quinta-feira, 4 de outubro de 2018

FMI alerta sobre novo recorde de dívida global: 715 trilhões de reais

LUIS DONCEL

Christine Lagarde, diretora-gerente do Fundo, prevê desaceleração do crescimento mundial abaixo dos 3,9% projetados há apenas três meses

Fundo Monetário Internacional (FMI) está prevendo uma tempestade. Antes de iniciar a cúpula da próxima semana em Bali (Indonésia), a organização mostra preocupação com o ritmo da economia internacional nos últimos meses e, sobretudo, com o que possa acontecer nos próximos. Em discurso nesta segunda-feira em Washington, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, não se mostrou preocupada apenas com a desaceleração da economia -- o PIB global crescerá menos do que os 3,9% previstos há apenas três meses --, mas também com os perigos que até recentemente pareciam hipotéticos e, agora, estão se materializando.

Lagarde também alertou sobre um problema que nunca deixou de existir, mas que agora parece mais presente do que nunca. A dívida global -- tanto pública quanto privada -- bate recorde após recorde. Segundo os economistas do Fundo, já atingiu 182 trilhões de dólares (cerca de 715 trilhões de reais na taxa de câmbio atual). Desde seu relatório do ano passado, o valor da dívida global aumentou em 18 trilhões de dólares.
O monstro da dívida não para de crescer. Já supera em 60% o montante de 2007, um ano antes da Grande

Recessão chegar com toda força para mudar o mundo. E esse número é mais preocupante agora, já que o período de estímulo monetário dos grandes bancos centrais parece ter chegado ao fim.

Correções abruptas no mercado
"Governos e empresas estão agora mais vulneráveis a um aperto das condições financeiras. Economias emergentes e em desenvolvimento já estão sentindo o impacto, enquanto se adaptam a uma normalização monetária no mundo desenvolvido", disse Lagarde em Washington. Não bastasse esse cenário desfavorável, a situação pode piorar. O FMI projeta correções abruptas no mercado e nas taxas de câmbio, caso o processo de restrição das condições financeiras continuar seu curso.

Lagarde começou sua intervenção com boas notícias: o PIB mundial continua crescendo no ritmo mais alto desde 2011, o desemprego permanece caindo na maioria dos países e a porcentagem de pessoas que vivem em extrema pobreza atingiu um novo mínimo, abaixo de 10% da população mundial. São dados importantes, sem dúvida, mas as boas notícias terminam aqui. Porque, segundo a diretora-gerente do FMI, "o clima da economia global está começando a mudar". Se há um ano Lagarde recomendava aproveitar o bom momento para fazer reformas -- "O sol brilha. Consertem o telhado", dizia -- e há seis meses alertava sobre as nuvens escuras no horizonte, agora reconhece que os riscos identificados previamente "começaram a se materializar".

E, como o FMI e várias instituições alertaram em outras ocasiões, o maior risco é o início de uma guerra comercial. O problema é que este já não é um perigo hipotético. Nas palavras de Lagarde, "a retórica está se transformando em uma nova realidade de barreiras comerciais efetivas".

Estas não apenas prejudicam o comércio, como também o investimento e a indústria, que são afetados pelo aumento das incertezas, acrescentou a diretora-gerente do FMI.

Por enquanto, entre as economias desenvolvidas, as mais afetadas por esse novo clima de descontentamento são a zona do euro e o Japão. Enquanto isso, os Estados Unidos, o verdadeiro gatilho desta nova onda de protecionismo, parecem estar resistindo melhor ao vendaval neste momento, graças à expansiva reforma fiscal da Administração Trump. Mas tudo isso pode mudar se a guerra comercial continuar.

Já existem alguns claros perdedores: os países emergentes, que estão sofrendo as consequências negativas destas tensões. Caso a guerra tarifária piore, Lagarde tem uma recomendação: "Se os acordos não puderem ser alcançados entre todos os países, os Governos podem usar pactos comerciais flexíveis nos quais colaborem, no âmbito da Organização Mundial do Comércio, aqueles com uma forma de pensar semelhante", concluiu.

MULHERES SÃO AS MAIS PREJUDICADAS POR AUTOMAÇÃO
Lagarde também analisou a perda de empregos associada à revolução tecnológica, mas mencionou um aspecto que geralmente não recebe muita atenção: como esta destruição -- 26 milhões de empregos correm o risco de desaparecer nos 36 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) -- afeta principalmente as mulheres. O argumento é que as mulheres tendem a ocupar posições de atividades rotineiras, e estes são precisamente os mais ameaçados pela automação.

O FMI também anunciou nesta segunda-feira que a indiana Gita Gopinath substituirá Maurice Obstfeld no final de 2018 como economista-chefe do Fundo. Será a primeira vez que uma mulher ocupará o posto, unindo-se àquelas que já realizam essas mesmas funções no Banco Mundial e na OCDE.

EL PAÍS


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