por Helio Duque
Há cinco séculos, em 1549, eram
implantadas as bases do futuro Estado brasileiro com a criação do Governo-Geral
pela coroa portuguesa. O governador-geral Tomé de Souza, nomeado pelo rei de
Portugal, desembarcava em Salvador, instalando a primeira capital do Brasil.
Nascia nas terras brasileiras, concomitantemente com a implantação da estrutura
de poder administrativo, o germe da corrupção.
Os dois principais colaboradores
do nascente poder colonial, eram fidalgos portugueses com prestígio na corte de
Lisboa. O primeiro, Antonio Cardoso de Barros, com titularidade de
“Provedor-mor”, responsável pela arrecadação de impostos. O segundo, Pero Borges,
“Ouvidor-mor” administraria a justiça diferenciada. Os “fidalgos” (filhos de
algo) recebiam punições suaves em relação aos “peões” (homens a pé),
integrantes das camadas populares. Era, de fato, Ministro da Justiça.
Pero Borges, não vinha por vontade
própria implantar alguns fundamentos legais das “Ordenações Manuelinas”,
estatuto constitucional do reino. Havia sido condenado pela justiça portuguesa
por ato de corrupção. Motivo: Administrador da obra, desviara parte do dinheiro
destinado à construção do aqueduto de Mafra, cidade muito próxima a Lisboa. Ao
invés da prisão, as relações familiares de prestígio na Casa Real, negociaram
sua vinda ao Brasil. O primeiro administrador da justiça brasileira.
Antonio Cardoso de Barros seria o
administrador das finanças públicas e gestor da economia. Sua missão: alocar
recursos para a construção da cidade de Salvador e áreas do recôncavo baiano.
Era de fato, o Ministro da Fazenda, tributando com rigor os poucos engenhos de
açúcar existentes. Partes dos recursos eram incorporados ao seu patrimônio
pessoal. Ficou milionário, tornando-se proprietário de engenhos açucareiros,
acumulando poder e fortuna. Era o tiro de largada na “roubalheira” do
patrimônio público.
Cinco séculos depois, 2014, o
professor e cientista político Bolívar Lamounier, no livro “A cultura da
transgressão no Brasil”, afirma: “O Brasil é essencialmente corrupto e
precisamos encarar isso. É falso que a elite é ruim, mas o povo é
essencialmente bom. Essa impressão é
profundamente artificial.” O paralelismo de cinco séculos, reforça, no
presente, o terrível diagnóstico do ilustre professor. O Brasil colonial,
imperial e republicano é herdeiro de uma cultura patrimonialista, onde o
Estado, detentor de grandes riquezas, é vítima de assaltos recorrentes.
O professor José Murilo de Carvalho,
da Universidade Federal do Rio de Janeiro, traduziu essa realidade: “Há uma
cultura generalizada de transgressão que afeta todas as classes sociais, de
alto a baixo. Furtam o político, o empresário, alguns magistrados, de um lado;
furtam, do outro, o profissional liberal, o policial, o trabalhador informal.
Tal cultura tem a ver com valores e instituições. O valor republicano de
respeito à lei e à coisa pública não existe.”
As recentes eleições no Brasil
comprovaram que corrupção, roubalheira institucionalizada é aceitável para
grandes parcelas da sociedade. Uma empresa símbolo dos melhores valores da
competência nacional é assaltada por quadrilha enquistada no poder e o roubo de
bilhões de reais é considerado fato normal. Não fosse a ação do Ministério
Público Federal e da Polícia Federal, a Petrobrás continuaria sendo
esquartejada pela corrupção garantida na omissão suspeita do próprio governo.
Os fatos, até agora revelados,
envolvendo agentes públicos no executivo e no legislativo, não representam nem
10% do que será oficializado. Nos próximos meses o Brasil viverá crise
institucional de gravidade inédita. A cassação de mandatos será consequência
das delações feitas pelo ex-diretor da estatal e pelo doleiro lavador das
fortunas desviadas da roubalheira da Petrobrás. Foram mais de dez anos
(governos Lula/Dilma) de assalto para favorecer “larápios políticos” investidos
de funções públicas. Daí ser fácil entender porque nas recentes CPIs sobre a
Petrobrás, a maioria governista sempre foi contra as investigações sérias,
transformando-as em “CPIs de Farsantes.”
Empresas e empresários da elite
nacional aliaram-se em autêntico contubérnio do capitalismo corporativista de
compadrio com agentes públicos do executivo e do legislativo. Deu no que deu:
quando grandes empresas passam a ter ligações umbelicais com a administração
pública, corrompendo homens públicos, o objetivo é levar vantagens ilícitas,
aumentado os seus lucros e acumulando poder financeiro.
Além dos corruptos e ladrões de
colarinho branco, é fundamental que os corruptores (grandes empresas), através
os seus dirigentes envolvidos, não saiam, como sempre, livres, leves e soltos.
Combater corruptos e corruptores precisa ser uma cruzada dos brasileiros
decentes. Só assim deixaremos para filhos e netos um Brasil que eles possam se
orgulhar.
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
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