por Carlos Newton
Sob o título de “Negócios inexplicáveis” e o subtítulo “Como a pequena Marítima ganhou quase todas as concorrências da gigante Petrobras”,
uma reportagem de 1999, na revista Veja, já mostrava como funcionava a
corrupção na Petrobras, que fez a fortuna de Shigeaki Ueki,
ex-presidente da estatal e ex-ministro de Minas e Energia, que era
conhecido como o “Japonezinho do Geisel”.
Leiam abaixo esta reveladora reportagem de Consuelo Dieguez,
oportunamente enviada à Tribuna da Internet pelo sempre presente
comentarista Guilherme Almeida.
NEGÓCIOS INEXPLICÁVEIS
Até o final de 1994, o empresário German Efromovich era dono de uma
empresa de pequeno porte que prestava serviços de manutenção submarina
na área de petróleo, a Marítima. Seu trabalho era colocar mergulhadores
no fundo do mar para verificar se os equipamentos das companhias para as
quais prestava serviço estavam em ordem. Nessa época, a empresa
funcionava numa casa ao pé de uma favela num subúrbio do Rio de Janeiro.
Até aí, tudo normal. O que causou estranheza mesmo foi o fato de, menos
de um ano depois, a insignificante Marítima, cujo patrimônio não
chegava a 1 milhão de dólares, começar a ganhar quase todas as
concorrências da Petrobras para a construção de plataformas de
perfuração e exploração de petróleo. Uma área em que Efromovich não
possuía a mínima experiência e que envolvia contratos superiores a 2
bilhões de dólares.
Essa façanha empresarial seria digna de figurar no livro de recordes.
Mas a Marítima não conseguiu fazer mais nada direito a partir daí.
Começou a descumprir todos os contratos, sempre contando com a vista
grossa de quem deveria ser rigoroso com ela, a Petrobras. Entre os
contratos estava o da superplataforma P-36, a maior do mundo, que chegou
ao país há alguns dias, com um atraso de quatro meses. Pior: a P-36 só
ficou pronta depois de a Petrobras ter sido obrigada a desembolsar 45
milhões de dólares, porque a Marítima não cumpriu sua parte no contrato.
Se não fizesse isso, a plataforma só entraria em operação no final do
ano que vem – e cada dia de atraso custa muito dinheiro, já que se
inviabilizam todas as metas de produção de petróleo.
VELHOS AMIGOS
As proezas de Efromovich começaram a ser notadas no final de 1995,
alguns meses após o superintendente de Engenharia da Petrobras, Antônio
Carlos Agostini, ser promovido a diretor da área de exploração e
produção da companhia. Agostini era conhecido de longa data de
Efromovich. Nessa época, a Petrobras decidiu abrir concorrência para a
construção de duas plataformas de produção de petróleo. O edital de
licitação trazia, no entanto, uma cláusula que todos os participantes
diziam ser impossível de cumprir: prazo de dezoito meses para a
plataforma entrar em operação.
Mas a Petrobras, então presidida por Joel Rennó, manteve-se
irredutível alegando que havia empresas que se diziam capazes de cumprir
o prazo. Essas “empresas” a que a Petrobras se referia era apenas uma –
a Marítima. Para surpresa do mercado, foi ela a vencedora da
concorrência de um contrato de 720 milhões de dólares. O que aconteceu a
partir daí foi uma sucessão de absurdos. A Marítima não tinha projeto
nem estaleiro contratado para a execução da obra e tampouco
financiamento. Mas a Petrobras pareceu não se importar muito. Em 1997, a
estatal fez nova concorrência e declarou vencedora a inadimplente
Marítima.
SEMPRE BLEFANDO
A tendência de Efromovich, de 49 anos, para o blefe sempre pautou sua
vida profissional. Quando sua empresa ainda estava começando, ele
costumava impressionar os potenciais clientes marcando reuniões no Hotel
Sheraton, um cinco-estrelas carioca. Na verdade, por causa do dinheiro
curto, ele se hospedava em hotéis baratos na zona de boemia do Rio.
Pegava o ônibus duas horas antes do encontro, atravessava toda a Zona
Sul da cidade para chegar ao hotel e dar a impressão de que estava
hospedado ali. Seu pulo-do-gato, porém, foi com a Petrobras.
A companhia pediu que ele fizesse a manutenção de uma plataforma em
1988 e perguntou a Efromovich se o barco que ele possuía tinha condições
de fazer o serviço. Efromovich não pestanejou. Disse que sim. Era
mentira. Fez, no entanto, das tripas coração para adaptar seu barco ao
serviço, comprometendo-se a trabalhar três anos de graça para um
estaleiro que concordou em fazer a adaptação. Agora, pode estar chegando
ao fim a era de Efromovich na estatal. A Petrobras se prepara para
cancelar o restante dos contratos que estourarem o prazo combinado. “A
Petrobras está sendo injusta”, afirma o empresário, um boliviano de
forte sotaque, naturalizado brasileiro.
Carlos Newton
Editor da Tribuna da Internet.
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