Pedro Lula Mota
“Capitalismo estabilizado é uma
contradição em termos”
Joseph
Alois Schumpeter faz parte de um seleto panteão de economistas, é
comprovadamente responsável pela revisão de todo o pensamento econômico de sua
época e fruto até hoje de estudos e reflexões. Nascido no extinto Império
Austro-húngaro na segunda metade do séc. XX, coincidentemente no mesmo ano da
morte de Karl Marx e do nascimento de Jonh M. Keynes, é considerado um dos
economistas mais importantes da história, sobretudo por suas contribuições na
teoria do crescimento econômico, democracia, estratégias empresarias e história
econômica.
Schumpeter
foi um dos vários pensadores que nasceu embebido na avalanche causada por
Charles Darwin na apresentação da Teoria da Seleção Natural, que rapidamente
transcendeu as ciências biológicas, para ser aplicada na ótica das ciências
humanas. O economista sonhava contribuir para a criação da “Economia Exata”,
com rigor suficiente para se assemelhar à física, sendo previsível e passível
de controle – porém já no final de sua vida, pode chegar à conclusão de que a
dita “Economia Exata” é tão incongruente quanto uma “História Exata”.
Como
todo gênio, foi precoce em toda sua vida, depois de formar-se em Direito na
Universidade de Viena no ano 1904, passou um período em Londres, mas retornou
para lecionar na cadeira de Antropologia na região em que hoje é situada a
Ucrânia. E foi lá onde recebeu pela primeira vez seu apelido de enfant
terrible, pois costumava frequentar reuniões e aulas calçando botas de
montaria. Contudo, ao se casar com Glayds Seaves, mudaram-se para a cidade do
Cairo, onde se tornou conselheiro de finanças da rainha egípcia e tão logo
retornam em março de 1919 para a Áustria, assumiu o robusto posto de Ministro
das Finanças a convite do Partido Socialista Cristão (não, ele não era
socialista), no qual durou pífios 10 meses.
Em
seguida, assumiu a presidência do famoso banco Biedermannbank, em Viena, antiga
e conceituada instituição financeira de pequeno porte. O banco abriu falência
em 1924, não somente por conta das difíceis condições econômicas vividas, mas
também pela desonestidade de alguns de seus diretores, o que fez Schumpeter não
só perder toda sua fortuna pessoal, como ainda ficar totalmente endividado.
Finalmente, depois de muitas idas e vindas, em 1932 Schumpeter assume a cadeira
de Antropologia em Cambridge na Universidade de Harvard, ali permanecendo até
sua morte e produzindo uma quantidade assombrosa de conteúdo.
Costumava
afirmar que o ponto máximo da capacidade criativa do homem é até os 30 anos de
idade, e de fato, quando tinha apenas 25 anos, em 1908, publicou sua primeira
grande obra: “A Natureza e a Essência da Teoria da Economia Nacional” e quatro
anos mais tarde, sua célebre teoria do “Desenvolvimento Econômico” [1]. Ambas
estabeleceram sua importância como teórico da economia. Trabalhava
compulsivamente, aproximadamente 84 horas semanais e ainda insatisfeito, de
fato além de criador do conceito, também foi representante do chamado “agente
empreendedor”.
O capitalismo como um sistema
dinâmico
Era
boêmio e costumava dizer que iria “torna-se o maior economista, cavaleiro
e amante do mundo... mas que os negócios dos cavalos não iam tão bem”.
Contudo, teve o privilégio de vivenciar o capitalismo na sua forma mais madura
(diferentemente de Smith ou Marx), o que lhe permitiu inferir importantes
constatações e voltar-se a questões essenciais da compressão do que viria ser
exatamente o sistema capitalista e como/porque este vinha funcionando em certos
lugares e outros não.
Seu
principal ponto era de substituir a teoria estática da Economia, por sua teoria
dinâmica, com um quê de evolucionismo, que ia de encontro às ideias
de outro grande expoente da época, Alfred Marshall [2], cuja principal teoria
seria de que a natureza não dava saltos, reafirmando a necessidade de melhorias
continuas de procedimentos, o que valorizava o papel de administradores e
técnicos. Schumpeter, por outro lado, que valorizava saltos inovadores, inesperados e
não-lineares.
Schumpeter
considerava então, que o capitalismo deveria ser estudado sob a ótica da
produtividade e do crescimento, sendo a máxima expressão da inovação, luta
humana e pura/simples destruição – tudo isso ao mesmo tempo.
Uma
sociedade pode ser considerada capitalista quando funda seu processo
econômico ao sabor dos homens de negócio. Dito isso, as características do
sistema são elencadas:
A
propriedade privada dos meios de produção;
Produção
para o lucro privado, sendo a produção pela iniciativa particular em caráter
privado;
Ponto
importante e crucial: a criação do crédito.
Schumpeter
não acreditava que o crescimento podia ser explicado pela variação
populacional, da renda e ou riqueza, uma vez que tais fatores não resultavam
necessariamente em um fenômeno qualitativamente novo, considerados por ele como
mudanças de dados naturais, nada de novo sob o sol.
O
desenvolvimento, em sua visão, é um fenômeno distinto, inteiramente
novo ao usual fluxo circular, na tendência para o equilíbrio ou da nossa
rotina. É uma mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo,
rompimento do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de
equilíbrio previamente estabelecido, se tornando um “novo normal” na vida
industrial e comercial, não na esfera das necessidades dos consumidores de
produtos finais.
Sendo
assim, finalmente no capítulo II de sua teoria do desenvolvimento, ele nos
apresenta a sua figura central: o empresário inovador. Ele é o responsável
por novos produtos para o mercado, por meio de combinações mais eficientes dos
fatores de produção. Tipificando, as combinações inovadoras se configurariam
nos seguintes casos: i) Introdução de um novo bem; ii) Introdução de um novo
método de produção, baseado numa descoberta cientificamente inovadora; iii)
Abertura de um novo mercado; iv) Conquista de uma nova fonte
de matérias-primas e v) Estabelecimento de um novo modo de organização de
qualquer indústria (criação ou fragmentação de uma posição de monopólio, por
exemplo).
O empreendedor,
independentemente do porte da empresa em que atua, é o agente da inovação
e da destruição criativa, esta entendida como a força propulsora não só do
capitalismo como do progresso material. Quase todos os negócios, por mais
fortes que pareçam em dado momento, acabam falindo, e quase sempre porque
não foram capazes de inovar (algumas empresas que foram vanguarda, hoje estão
na lata de lixo da história).
Aqui a
teoria schumpeteriana se torna uma derivada dos ciclos de Kondratieff:
As ondas
de inovação são cada vez mais curtas
Fonte: Inovvaservice
Afirma
Schumpeter [3]: “Historicamente, o primeiro Kondratieff [4] coberto por
nossa análise, significa a revolução industrial, incluindo o prolongado
processo de absorção. Nós o datamos dos anos oitenta do século XVIII até 1842.
O segundo cobre o que chamamos de era da máquina a vapor e do aço. Vai de 1842
a 1897. E o terceiro, O Kondratieff da eletricidade, da química e dos motores,
nós o datamos de 1898 em diante. ”
Nesse
sentido, a destruição criadora está na essência da dinâmica do capitalismo,
quando novas tecnologias surgem como ondas, aleatoriamente e geralmente vem
acompanhada do aumento da produtividade do capital e do trabalho, pois os
empresários inovadores conseguem alocar produtos com vantagens competitivas em
relação a suas concorrentes tecnologicamente defasadas.
Sua
expressão “destruição criativa” adquiriu contornos quase lendários e é
frequentemente repetida em palestras, livros e reuniões empresarias,
tornando-se praticamente senso-comum e palavra de ordem em alguns ambientes.
Contudo, a grande chave de sua sobrevivência dos empreendedores é
o crédito barato e farto, via de regra tais personagens são financistas,
rigorosos com relação ao risco e atentos às novas oportunidades e de novos
negócios.
Assim
sendo, em seu capítulo final da teoria do desenvolvimento, o austríaco trata
dos grandes momentos de expansão e retração econômica – os ciclos econômicos
tão comuns no processo de desenvolvimento capitalista. Portanto, em períodos de
prosperidade, o empreendedor ao criar novos produtos é imitado por uma
verdadeira onda de empreendedores não-inovadores, que investem recursos para
emular os novos bens criados.
Consequentemente,
uma onda de investimentos de capital ativa a economia, gerando a prosperidade e
o aumento do nível de emprego.
À medida que as inovações tecnológicas ou as modificações nos produtos antigos são assimilados pela conjuntura e seu consumo generalizado, a taxa de crescimento da economia diminui (o que não gera mais ganhos extraordinários) e assim se inicia o processo recessivo da redução dos investimentos e a baixa da oferta de emprego. A constante mudança entre prosperidade e recessão, isto é, da volatilidade da produção é entendido como um obstáculo periódico e transitório, aparte do curso normal de expansão da renda nacional, da renda per capita e do consumo.
Anteriormente,
o caráter cíclico do capitalismo era explicado pelos economistas das mais
diversas formas, desde a atividade cósmica, do subconsumo da subpopulação e até
colheitas frustradas. Então, nesse sentido, a grande contribuição de Schumpeter
foi delimitar a relação existente entre o nível de investimento explicado pelo
movimento inovador, e que tão logo é transformado em produtos e posteriormente
em prosperidade, empregos, renda, além do estabelecimento de um novo paradigma.
Como já
afirmado, Schumpeter não mantinha simpatia pela ideologia socialista, mesmo
porque nesse sistema a figura do empreendedor não existia (o que também pode
ser uma pista para o fracasso do mesmo), porém o que não exclui uma certa visão
pessimista por parte do autor em relação ao capitalismo e sua
instabilidade. A “máquina capitalista’’, outro famoso termo, defende que o
processo capitalista eleva sistematicamente o padrão de vida das massas, contudo
não deve ser considerado um estado natural da vida humana. Se caso o fosse,
teria surgido muito antes na história e hoje estaria em todos os
lugares, então devemos compreende-lo como um sistema construído e mantido
com dificuldade hercúlea.
Encerro
afirmado que Schumpeter, de forma nobre, acreditava que o mundo só poderia
beneficiar da benesses do capitalismo, caso as pessoas
entendessem como ele de fato funciona, e não é à toa que dedicou toda sua
vida não só o compreendendo, mas principalmente explicando-o, assim como eu e
você estamos buscando neste exato momento.
Terraço Econômico