Saulo Calderon
14 de dezembro de 1979, sexta-feira. Terceiro sono
às 11 horas e 4 minutos da noite.
Temperatura ambiente, 26 graus. Umidade, 50%. Deitei-me do lado esquerdo, sem
nenhuma coberta por cima. O ar condicionado indireto funcionava no escritório.
Minhas reminiscências começam quando me vi sozinho, infinitamente livre em pleno espaço. O meu processo interpretativo de raciocínio e inteligência mostrava-se agudo com enorme potencial autocrítico. Não percebia nenhuma incongruência, incoerência ou anacronismo nas circunstâncias.
Minhas reminiscências começam quando me vi sozinho, infinitamente livre em pleno espaço. O meu processo interpretativo de raciocínio e inteligência mostrava-se agudo com enorme potencial autocrítico. Não percebia nenhuma incongruência, incoerência ou anacronismo nas circunstâncias.
Conhecia e sabia indiscutivelmente que estava projetado. Como chegara até ali?
Que acontecera? Não sei dizer.
Olhei para o alto e vi a Lua, mais nítida e maior à frente, e deu me a vontade de voar em sua direção. Comecei a cruzar o espaço rumo àquele astro com incrível velocidade.
Olhei para o alto e vi a Lua, mais nítida e maior à frente, e deu me a vontade de voar em sua direção. Comecei a cruzar o espaço rumo àquele astro com incrível velocidade.
Sentia que a Terra ficava pequenina atrás de mim. Via algumas estrelas. Olhei
para trás e me senti tão só e insulado no espaço imenso que resolvi voltar imediatamente, desistindo do trajeto pré-selecionado, a idéia-alvo de atingir a
Lua. Tinha a certeza de que, se quisesse, estaria lá em pouco tempo.
Retornando em grande velocidade, fui rompendo algumas nuvens, igual a um avião
que descesse procurando um campo de pouso improvisado. Sai em cima do topo de
vários prédios e edifícios. Um deles, mais baixo, tinha ameias. Desci mais e vi que era a torre mais alta de um
castelo. Estava deserto lá em cima, a noite apresentava-se profunda e tranquila.
Sobressaiam luzes esparsas de cidade. Não estava no Brasil. Dali passei em cima
dos telhados de vários prédios e depois desci até uma das ruas. O lugar
desusado para mim era agradável, parecendo presépio bem construído e limpo.
Havia calma na via pública em plena noite alta. Poucos carros circulavam pelo
calçamento, em certos trechos empedrados. Em uma ou outra casa térrea havia
luz. Perto de praça triangular se ajuntavam seis táxis estacionados. Não eram
veículos brasileiros, parecendo modelos antigos, diferentes. Próximo aos carros, uma casa noturna mantinha o luminoso aceso. Não
o li. Ao deslizar pela rua, o espírito de uma senhora, junto com outra entidade
de aparência feminina, fez reparo à minha fisionomia extrafísica. Não saberia
dizer que idioma falavam naquele lugar. Entendi os pensamentos das desencarnadas.
Examinei eu mesmo e vi que estava inteiro, bem conformado, trajando a blusa do
pijama azul claro com três bolsos. Não achei nada de especial. Talvez tenha
sido o uso da gola cavada ou algum reflexo visível do cordão de prata. O que
aconteceu depois, não me recordo. Sei que recebi sugestão de alguma origem
imprecisa para voltar ao físico. O meu controle mental sofria forte abalo.
Suponho que volitei rapidamente até o apartamento, porém não tenho lembranças
disso.
Minha memória recomeça quando me despertei. Estava do lado esquerdo, sentia-me
enregelado e com o nariz obstruído, numa condição de meia-sufocação. Mudei de
posição, fui até o banheiro e voltei ao leito. Consultei o relógio, 11 minutos
depois da meia-noite, e o termômetro, 26 graus, tudo isso seguindo os meus
hábitos rotineiros das projeções. Deitei-me do lado direito para dormir de
novo, envolvendo-me numa coberta branca. Ao encostar a cabeça no travesseiro,
as reminiscências vieram-me fragmentariamente. Sem dúvida, a condição fria do
físico impôs o retorno, prejudicando-me o despertar e a rememoração. Isso é
raro acontecer comigo. A projeção no espaço, a longa distância, contribuiu para
enregelar o corpo de carne e ossos? Acho que não. A temperatura máxima desta
sexta-feira foi a maior da primavera, 39,5 graus centígrados. Este foi um caso
típico de rememoração retardada, o que constitui exceção dentro dos processos
mnemônicos comuns.
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