiro milênio.
Mas não é só de água que a Amazônia afoga a omissa
do governo do Brasil. Seus minerais preciosos, estratégicos, vitais para, entre
mil e uma utilidades, fertilizar a produção de alimentos; o banco genético para
a nutracêutica, dermocosmética, piscicultura, fitoterapia e a medicina
holística... sugerem que o Brasil continua marcando passo porque quer ou por
inc ompetência gerencial. Sem infraestrutura de transporte rápida e adequada,
banda larga civilizada e fontes inteligentes de energia, entretanto, essa
riqueza e nada se equivalem.
Gilberto Mestrinho deixou algumas lições com a
autoridade de Boto Navegador, identificado com os mistérios da Hileia. Um
combatente ferrenho dessa onda perversa de tratar a floresta com o mesmo
preservacionismo com que a Índia trata suas vacas, percebeu em vida a
insensatez de estigmatizar cientistas como piratas da biodiversidade. E
defendeu, como tem feito o CMA - Comando Militar da Amazônia -, de Theóphilo e
Villas-Bôas, as promissoras parcerias internacionais com regras claras e
propósitos transparentes de pesquisa e intervenção de boas práticas
empreendedoras.
Dizia o Boto, há quase três décadas, no epílogo de
Amazônia, Terra Verde Sonho da Humanidade, "O mundo civilizado, há 500
anos, reivindica apropriar-se da Amazônia e é compreensível esse anseio quando
se tem o mínimo de informação a seu respeito. Como conduzir com inteligência a
ocupação desse espaço, senão nas pesquisas, nos investimentos conjuntos, na
identificação de talentos, e na mão de obra qualificada, na experiência
prazerosa da poesia natural, sem xenofobia muito menos ingenuidade, uma
oportunidade única para resgatar definitivamente o convívio saudável e urgente
entre o homem e a natureza". E ponto.
Alfredo Lopes
Filósofo e ensaísta
Consultor do CIEAM - Centro da Indústria do Estado do Amazonas.
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