Kate Brady
Uma
enorme caixa de madeira emerge no terreno de um antigo hospital militar
americano, nos arredores da cidade alemã de Heidelberg. A estrutura de 14
metros quadrados, com janelas e móveis, parece à primeira vista mais uma cabana
de jardim do que uma casa.
Mas
trata-se do protótipo de um dormitório estudantil de quatro andares - uma
tentativa de proporcionar conforto para jovens em meio à crise habitacional
pela qual passa a Alemanha.
Como
muitas cidades ao redor do mundo, Heidelberg está tendo dificuldades para
abrigar um influxo rápido de jovens profissionais e estudantes. Isso deu origem
a um lucrativo mercado de aluguel e, por consequência, falta de moradia. Desde
2010, os aluguéis na cidade universitária aumentaram quase 25%. Para os
estudantes, que costumam morar em apartamentos compartilhados, o valor de um
quarto não sai por menos do que 437 euros por mês, em média - cerca de R$
1.950.
A fim de
amenizar a crise nacional de habitação, o governo da chanceler alemã, Angela
Merkel, prometeu construir 1,5 milhão de apartamentos em todo o país até o fim
de seu quarto mandato, em 2021.
O
cenário adverso motiva diversas alternativas, como o grupo de 25 estudantes
universitários que tomou a iniciativa de construir, com as próprias mãos, seus
dormitórios estudantis em Heidelberg: o Collegium Academicum.
"Queremos
criar um espaço acessível, onde os estudantes possam viver juntos e aprender
juntos", diz à BBC Capital Ina Kuhn, estudante de psicologia de 22 anos e
membro do projeto do dormitório.
Os
aluguéis no Collegium Academicum, com 226 quartos dentro de 46 apartamentos
compartilhados, devem girar em torno de 300 euros (R$ 1.330), em média, por
mês, com a possibilidade de cair ainda mais no futuro, assim que o empréstimo
bancário for liquidado.
A
sustentabilidade também é um objetivo fundamental do projeto. O terreno foi
comprado da prefeitura. Equipado com janelas de vidro triplo e totalmente
construído em madeira, o Collegium Academicum será o maior edifício da Alemanha
sem suporte de metal. Mas, orçado em 16 milhões de euros (R$ 70 milhões), esse
projeto sustentável não sai barato.
A maior
parte do dinheiro veio de empréstimos bancários, recursos públicos e do
instituto de crédito alemão para revitalização. Ainda assim, 2 milhões de euros
do custo total (ou 12,5%) tinham que vir de capital próprio.
A construção
deve começar dentro das próximas semanas, e os primeiros inquilinos devem se
mudar no início de 2021.
Universidades gratuitas
Fundada
em 1386, a Universidade de Heidelberg é a mais antiga da Alemanha e uma das
três mais prestigiadas do país. Rankings internacionais de educação a
posicionam na 47ª colocação entre as melhores do mundo. Por isso, todos os
anos, recebe milhares de novos alunos. Atualmente, cerca de 40 mil dos 160 mil
cidadãos da cidade são estudantes.
Além
disso, sua pitoresca paisagem, emulando uma "cidade de brinquedo",
também vem se tornando uma atração à parte para os estrangeiros. De acordo com
a prefeitura, a maior parte dos novos moradores de Heidelberg nos últimos anos
veio da China, Itália, Romênia, Índia e Polônia - e têm entre 18 e 30 anos.
Mas, em
comparação com estudantes universitários nos EUA e no Reino Unido, os alunos
alemães apresentam uma significativa vantagem financeira. Em 2014, todos os 16
Estados alemães aboliram as taxas de ensino universitário para estudantes de
graduação, o que significa que tanto estudantes de graduação alemães quanto
estrangeiros estudam gratuitamente nas universidades públicas. A maioria deles
paga uma pequena taxa semestral de custos administrativos.
Demanda maior do que a oferta
Apesar
disso, o semestre que se inicia em outubro é especialmente difícil para os
estudantes que procuram moradia, diz Studierendenwerk, uma organização estatal
sem fins lucrativos que dá apoio a universitários que estão em busca de
acomodação.
"Nessa
época, muitas vezes há mais estudantes tentando encontrar um lugar para morar
do que acomodações - especialmente acomodações acessíveis", diz Tanja Modrow,
diretora da Studierendenwerk Heidelberg.
Sendo
assim, muitos deles têm que viver mais longe ou se submeter aos altos custos de
vida. A forte presença de áreas verdes também faz com que cada vez mais
recém-formados escolham morar na cidade universitária para dar o pontapé em
suas carreiras ou construir suas famílias, aumentando ainda mais a pressão
sobre a escassa oferta de moradia. No estado de Baden-Württemberg, onde fica
Heidelberg, o Partido Verde da Alemanha está atualmente liderando as pesquisas de
opinião com 32%.
Escassez de moradias pelo mundo
Os
estudantes de Heidelberg não estão sozinhos em sua luta para encontrar moradia
acessível na Alemanha. O último índice de preços do Instituto de Economia
alemão mostra que os custos dos aluguéis de estudantes nas cidades
universitárias alemãs subiram de 9,9% para 67,3% desde 2010.
Em
abril, milhares de pessoas protestar nas ruas da capital Berlim para pressionar
o governo. A cidade, que se tornou um dos mercados imobiliários de maior
crescimento do mundo, realizará em breve um referendo sobre a expropriação em
massa de propriedades pela cidade.
A
escassez de moradias e de aluguéis acessíveis são um problema muito comum para
estudantes de outras cidades universitárias.
Em
Hobart, na ilha da Tasmânia, na Austrália, a Universidade da Tasmânia comprou
recentemente um hotel de três estrelas em uma tentativa de alojar os estudantes
que não conseguem acomodação a um preço acessível.
Um
crescente número de turistas e a expansão do Airbnb têm desempenhado um papel significativo
na crise habitacional pela qual passa a cidade.
Enquanto
isso, na costa oeste dos EUA, na Universidade da Califórnia, em Berkeley, um
novo programa está unindo estudantes de pós-graduação a aposentados que têm um
quarto sobrando. Em troca de um teto, os estudantes proporcionam aos
aposentados interação social, ajuda na casa, além de aluguel mensal de menos de
US$ 1 mil (R$ 4 mil) - menos de um terço dos preços médios dos apartamentos em
Berkeley.
BBC
Capital
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