Vittorio Medioli
O corrupto é uma
praga social, não olha nos olhos de suas vítimas!
“Corrupção mata, mata na fila do SUS, mata na falta de
leitos, mata na falta de medicamentos, nas estradas que não têm manutenção
adequada, destrói vidas que não são educadas por falta de escolas, de
equipamentos, de cuidados. O fato de o corrupto não olhar nos olhos a vítima
que ele produz, a crença de que a corrupção não é um crime grave e violento, e
que os corruptos não são perigosos, geram um quadro sombrio em que recessão,
corrupção e criminalidade elevadíssima nos atrasam na história, num país que não
consegue progredir”, assim se pronunciou o ministro Luís Roberto Barroso no
plenário do STF.
O corrupto é uma praga social, não olha nos olhos de suas
vítimas! Nem vai ao velório para assistir à dor. Não toma conhecimento de quem
sofre privações que ele provocou apropriando-se de recursos de todos. Rouba nos
medicamentos, nos serviços, nas obras, nos fornecimentos, nos alimentos, deixa
que inocentes não recebam o imprescindível. Barroso está certo! Mata.
Alguns que se destacam no vértice da corrupção, depois de
terem faturado obras, provocam ainda diferenças fraudulentas com a cumplicidade
de agentes públicos. É o caso da Andrade Gutierrez, uma das líderes em
corrupção nacional. Provocou diferenças em dezenas de Estados e municípios,
como Betim. Uma indústria bilionária e mais rentável que as próprias obras
executadas. Em Betim, um estrago de R$ 450 milhões, que se transformou no maior
precatório do Brasil. Inconcebível dívida, dilatada e surreal. Agride o bom
senso, a moderação. Ceifará diretamente vidas de inocentes.
E com que meio parar uma imensa fraude que teve
orquestração de dezenas de mancomunados? Empreiteiros, advogados, agentes
públicos, indecentemente acertados? Para alguns, trata-se apenas de ganhar
dinheiro com esperteza, entretanto o STF garantiu a imprescritibilidade dos
danos ao erário. Betim está exatamente de frente com a maior
imprescritibilidade, transitada em julgado, no Brasil.
Precisaria aguardar que os quatro processos que contestam
a dívida alegada, com sobra de provas e auditoria do próprio TCU, comprovassem
sua improcedência. Encontraram uma diferença de valores de R$ 600 milhões
corrigidos, que a empreiteira mais carimbada por corrupção no país terá que
devolver ao município. Isso decorrente de transferências indevidas realizadas
em janeiro de 1985. Tudo é absurdo, valores estratosféricos e inflados, 50
vezes maiores do que o que se gastaria para realizar a obra agora.
O inconcebível é que a diferença reclamada foi paga entre
novembro de 1984 e 8.1.1985, confirmado-se em auditoria interna e outra
independente. O próprio prefeito que reconheceu a dívida em 1991, depois de
prescrita, deixou escapar, em audiência pública, que seu antecessor liquidou a
diferença em 1985. Mais claro impossível. Fraude assumida.
Esse caso de Betim comprova a exatidão do falecido Murilo
Mendes, em certos anos considerado o maior do Brasil, ao definir: “Empreiteiro
é aquele que, para ganhar dinheiro, faz qualquer coisa. Até obras”. Nesse caso
a Andrade Gutierrez fez apenas “qualquer coisa”, depois de receber as obras.
A crença de que corrupção é apenas ganhar dinheiro para
ter uma boa vida, luxo, Land Rover e apartamento no exterior é falsa. Para se
chegar a isso, é preciso fechar os olhos, desligar a consciência e a compaixão
que existem até em lobos.
No Brasil chegou a hora de tratar a corrupção no setor
público como ela merece, como crime hediondo, pois o corrupto gera mortes a
esmo e até genocídio.
Não há como se separar, como disse Barroso, as mortes na
fila do SUS da ação de corruptos.
A pirataria bilionária da corrupção é comandada pelos
mais altos escalões políticos, conta com dublês de empreiteiros e empresários
sem escrúpulos. Precisam criar seus filhos em Paris e Nova York, no luxo e no
deslumbre, para que não fiquem em contato com a miserabilidade que provocam.
Corruptos provocam aumentos de impostos, subtraem a todos
alguma fração de salário. Se para os abastados isso não gera constrangimento,
para o miserável representa um leite, um pão, uma sopa que deixa de dar a um
filho.
Não merece leniência quem arromba a nação, quem castiga
os pobres. Os R$ 452 milhões em benefício de uma quadrilha contumaz na
corrupção instalam a impossibilidade de realizar 370 mil cirurgias – zerar a
fila inteira de pacientes que estão à espera em Minas Gerais.
O corrupto é pior do que aquele que usa metralhadora. Seu
alcance mortífero vai silenciosamente muito além de um tiro de arma de fogo, é
uma chuva de balas lançadas contra um povo inteiro e que mata os mais fracos.
A pena aplicada deveria ser descontada na impenetrabilidade
da selva – lançados de paraquedas com um kit de sobrevivência para resistir sem
o risco de prejudicar a humanidade e matar de verdade. Barroso está mais do que
certo.
Jornal O Tempo
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