Alexandre Szn
Temos muito para
agradecer a Bolsonaro.
Bastaram 5 meses de um governo atípico, “sem jeito” com o
congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e
talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores. Sejam
eles de esquerda ou de direita.
Desde a tal compra de votos para a reeleição, os
conchavos para a privatização, o mensalão, o petrolão e o tal “presidencialismo
de coalizão”, o Brasil é governado exclusivamente para atender aos interesses
de corporações com acesso privilegiado ao orçamento público.
Não só políticos, mas servidores-sindicalistas,
sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de
poder. Os verdadeiros donos do orçamento. As lagostas do STF e os espumantes
com quatro prêmios internacionais são só a face gourmet do nosso absolutismo
orçamentário.
Todos nós sabíamos disso, mas queríamos acreditar que era
só um efeito de determinado governo corrupto ou cooptado. Na próxima eleição,
tudo poderia mudar. Infelizmente não era isso, não era pontual. Bolsonaro
provou que o Brasil, fora desses conchavos, é ingovernável.
Descobrimos que não existe nenhum compromisso de campanha
que pode ser cumprido sem que as corporações deem suas bênçãos. Sempre a
contragosto.
Nem uma simples redução do número de ministérios pode ser
feita. Corremos o risco de uma MP caducar e o Brasil ser OBRIGADO a ter 29
ministérios e voltar para a estrutura do Temer.
Isso é do interesse de quem? Qual é o propósito de o
congresso ter que aprovar a estrutura do executivo, que é exclusivamente do
interesse operacional deste último, além de ser promessa de campanha?
Querem, na verdade, é manter nichos de controle sobre o
orçamento para indicar os ministros que vão permitir sangrar estes recursos
para objetivos não republicanos. Historinha com mais de 500 anos por aqui.
Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o
momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no congresso e na
justiça, apostaria que o presidente não serve para NADA, exceto para organizar
o governo no interesse das corporações. Fora isso, não governa.
Se não negocia com o congresso, é amador e não sabe fazer
política. Se negocia, sucumbiu à velha política. O que resta, se 100% dos
caminhos estão errados na visão dos “ana(lfabe)listas políticos”?
A continuar tudo como está, as corporações vão comandar o
governo Bolsonaro na marra e aprovar o mínimo para que o Brasil não quebre,
apenas para continuarem mantendo seus privilégios.
O moribundo-Brasil será mantido vivo por aparelhos para
que os privilegiados continuem mamando. É fato inegável. Está assim há 519
anos, morto, mas procriando. Foi assim, provavelmente continuará assim.
Antes de Bolsonaro vivíamos em um cativeiro, sequestrados
pelas corporações, mas tínhamos a falsa impressão de que nossos representantes
eleitos tinham efetivo poder de apresentar suas agendas.
Era falso, FHC foi reeleito prometendo segurar o dólar e
soltou-o 2 meses depois, Lula foi eleito criticando a política de FHC e nomeou
um presidente do Bank Boston, fez reforma da previdência e aumentou os juros,
Dilma foi eleita criticando o neoliberalismo e indicou Joaquim Levy. Tudo para
manter o cadáver procriando por múltiplos de 4 anos.
Agora, como a agenda de Bolsonaro não é do interesse de
praticamente NENHUMA corporação (pelo jeito nem dos militares), o sequestro
fica mais evidente e o cárcere começa a se mostrar sufocante.
Na hipótese mais provável, o governo será desidratado até
morrer de inanição, com vitória para as corporações. Que sempre venceram.
Daremos adeus Moro, Mansueto e Guedes. Estão atrapalhando as corporações, não
terão lugar por muito tempo.
Na pior hipótese ficamos ingovernáveis e os agentes
econômicos, internos e externos, desistem do Brasil. Teremos um orçamento
destruído, aumentando o desemprego, a inflação e com calotes generalizados.
Perfeitamente plausível. Claramente possível.
A hipótese nuclear é uma ruptura institucional
irreversível, com desfecho imprevisível. É o Brasil sendo zerado, sem direito
para ninguém e sem dinheiro para nada. Não se sabe como será reconstruído. Não
é impossível, basta olhar para a Argentina e para a Venezuela. A economia
destes países não é funcional. Podemos chegar lá, está longe de ser impossível.
Agradeçamos a Bolsonaro, pois em menos de 5 meses provou
de forma inequívoca que o Brasil só é governável se atender o interesse das
corporações. Nunca será governável para atender ao interesse dos eleitores.
Quaisquer eleitores. Tenho certeza que esquerdistas não votaram em Dilma para
Joaquim Levy ser indicado ministro. Foi o que aconteceu, pois precisavam manter
o cadáver Brasil procriando. Sem controle do orçamento, as corporações morrem.
O Brasil está disfuncional. Como nunca antes. Bolsonaro
não é culpado pela disfuncionalidade, pois não destruiu nada, aliás, até agora
não fez nada de fato, não aprovou nada, só tentou e fracassou. Ele é só um
óculos com grau certo, para vermos que o rei sempre esteve nu, e é horroroso.
Infelizmente o diagnóstico racional é claro: “Sell” (Vender).
Texto obtido pelo Estadão - O Antagonista
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