Luiz Fernando
Ribeiro de Carvalho
A
nação brasileira indaga até quando os algozes abusarão de sua paciência. Agora,
já não apenas da inércia fruto da omissão, mas do esmagamento da liberdade de
ir e vir e até da própria vida.
Até onde irá o insuportável jogo de
empurra?
Não
será suficiente, em sociedade pretensamente civilizada, bradar basta! Não
conviver de forma passiva com os tiros — de balas perdidas, mas achadas no
corpo das vítimas — ou facadas desferidas pelos farristas da violência letal.
Essas
reflexões me vieram a partir de mensagem da juíza criminal Yedda Christina
Assunção, que, indignada com o estado de coisas, afirma:
“Chega de benefícios para sustentar que
saiam tantos quanto entram.
Chega de legitimar a bandidagem.
Chega de demagogia.
Há
pessoas más no mundo, há pessoas boas. A nossa função é garantir que as
primeiras não agridam as segundas. Garantindo a paz.
Estamos falhando. Reiteradamente.
A insegurança pública é nossa culpa.
Admitamos.”
O
repto da juíza não ecoa no deserto, bastando como exemplo a manchete de
anteontem do GLOBO e a capa da revista “Época” de 25 de maio. A questão não se
resume ao deslocamento do foco da violência para a redução da maioridade penal,
tema candente dentre aqueles a merecer decisões.
Por
isso, o Tribunal de Justiça está organizando um grande debate, com a
participação de todos os interessados, autoridades e sociedade civil, o
respeitável público cuja voz se impõe ouvir, para fazer cessar o festival de
horrores.
É
imperiosa a reação dos segmentos sociais amplamente majoritários e do Estado,
antes que se faça fila para os velórios de todos os dias.
O tratamento de direitos humanos — exceto
por demagogia — não serve apenas para proteger bandidos. É ocioso o mote: “A
polícia prende, a Justiça solta” usado sem informação dos fatos ou da prosaica
circunstância de, muitas vezes, a prisão ser ilegal e a soltura, imposição da
lei.
Não
pode ser esquecido o tema da corrupção, invisível por sua face vampiresca, que
nos atinge desde 1500.
Os novos Códigos Penal e de Processo Penal
só adiantarão com uma enérgica tomada de posição contra os esbirros da
corrupção, escancarada em rumorosos processos.
Não
se desconhecem os esforços das autoridades, mas a Justiça atua nos limites da
legalidade, não sendo razoável tomar a parte pelo todo mesmo quando alguns
exemplos isolados (passeio com Porsche apreendido). Mas, insista-se, essa
conduta vergonhosa é rara.
Corrupção
e violência são faces siamesas da barbárie que se banalizou. Impõe-se a coesão
social, motivo por que a corrupção e a violência não podem continuar sob o
privilégio da impunidade. É imperiosa a reação dos segmentos sociais amplamente
majoritários e do Estado, antes que se faça fila para os velórios de todos os
dias e continue a se meter descaradamente a mão no bolso dos indefesos, em especial
os aposentados e desempregados.
O
desemprego crescente e a decrepitude dos serviços essenciais exigem uma
resposta vigorosa. Pode-se começar pelo combate à condição de reféns da
corrupção e das outras formas de violência.
Luiz Fernando
Ribeiro de Carvalho é Presidente do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro. (71)
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