PEDRO NERY
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A Nova Zelândia é um caso raro de país em que não existe contribuição alguma
pela folha de salários. Sequer se pode falar em déficit da Previdência, porque
não há contribuições, e toda a despesa é paga pelos tributos gerais. Os
recursos são capitalizados, e um gigantesco fundo de pensão administra dezenas
de bilhões de dólares no mercado financeiro.
Desde a
década passada, novos trabalhadores podem fazer aportes adicionais, se quiserem
benefícios maiores. É o KiwiSaver, uma Previdência complementar de adesão
automática, também de capitalização.
A
legislação trabalhista é uma das mais flexíveis do mundo. No índice Lamrig,
aparece como a 2ª mais flexível entre 144 países – à frente até dos EUA. O
Brasil era um dos últimos, o 132º, no ranking anterior à reforma trabalhista
que Zé queria desfazer. Já no ranking do Instituto Frasier, a Nova Zelândia
aparece em 5º lugar, de 162 países – o Brasil pré-reforma era o 155º. O país é
exemplo tão extremo de flexibilidade dos contratos de trabalho que quase não
existem restrições legais a horas extras ou trabalho no fim de semana, e
inexiste aviso prévio.
Nem
sempre foi assim. A Nova Zelândia é um case de amplas reformas liberais, e um
exemplo superior ao do Chile por não experimentar a mazela da desigualdade. Bem
descritas por Marcos Mendes em Por Que É Difícil Fazer Reformas Econômicas no
Brasil? (Elsevier, 2019), essas reformas foram empreendidas entre os anos 80 e
90 – aquela época em que José de Abreu ainda gravava os programas de TV do
PSDB.
A Nova
Zelândia já ostenta o mesmo PIB per capita da Itália: em 1990, o italiano era
30% maior. Na comparação com a Venezuela, a trajetória é marcadamente
diferente. A Venezuela tinha 60% do PIB per capita neozelandês em 1990,
proporção que caiu para 25% em 2018, à medida que o país de Guaidó faliu e o de
Zé de Abreu prosperou.
A Nova
Zelândia lidera o ranking Doing Business do Banco Mundial, de facilidade de
fazer negócios (o Brasil é 124º). Adota há tempos modelos como o de vouchers,
em que o governo paga creches particulares escolhidas pelos pais – proposta mal
recebida no Brasil quando Paulo Guedes a propôs no último encontro de Davos.
E o que
mais a Nova Zelândia pode ensinar? O país segue na vanguarda na formulação de
políticas públicas. É um dos países que paga o benefício universal infantil a
todas as famílias com crianças. O Senado brasileiro aprovou a criação desse
benefício no âmbito da reforma da Previdência.
Como
apontara a OCDE, a reforma da Previdência não apenas era o mais urgente
elemento do ajuste fiscal, como também uma oportunidade para tornar o
crescimento mais inclusivo com mais gastos nas crianças (a parcela mais pobre
da população). Na Nova Zelândia, a ênfase nesse público é tal que a
primeira-ministra Jacinda Ardern criou um cargo adicional para si, de ministra
para redução da pobreza infantil.
O país
também acaba de criar o “orçamento de bem-estar”, focado no bem-estar
intergeracional, diante do diagnóstico de que o orçamento tradicional tem
prioridades “curtoprazistas”. No orçamento alternativo, destacam-se gastos em
sustentabilidade ambiental, transição tecnológica e investimento na primeira
infância. Por aqui, o que há de próximo é o projeto do deputado Luiz Lima,
instituindo o orçamento da primeira infância. Quando faremos a viagem para a
Nova Zelândia?”
PEDRO NERY - DOUTOR EM ECONOMIA
Estadão
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