O Brasil vive uma rara
conjugação de crise política com crise econômica e crise ética. Todas são de
grande proporção, a ponto de acarretarem também uma grave crise institucional.
O resultado tem sido a duradoura mobilização social que há meses parte o País.
É nesse contexto, e no
momento em que o destino político do comando do governo encontra-se sob a
responsabilidade do Senado Federal, que o Bloco Moderador toma a iniciativa de
apresentar proposta que viabilize a reconstrução do Brasil, qualquer que seja o
responsável pelo Governo após a superação da inédita e gravíssima crise
política.
Trata-se de colaboração
de natureza institucional, inspirada no consenso das observações e da percepção
dos integrantes do Bloco Moderador, plenamente adaptadas e atualizadas à
realidade desta segunda década do século XXI, e com base no documento “Brasil: Um
Projeto de Reconstrução Nacional”, publicado em 1991.
Senado
Federal, 18 de abril de 2016.
Senador FERNANDO COLLOR
Líder do
Bloco Moderador - PTB – PR –
PSC – PRB – PTC
I – REFORMA POLÍTICA: O SISTEMA
PARLAMENTAR DE GOVERNO
Considerada
a “mãe de todas as reformas”, a reforma política precisa ser definitivamente
encarada de frente por todas as instituições brasileiras, sob o protagonismo do
Congresso Nacional.
O sistema
presidencialista, agravado nos últimos mandatos pelo chamado “presidencialismo
de coalizão”, perdeu de vez a sua funcionalidade e tornou-se incapaz de
proporcionar uma condução política e institucional minimamente viável para
qualquer Governo que assuma o comando da Nação.
Todos já
percebemos que o atual modelo de se fazer política esgotou-se. Precisamos,
portanto, de uma “nova política”, em que os partidos deixem de ter como única
serventia o ato de votar, e passem também a ter o papel de formular.
Não há
mais espaço para o fisiologismo, que humilha e desacredita a classe política
perante a população brasileira. Precisamos sair desse desânimo institucional,
desse desencanto com a missão política. Daí ser necessário o correto
diagnóstico da situação e a apresentação de ideias claras e definidoras para
uma autêntica mudança do sistema político brasileiro.
Mais do
que nunca, urge que a classe política, juntamente com a sociedade, debata com
seriedade, sobriedade, mas com determinação, a opção do modelo parlamentarista
de governo e suas possíveis variáveis.
Será este
o remédio para os principais males da política nacional, a começar pela
perspectiva de que o País dificilmente voltaria a passar por crise política,
econômica e institucional de tamanha gravidade como a que vivemos hoje.
No
parlamentarismo, qualquer crise, de qualquer natureza, é solucionada logo em
seu nascedouro, na medida em que a perda do apoio político para se governar
enseja a imediata substituição de todo o comando da equipe governante, sem
precisar, portanto, que se espere o término do mandato de um governo. É por
isso que se diz que enquanto o presidencialismo é o regime da
“irresponsabilidade a prazo certo”, o parlamentarismo é o regime da
“responsabilidade a prazo incerto”.
Ademais, a
adoção desse novo regime permitirá, naturalmente, a consecução da tão esperada
e necessária reforma política. A fórmula é, portanto, simples: a adoção do
parlamentarismo, avalizada por referendo popular, que necessariamente demandará
as mudanças adaptativas tanto no sistema eleitoral como no sistema partidário
brasileiro. É a fórmula que temos para evitar crise política que nos legue, como
hoje, um Brasil partido. Sim, um Brasil partido nas suas esperanças, nas suas
expectativas, nas suas crenças, no seu propósito. Precisamos, pois,
reunificá-lo, reconciliá-lo entre seus entes e consigo próprio.
Assim, aos
que alegam que o Brasil não pode adotar o parlamentarismo por não possuir
partidos fortes, é preciso dizer que, na realidade, o Brasil não possui
partidos fortes por não ser parlamentarista.
II – O PAPEL DO ESTADO
Ao Estado
impõem-se duas grandes tarefas: o apoio à transformação da estrutura produtiva
e a correção dos desequilíbrios sociais e regionais.
A retomada
do crescimento sustentado se dará partir da transformação da estrutura
produtiva que contemple aumento sistemático da produtividade, melhoria
permanente da qualidade de produtos e serviços e fomento à capacidade de
inovação. Caberá ao Estado recriar as condições macroeconômicas e prover, em
trabalho conjugado com a iniciativa privada, as infraestruturas econômica,
tecnológica e educacional necessárias à reestruturação competitiva das
empresas.
Para
reverter a grave situação de desequilíbrio social e regional, é necessário,
além de mecanismos alternativos de financiamento à infraestrutura social,
estabelecer, por meio da coordenação das diversas esferas de governo, políticas
sociais, regionais e de caráter compensatório. Assim, o Estado estará
recuperando sua dimensão de promotor do bem-estar social, mas indo além do
assistencialismo puro e simples, já que o propósito passaria a ser o de igualar
as condições de partida.
A realização
dessas tarefas requer uma mudança significativa na natureza do Estado e nas
suas formas de atuação. O que se propõe é um Estado menor, mais ágil e bem
informado, com alta capacidade de articulação e flexibilidade para ajustar suas
políticas.
A tarefa
de modernização da economia terá na iniciativa privada seu principal motor. Ao
Estado cabe, porém, um importante papel de articulador dos agentes privados,
com vistas a mobilizar esse conjunto de forças em direção aos objetivos de
progresso e justiça social.
Assim,
fatores como controle inflacionário, equilíbrio fiscal,redução do custo dos
negócios, política responsável de crédito, redução da burocracia, entre outros,
são cruciais para a retomada do crescimento do País.
Reforma do Estado
O grave
desequilíbrio financeiro do Estado encontra-se no cerne da crise brasileira.
Este desequilíbrio caracteriza-se, principalmente, pelo excessivo custo da
máquina estatal, que gasta além do necessário sem oferecer, contudo, o retorno
desejado pelos usuários dos serviços públicos. Ou seja, o Estado, além de
gastar muito, gasta mal.
A
superação da crise e a viabilização de um projeto de desenvolvimento para o
País dependem de quatro fatores fundamentais: primeiro, a credibilidade do
governante, a segurança jurídica dos contratos, que o ajuste fiscal ganhe
dimensão estrutural e, por fim, que o aparelho estatal seja modernizado e
profissionalizado mediante ampla reforma.
Para
conferir alcance estrutural e permitir o saneamento financeiro do setor público
é fundamental realizar uma revisão das finanças públicas, com ênfase na
reavaliação da atual estrutura tributária e do Orçamento da União.
O sistema
tributário brasileiro apresenta uma série de problemas estruturais que
dificultam uma correta condução da política fiscal. É um sistema regressivo,
baseado em impostos indiretos, e excessivamente complexo, o que justifica sua
revisão. É crucial ampliar a base para reduzir as alíquotas, minimizando os
níveis de evasão e sonegação fiscal, além de substituir a desoneração do investimento
produtivo de alguns poucos setores pelo estabelecimento de regras gerais
simples e justas para todos.
Além do
reexame da estrutura de receitas, é fundamental buscar a reestruturação do
gasto público. A sociedade só aceita uma carga tributária elevada se reconhecer
que o Estado cumpre sua obrigação de devolver os recursos arrecadados sob a
forma de uma oferta compatível de bens e serviços públicos. Nesse sentido, uma
redefinição ampla do padrão do gasto público, com prioridade para sua
eficiência, é indispensável.
Reforma Administrativa
A
excessiva intervenção do Estado na economia e na vida do cidadão, além de
contribuir para a baixa produtividade do gasto público e elevá-lo de forma
desordenada, gera graves distorções. Multiplicaram-se órgãos e repartições, com
caráter predominantemente regulador ou de controle, em detrimento da oferta de
bens e serviços públicos na quantidade e qualidade desejadas pela sociedade.
Para que o
Estado possa, efetivamente, desempenhar bem suas funções, é necessário transformar
o serviço público em “serviço para o público”, por meio de sua
profissionalização e a consequente qualidade da gestão.
Desburocratização
Excessivos
controles, regras e exigências constituem não somente obstáculo ao
desenvolvimento da atividade produtiva, mas também interferência indevida do
Estado na vida dos cidadãos.
A desburocratização,
visando maior liberdade e eficiência no exercício da atividade econômica, deve
se orientar pelos seguintes princípios básicos: substituição de normas específicas
por normas gerais; fortalecimento do papel fiscalizador do Estado no combate ao
abuso do poder econômico e desrespeito ao consumidor; remoção de exigências que
oneram desnecessariamente a empresa privada e o consumidor; e, melhoria dos
serviços públicos e de atendimento à população.
Desestatização
A
redefinição da atuação do Estado, restringindo o investimento estatal às áreas
prioritárias, constitui instrumento de redução da dívida pública, concorrendo,
assim, para o saneamento financeiro das contas governamentais.
O aumento
da eficiência administrativa e produtiva e a realização de novos investimentos
criam, por certo, condições para o mercado aumentar a oferta de insumos básicos
a preços menores.
Esse
processo engloba prioritariamente a concessão ao setor privado da exploração de
serviços públicos e execução de obras públicas, devidamente regulamentadas pela
lei.
Por outro
lado, é fundamental resgatar o caráter público das empresas estatais que, de
fato, constituem-se como necessárias às políticas de governo. Para tanto, é
preciso reforçar o controle sobre a estratégia global da empresa, de forma a
cumprir os objetivos nacionais, mas liberando-as do monitoramento de curto
prazo e da demasiada ingerência política. Somente assim elas terão liberdade gerencial
para alcançar as metas de rentabilidade, produtividade, endividamento e
investimento fixados pelos interesses globais do país.
III – PRIORIDADES PARA A RECONSTRUÇÃO
NACIONAL
Reestruturação
Competitiva da Economia
A retração
dos investimentos produtivos contribui para acelerar a deterioração da
competitividade da economia brasileira, estimulando movimentos especulativos e
de elevação das margens de lucro, o que amplia os desequilíbrios
macroeconômicos, aumenta a ineficiência dos processos produtivos e a iniquidade
distributiva.
Do mesmo
modo, na ausência de estímulo ao desenvolvimento tecnológico e à busca de
ganhos de produtividade, a manutenção de margens elevadas depende da prática de
salários baixos e do uso predatório de recursos naturais.
O cerne da
estratégia, tendo como objetivo maior a melhoria da qualidade de vida da
população brasileira, deve ser a busca do aumento progressivo da
competitividade da economia, e os caminhos a seguir devem observar as seguintes
premissas: os desafios de modernização e elevação da competitividade exigem
transformações estruturais importantes em todo o sistema econômico e não apenas
nesse ou naquele setor; a desburocratização; o incremento na capacitação
científica e tecnológica interna e a melhoria na formação de recursos humanos
são elementos indispensáveis ao processo de modernização.
Indústria
São
necessárias ações específicas visando à redução do custo dos investimentos, à
promoção das exportações, à capacitação tecnológica e ao apoio ao incremento da
qualidade e produtividade das empresas.
Nesse
contexto, o aumento da oferta de infraestrutura e logística adequadas e
eficientes torna-se fundamental.
Do mesmo
modo, a abertura completa do mercado faz-se necessária, na medida em que, hoje,
a indústria de ponta se organiza em cadeias globais, nas quais o Brasil precisa
se inserir definitivamente. Fora dessa concepção, a indústria não alcançará
escala para crescer.
Assim, se
esse processo for bem desenvolvido, ganham a indústria e o mercado interno, que
passará a ter acesso a produtos melhores e mais baratos.
Aliadas a
esses parâmetros, é urgente a consecução de uma reforma tributária que promova
a simplificação e eliminação da cumulatividade tributária, a unificação do ICMS
e a convalidação de benefícios estaduais.
Agricultura
Apesar de
sofrer com a péssima infraestrutura, o setor apresenta intensa modernização dos
segmentos tipicamente exportadores, não acompanhada por aqueles voltados para o
cultivo de alimentos básicos. Esse fato aprofunda o processo de concentração
fundiária e agrava as disparidades regionais e o desequilíbrio do mercado de
trabalho rural.
É
necessário privilegiar o processo de verticalização produtiva, promover
integração inter-setorial e elevar a produtividade e competitividade do pequeno
produtor. Deve ser priorizada a produção de alimentos, com incentivo ao
financiamento privado da produção e comercialização dos produtos agrícolas, com
incremento da atividade estatal de inspeção e fiscalização, especialmente
quanto ao uso sustentável dos recursos naturais e quanto à qualidade e sanidade
dos produtos.
Para o
grande produtor, há de se tratar com prioridade a questão da verticalização e
descomoditização. Do mesmo modo, é necessário criar política de redução de
preços dos insumos agrícolas, fertilizantes e defensivos, hoje de uso
restritivo por produtores de todos os portes.
Infraestrutura Econômica
A retomada
do desenvolvimento baseado em novo padrão de competitividade requer a oferta de
energia, transportes e telecomunicações em condições de custo, tecnologia e
qualidade compatíveis com a inserção bem sucedida do Brasil na economia global
e com o aumento do bem estar de seus cidadãos.
A
ampliação e a modernização da infraestrutura devem visar o aumento da
eficiência, o que demanda a abertura de mais espaços à atuação do capital
privado. Tal objetivo só se tornará alcançável com o saneamento financeiro das
empresas estatais, a diminuição das assimetrias fiscais e a redução do risco
regulatório, principalmente por intermédio de uma política de preços e tarifas
realista e estável.
Energia
A
intervenção do Estado, quando necessária para o aumento da eficiência na
produção e no uso da energia e para a realização do potencial das fontes
energéticas de que dispõe o País, não deve implicar crescimento do risco
regulatório ou distorção dos preços relativos dos energéticos, de forma a criar
e preservar o ambiente propício para atração do capital privado.
Os
impactos socioambientais deverão ser considerados na avaliação de quaisquer
projetos, estimulando o desenvolvimento de tecnologias que preservem o meio
ambiente, principalmente no que diz respeito à redução das emissões de gases do
efeito estufa, com ênfase nos programas de conservação e racionalização da
produção e do uso de energia.
Transporte
A infraestrutura
de transporte, tanto de passageiros quanto de carga, necessita de urgente
ampliação e modernização para superar os gargalos de logística, que afligem à
população e obstaculizam as atividades econômicas. Busca-se, assim, reduzir
custos, aumentar a capacidade e garantir a liberdade de circulação e de escolha
de modais pelos usuários. Isso deve ser feito em regime de livre competição e
de forma articulada com as políticas energética, industrial, agrícola,
tecnológica e de meio ambiente.
A ampliação
e a modernização da infraestrutura de transporte exige a desregulamentação dos
serviços, incentivando a economia de mercado e a multimodalidade, e o estímulo
à participação privada na exploração dos serviços.
Telecomunicações
Devem ser
reduzidas as barreiras de entrada para obter o aumento da concorrência entre as
empresas de telecomunicações, com a consequente melhoria da qualidade e redução
do preço dos serviços prestados à população, em especial, nas regiões
interioranas e na periferia dos grandes centros urbanos.
Deve ser
universalizado o acesso à Rede Mundial de Computadores (internet), em bases
fixa e móvel, com nível de velocidade de conexão semelhante ao dos países
centrais, de forma a possibilitar o desenvolvimento de novas ferramentas para a
realização de atividades empresariais, educacionais e de gestão pública, entre
outras.
Ciência e Tecnologia
O
desenvolvimento científico e tecnológico do País desempenha papel central no
seu padrão de desenvolvimento. Só o permanente aperfeiçoamento tecnológico do
sistema produtivo nacional poderá assegurar a competitividade dos produtos
brasileiros no contexto da evolução técnico-científica.
Há
necessidade de constituir capacidade de inovação no sistema produtivo, a qual
deve estar associada a um amplo e articulado esforço de difusão, com o duplo
objetivo de elevar o padrão tecnológico médio da estrutura produtiva, reduzindo
seus níveis de heterogeneidade inter e intra-setorial, e de constituir fonte
adicional de estímulo à continuidade do processo de inovação.
O projeto
de modernização e capacitação tecnológica guarda forte interdependência com o
sistema educacional, sobretudo no que tange às políticas de formação de
recursos humanos e de ensino técnico e de pós-graduação. Cabe ainda fortalecer
os vínculos do trabalho técnico-científico com as demandas dos seus potenciais
usuários, pois os processos de industrialização e de introdução de novas
tecnologias têm ocorrido de maneira dissociada das orientações e esforços
desenvolvidos pelas universidades e institutos de pesquisa.
É de se
destacar que a produção científica brasileira tem aumentado significativamente
nos últimos anos. Porém, não ocorre transferência desse conhecimento ao setor
produtivo. Por isso, o Brasil gera poucas patentes em comparação aos países com
produção científica semelhante.
Educação
O
planejamento e a administração da educação no Brasil devem se assentar no
princípio segundo o qual ela se constitui em direito de todos e dever do Estado
e da família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade.
A
apropriação de conhecimentos científicos e tecnológicos, ao lado de sua
finalidade produtiva, deve constituir-se em instrumento de modernização
cultural e social do país. Sob esse prisma, exige-se do setor educacional a
necessária qualificação dos recursos humanos, com a adoção do princípio da
meritocracia, para fazer frente aos desafios não só da modernidade produtiva,
mas principalmente no desenvolvimento do potencial humano, artístico,
esportivo, cultural e técnico de cada aluno.
O Papel do Governo na Educação
A educação
é uma das áreas onde a presença do Estado é fundamental e imprescindível. À
iniciativa privada cabe papel complementar importante, mas que nunca será
desempenhado a contento se não houver, por parte do setor público, uma oferta
educacional, de tempo integral no ensino fundamental e médio, adequada à
demanda da população, às necessidades do sistema econômico e ao desenvolvimento
dos potenciais individuais.
A
definição de esquemas de cooperação institucional entre as três esferas de
governo é fundamental para se buscar, conjunta e coordenadamente, alternativas
para melhorar o padrão de organização, eficiência e qualidade da educação.
Relações entre Capital e Trabalho
O mercado
de trabalho formal no Brasil tem sido regulado por um arcabouço legal e
institucional expresso na CLT, na organização sindical confederativa e na
Justiça do Trabalho, observando-se uma intervenção tutelar do Estado sobre as
relações entre capital e trabalho com consequências danosas tanto no plano
político como no econômico.
Como o
recurso à instauração do dissídio coletivo foi estimulado durante décadas, o
dirigente sindical acaba transferindo a decisão ao Estado, através da Justiça
do Trabalho, operando-se uma cadeia transmissora de majorações salariais e de
preços que não mantêm qualquer compromisso com a estabilidade macroeconômica.
Um novo
estatuto do trabalhador deve circunscrever-se a regular os direitos essenciais
do empregado, deixando-se para a negociação coletiva, respeitada a conjuntura
setorial, a determinação das demais condições de contratação, garantindo-se,
desse modo, maior flexibilidade nos diversos segmentos do mercado de trabalho.
Novos
mecanismos de negociação coletiva, que privilegiem a solução dos naturais
conflitos entre capital e trabalho mediante a negociação direta devem ser
estimulados. Nesse sentido, a Justiça do Trabalho deverá se encarregar dos
conflitos de direito, só sendo requisitada a intervir nos conflitos de
interesse, de natureza eminentemente econômica, quando as partes já tiverem
esgotado, sem solução satisfatória, todas as alternativas de negociação.
Daí a
importância também de estimular a criação, disseminação e uso dos instrumentos
de mediação, conciliação e arbitragem. Mas deixo claro: a lei estará sempre em
primeiro lugar.
Meio Ambiente
Promover o
desenvolvimento de tecnologias ambientalmente sadias, em especial aquelas
voltadas para a geração e uso eficiente de energia, a redução da emissão de
gases de efeito estufa e o melhor aproveitamento dos recursos naturais.
As
práticas agrícolas devem ser estimuladas a adotar métodos orgânicos de
agricultura regenerativa e o desenvolvimento da biotecnologia deverá ser
condicionado a uma orientação ecológica e social.
Além
disso, o Brasil precisa priorizar e cumprir os compromissos internacionais
assumidos em relação ao controle do desmatamento ilegal, bem como ao acordo da
COP 21 (Paris/2015) relativo à emissão de gases-estufa, pelo qual os países
devem trabalhar para que o aquecimento global fique abaixo de 2°C, buscando
limitá-lo a 1,5°C.
Importante
aspecto que entrelaça meio ambiente e serviços públicos diz respeito ao
saneamento básico, cuja maximização da cobertura e oferta à população deve ser
incessantemente buscada.
O Resgate da Dívida Social
O Combate
à Pobreza
Os
programas de distribuição de renda devem ser efetivados como política de
Estado, e intensificados os instrumentos de controle e avaliação para
aperfeiçoamento e adequação à conjuntura e combate às fraudes.
Política Social
Apesar dos
resultados quantitativos conseguidos nos períodos de crescimento econômico
acelerado, ainda se configura quadro de carências generalizadas, especialmente
quanto aos serviços básicos de natureza pública. Há que se rever os métodos de
gestão e avaliação das políticas sociais para evitar os problemas de
pulverização e desperdício de recursos e a incorreta identificação das
populações-alvo.
As
políticas sociais devem ser focadas na melhoria da condição social e econômica
da população, com ênfase no acesso aos serviços públicos, na educação e
qualificação profissional. Um dos objetivos é destituir tais políticas do
caráter eminentemente paternalista, de forma a recuperar a autonomia e
autoestima da população, com sua desvinculação da dependência do Estado.
Contudo, o
novo modelo econômico a ser adotado requer que as políticas sociais estejam intrinsecamente
coordenadas com as políticas de responsabilidade fiscal, nos três níveis da
Federação.
O Sistema de Seguridade Social
Na área de
saúde reafirma-se o princípio da universalidade, com a garantia de acesso
igualitário aos serviços de saúde a toda população. Da mesma forma, é direito
da população a assistência social. A melhoria na prestação dos serviços das
duas áreas passa necessariamente pelo desenvolvimento e articulação com outros
setores, como saneamento básico e educação.
Já o
sistema de Previdência Social precisa ser amplamente rediscutido para que possa
ser tornado socialmente justo e financeiramente equilibrado. Entre outros,
destacam-se os seguintes aspectos: alternativas de custeio capazes de assegurar
a estabilidade das receitas em momentos de crise na economia; adequação do
regime às características da distribuição de salários do País e ao perfil
demográfico da população.
Para
tanto, faz-se necessária uma reforma previdenciária estabelecendo novas regras
para a concessão de aposentadoria, com adoção de critérios objetivos, como a adoção
de idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição e a garantia da
equivalência entre contribuições pagas e benefício auferido.
A Questão Regional
Seja pela
escassez de recursos, seja pela sua deficiente dotação, ou por circunstâncias
históricas e políticas, o crescimento econômico não se processa homogeneamente
no espaço. Para minimizar os problemas socioeconômicos decorrentes, políticas
públicas devem objetivar a redução das desigualdades regionais e a melhoria da
qualidade de vida de uma ampla camada da sociedade que não tem acesso às
condições mínimas de sobrevivência.
O centro
dessa estratégia de desenvolvimento regional fundamenta-se na expansão
econômica com desenvolvimento social, através da integração de ações
resultantes de investimentos multissetoriais localizados, articulando-se
projetos produtivos à base econômica regional.
Além
disso, o pacto federativo precisa ser rediscutido com urgência, a começar pela
revisão das competências de cada ente e dos percentuais de distribuição dos
recursos provenientes da arrecadação tributária.
IV – CIDADANIA E DIREITOS FUNDAMENTAIS
Direitos
Humanos
O exercício
da cidadania não se limita à livre expressão de vontade política, pois
compreende a afirmação da dignidade humana em todas as dimensões. A vigência
dos direitos civis e políticos depende também da realização dos direitos
econômicos e sociais. A plena realização dos direitos humanos não pode ser
alcançada em meio à pobreza extrema. O horizonte a ser perseguido é o do
desenvolvimento com justiça social.
Violência e Criminalidade
As
questões relacionadas ao crescimento da violência urbana e rural existem em
decorrência de causas estruturais ligadas à urbanização acelerada, ao
desordenado processo de ocupação dos territórios agrícolas e, ainda, ao
crescimento do crime organizado a partir do tráfico de drogas e à ausência de
uma efetiva e adequada formação educacional.
No médio e
longo prazos, a redução da criminalidade e violência passa pelo desenvolvimento
socioeconômico, especialmente pela elevação do padrão educacional e do nível de
renda da população. O sucesso nas políticas dessas duas variáveis é que vai
incidir diretamente no desenvolvimento social da população mais afetada pela
violência e criminalidade.
No curto
prazo, a política governamental de segurança pública deve basear-se nas
seguintes diretrizes:
-
articulação das políticas e programas de todos os níveis de governo, em ações
conjuntas que sedimentem a integração intergovernamental no tratamento da
questão;
- mudanças
estruturais no aparato de segurança pública, de forma a introduzir métodos,
técnicas e bases filosóficas que internalizem conceitos gerenciais e éticos
adequados, visando à modernização de organização e qualificação de seus
recursos humanos;
-
integração, em nível nacional e estadual, de informações criminais,
penitenciárias e sobre violência em geral, com vistas à facilitação e agilização
das ações policiais;
-
modernização e maior agilidade na prestação jurisdicional nos crimes contra a
vida, a segurança, a liberdade e o patrimônio.
Crianças, Adolescentes e Idosos
A
constante atualização e adaptação do Estatuto da Criança e do Adolescente é
salutar e necessária, desde que não se descaracterize nem modifique suas
diretrizes e seus princípios básicos, comandados principalmente pela total
atenção do Estado ao processo de educação, assistência, recuperação e inserção
dos jovens às oportunidades de desenvolvimento pessoal.
O mesmo
tratamento e prioridade devem-se dar ao Estatuto do Idoso. A população
brasileira está envelhecendo rapidamente. Daí a necessidade de um esforço
nacional e multidisciplinar para tratar dessa questão, desde a seguridade até a
assistência social.
Populações Indígenas e Minorias
A defesa
dos direitos e a preservação dos costumes e tradições das comunidades indígenas
deve ser preocupação fundamental do Estado e da sociedade. A diversidade
cultural é uma das principais riquezas do País. Garantir a posse da terra e
promover a preservação e o desenvolvimento do patrimônio cultural indígena é
dever e responsabilidade do Estado.
A mesma
linha de atuação e de prioridade deve ser adotada para as Minorias, de todos os
segmentos sociais, com ampla participação de entidades e organizações de defesa
de cada uma das classes que as compõem, com foco no reconhecimento e na efetiva
concretização de seus direitos.
Cultura
Os
direitos culturais são indispensáveis ao pleno exercício da cidadania. Ela
implica a fruição completa dos direitos culturais no sentido do art. 215 da
Constituição, isto é, o direito à produção cultural, sem qualquer veto, censura
ou aprovação prévia, e o direito à apropriação produtiva do acervo cultural
existente.
Além
disso, o acesso à cultura é instrumento essencial e estratégico ao
desenvolvimento social da população e ao processo educacional do País.
Desporto
O
desporto, direito do cidadão, é essencial ao seu desenvolvimento físico,
psicológico e social, além de instrumento de promoção educacional e de elevação
da qualidade de vida e deve ser reconhecido como um serviço indispensável à
comunidade.
Há de se
considerar também o desporto como instrumento de combate às drogas e marginalização de crianças e adolescentes, na
medida em que desperta expectativas e bem-estar social longe de ambientes
nocivos.
Defesa da Concorrência e Defesa do
Consumidor
A defesa
da concorrência e a defesa do consumidor refletem uma dimensão importante do
Estado moderno, que é a preocupação em regular as atividades econômicas
privadas procurando compatibilizar, por um lado, o incentivo à concorrência, ao
desenvolvimento tecnológico, ao aumento da produtividade e da produção e, por
outro lado, o bem-estar do cidadão-consumidor e o funcionamento da economia em
bases saudáveis, refratárias a restrições e barreiras artificiais.
O acesso
da população a produtos de boa qualidade e a preços acessíveis, a oferta de
emprego compatível com as exigências do mercado de trabalho, a inserção da
economia brasileira em condições competitivas no mercado internacional, são
todas metas que dependem de um arcabouço legal e institucional moderno de
defesa econômica.
V – O BRASIL NO CENÁRIO INTERNACIONAL
Política
Externa
Não há
projeto nacional viável para o Brasil sem vinculação eficaz com o mundo. Esta
eficácia depende, sobretudo, da credibilidade do País, por meioda
previsibilidade e segurança jurídica, o que torna a diplomacia instrumento
indispensável para materializar as aspirações nacionais, quer no plano
econômico, quer no plano político.
No plano
econômico, trata-se de aproveitar as perspectivas presentes no cenário externo
para promover a inserção e a modernização da economia brasileira. No plano
político, trata-se de contribuir para a paz e projetar no relacionamento
externo os valores democráticos e de observância das normas de Direito que
regem nossa sociedade.
A vocação
para a universalidade constitui a característica básica da inserção do Brasil
no cenário internacional. Essa vocação repousa sobre a observação factual de
que o País tem interesses de cooperação externa, distribuídos por parceiros de
todos os continentes. Repousa ainda sobre a consciência de que, em um mundo marcado
pela interdependência e globalização das atividades produtivas, prescindir das
oportunidades oferecidas pela convivência internacional significa condenar o
Brasil à estagnação e à obsolescência.
No fim dos
anos 1990, o fim da Guerra Fria e da rígida configuração bipolar levaram a uma
flexibilização das fronteiras comerciais e a um impulso da globalização.
Aumentou consideravelmente a competição nos mercados internacionais, em que se
tornaram maiores as dificuldades de um país concorrer individualmente. Ao
assinar o Tratado de Assunção que criou o Mercosul, tínhamos em mente a
estratégia de desenvolver um espaço econômico mais amplo, mais forte e
competitivo.
As
transformações do sistema internacional são hoje também muito abrangentes. A
negociação de dois megablocos comerciais, a
Parceria Transpacífico entre os EUA e países asiáticos, e a Iniciativa
Transatlântica, entre os EUA e a Europa, abrangem a maior parte da economia
internacional. A China, de sua parte, tem aumentado seus laços na Ásia, consolidando
sua esfera de influência, além de fazer maciços investimentos na África e mesmo
na América Latina, em busca de garantir o fornecimento de matérias primas e o
acesso a mercados.
Esses
mega-acordos estão estabelecendo também regras em diversas áreas, como
propriedade intelectual, meio ambiente, relações trabalhistas e investimentos.
São normas de cuja elaboração não participamos nem influenciamos, mas às quais
fatalmente nos submeteremos. O Brasil escolheu dar prioridade às negociações da
Rodada Doha e não negociar acordos comerciais. Com a OMC caminhando para a
obsolescência, deixada de lado pelos amplos novos acordos, nosso País vê frustrada
essa opção de sua diplomacia. De outra parte, a análise que considerava que os
países emergentes seriam os grandes catalisadores da economia mundial
mostrou-se açodada.
Verifica-se
que, a exemplo do que se temia há 26 anos, o Brasil tem diminuída sua margem de
manobra no plano econômico internacional. Torna-se necessária uma reformulação
do Mercosul, aproveitando as atuais orientações econômicas e as iniciativas do
Governo argentino de voltar ao mercado financeiro internacional, do qual se
achava afastado desde o default de 2001. Ações com viés ideológico no âmbito do
Mercosul minaram sua credibilidade. O bloco, reformulado, precisa dar impulso a
negociações bilaterais e com os megaespaços comerciais. Assim, a diplomacia
brasileira deve retomar suas atividades de promoção comercial que foram
abandonadas nos últimos anos, substituídas por atuações de caráter ideológico.
O realismo e o bom senso indicam que esses são os únicos caminhos viáveis e que
há urgência em buscá-los.
Portanto,
as ações da política externa brasileira necessitam, antes de tudo, de menos
ideologia política e mais pragmatismo comercial. Como exigem hoje as grandes
correntes do comércio mundial, precisamos de uma política externa muito clara e
objetiva, priorizando os acordos multilaterais sem deixar de revisar os
destinos do Mercosul e sua inserção como parceiro dos grandes blocos
econômicos.
Somente
assim, o Brasil será capaz de retomar sua liderança do subcontinente e seu
protagonismo mundial.
Defesa Nacional
Em que
pese o impacto do desenvolvimento da ciência e da tecnologia sobre o
relacionamento humano e sobre a vida das nações, em futuro previsível, é
improvável que as mudanças decorrentes venham a criar estruturas políticas que
tornem prescindível a capacidade militar. Nesse cenário, as Forças Armadas
brasileiras devem orientar seu preparo de modo a enfatizar a profissionalização
e a prontidão operativa, o desempenho tecnológico e a mobilidade.
O preparo
assim delineado exige desenvolvimento de tecnologias adequadas e a evolução de
doutrinas e procedimentos herdados do passado histórico e das experiências
recentes. Deve ainda ter por propósitos, em estrita consonância com a
Constituição e as leis, a dissuasão de ameaças à integridade e soberania
nacionais, o apoio à lei e à ordem no território e nos espaços sob jurisdição
brasileira, em questões que transcendam a missão e a capacitação dos sistemas
policiais, e a contribuição à ordem internacional, em cooperação e sob mandado
internacional.
O amplo
espectro de missões e responsabilidades daí decorrentes exige que seja
intensificada a integração entre as Forças Singulares de modo a facilitar e
desenvolver a capacidade de operação conjunta, com especial foco na
inteligência militar, na padronização de processos e equipamentos e no
desenvolvimento dos instrumentos de guerra eletrônica.
Por outro
lado, a sociedade brasileira precisa ser conscientizada da importância dos
assuntos de defesa e que esta é um dever de todos. Nesse sentido, a sociedade
deve ser integrada nas ações de defesa dos interesses nacionais, mediante o
incentivo ao estudo do tema no meio civil, de forma a difundir o conhecimento e
contribuir para a preservação da coesão e unidade nacionais.
Brasília, abril de 2016.
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