Por Carlos I. S. Azambuja
O destino dado à Assembléia Constituinte demonstra a rápida erosão de quaisquer sentimentos democráticos remanescentes entre os adeptos de Lenin
Quando da Revolução de Outubro, na Rússia, os bolcheviques proclamaram seu regime como um Governo Provisório dos Trabalhadores e Camponeses até a instalação da Assembléia Constituinte. Esse era o postulado pelo qual muitos revolucionários haviam lutado e terminado no cadafalso ou no exílio. A Declaração de Princípios do Partido Operário Social Democrata Revolucionário (POSDR) reclamava uma Constituinte, liberdade de imprensa, de manifestação, de pensamento e um Parlamento eleito através de eleições livres e diretas.
Essa Assembléia Constituinte seria livre, democrática e soberana, escolhida por todo o povo, muito diferente das Dumas do tempo dos Czares. Representantes do povo, democraticamente eleitos, iriam reunir-se e decidir sobre os destinos da Rússia. Essa havia sido a principal palavra-de-ordem dos bolcheviques.
Durante os primeiros dias de poder foram realizadas as eleições para esse órgão. Devido à vastidão do país e ao generalizado clima de desordem, tais eleições levaram mais tempo que o normal. Finalmente, a opinião das massas fez-se ouvir: mais de 40 milhões de votos foram apurados, sendo que apenas cerca de 10 milhões – a quarta parte dos votantes – para os bolcheviques que, assim, ficaram em minoria.
Somente um idiota poderia imaginar que Lênin passaria o poder para a tal Assembléia Constituinte ou lhe pediria um voto de confiança para o Conselho de Comissários do Povo, do qual era presidente.
Mas, o que fazer então, da Assembléia Constituinte?
Em novembro de 1917, o Comitê Central do Partido Bolchevique reuniu-se para examinar a incômoda situação. Ficou decidido adiar a instalação da Assembléia Constituinte e, enquanto isso, esclarecer as massas sobre os perigosos elementos para ela eleitos. Foi alegado que o Partido dos Kadets – um dos majoritários – era formado por inimigos do povo. Seus líderes e constituintes receberam voz de prisão.
Ao mesmo tempo, os bolcheviques iniciaram um jogo político no sentido de levar uma cisão ao partido majoritário – o Partido Socialista Revolucionário, com cerca de 16 milhões de votos -, antigos companheiros de jornada dos bolcheviques, oferecendo-lhe alguns cargos no Conselho de Comissários do Povo. Até os dias de hoje essas práticas são comuns...
Finalmente, a 5 de janeiro de 1918 a única assembléia representativa livremente eleita na história da Rússia se reuniu.
Seus membros foram severamente advertidos de que toda tentativa de qualquer partido ou organização para se assenhorear das funções do Poder estatal seria encarada como uma ação contra-revolucionária. Um funcionário do Partido Bolchevique mostrou-se mais específico, ao ser indagado sobre o que aconteceria se os membros da Assembléia se manifestassem contra os bolcheviques: “Primeiro nós tentaremos dissuadi-los, se persistirem, nós os fuzilaremos”.
No dia da instalação da Assembléia, Petrogrado parecia uma cidade sob estado de sítio. Destacamentos de soldados e marinheiros de confiança guardavam os pontos estratégicos. O bolchevique Moisei Solomovitch Uritsky, chefe da Checka (Polícia Secreta dos Bolcheviques) de Petrogrado, era o mestre-de-cerimônias. O Palácio Tauride, onde a Assembléia iria ser instalada, estava policiado por 200 marinheiros chefiados por Arkadiy Ykovlevich Zhelezniyakov, um anarquista, chefe de uma gang que roubava e raptava em Petrogrado. Ele era o elemento indicado para vigiar a Assembléia, pois se viessem a ocorrer incidentes, estes seriam imputados aos anarquistas.
Viktor Mikhailovitch Chernov, líder do Partido dos Camponeses, eleito presidente da Assembléia, iniciou o seu discurso. Nas galerias, os marinheiros, impacientes, entretinham-se fazendo pontaria com suas armas na cabeça do orador. Após tornar impossíveis os demais discursos, os constituintes bolcheviques retiraram-se do recinto.
Os constituintes dos demais partidos, visando garantir a reunião do dia seguinte, evitando um possível ardil, não abandonaram as dependências do Palácio Tauride. Mas, às quatro horas da manhã Zhelezniyakov deu um soco na mesa do presidente da Assembléia e bradou para Chernov:“Nós já estamos cansados! Encerrem essa reunião e vão-se embora!”
E assim, a única assembléia eleita democraticamente na história da Rússia foi dispersada com um soco na mesa e nunca mais voltou a reunir-se.
Afora pequenas manifestações nas ruas de Petrogrado, nenhuma força apareceu para amparar os representantes do povo russo. A Assembléia foi, então, oficialmente dissolvida pelo Comitê Central do Congresso dos Sovietes. No decreto de extinção foi alegado que “havia indícios de que a Assembléia Constituinte poderia ser apenas uma camuflagem para a luta dos contra-revolucionários visando a derrubada do poder soviético”.
O destino dado à Assembleia Constituinte demonstra a rápida erosão de quaisquer sentimentos democráticos remanescentes entre os adeptos de Lênin. Também, ao contrário do que aconteceu em outubro, quando da luta pela derrubada do governo de Kerensky, nenhum bolchevique argumentou em favor da ampla coalizão de todo o povo.
Essa Assembléia Constituinte seria livre, democrática e soberana, escolhida por todo o povo, muito diferente das Dumas do tempo dos Czares. Representantes do povo, democraticamente eleitos, iriam reunir-se e decidir sobre os destinos da Rússia. Essa havia sido a principal palavra-de-ordem dos bolcheviques.
Durante os primeiros dias de poder foram realizadas as eleições para esse órgão. Devido à vastidão do país e ao generalizado clima de desordem, tais eleições levaram mais tempo que o normal. Finalmente, a opinião das massas fez-se ouvir: mais de 40 milhões de votos foram apurados, sendo que apenas cerca de 10 milhões – a quarta parte dos votantes – para os bolcheviques que, assim, ficaram em minoria.
Somente um idiota poderia imaginar que Lênin passaria o poder para a tal Assembléia Constituinte ou lhe pediria um voto de confiança para o Conselho de Comissários do Povo, do qual era presidente.
Mas, o que fazer então, da Assembléia Constituinte?
Em novembro de 1917, o Comitê Central do Partido Bolchevique reuniu-se para examinar a incômoda situação. Ficou decidido adiar a instalação da Assembléia Constituinte e, enquanto isso, esclarecer as massas sobre os perigosos elementos para ela eleitos. Foi alegado que o Partido dos Kadets – um dos majoritários – era formado por inimigos do povo. Seus líderes e constituintes receberam voz de prisão.
Ao mesmo tempo, os bolcheviques iniciaram um jogo político no sentido de levar uma cisão ao partido majoritário – o Partido Socialista Revolucionário, com cerca de 16 milhões de votos -, antigos companheiros de jornada dos bolcheviques, oferecendo-lhe alguns cargos no Conselho de Comissários do Povo. Até os dias de hoje essas práticas são comuns...
Finalmente, a 5 de janeiro de 1918 a única assembléia representativa livremente eleita na história da Rússia se reuniu.
Seus membros foram severamente advertidos de que toda tentativa de qualquer partido ou organização para se assenhorear das funções do Poder estatal seria encarada como uma ação contra-revolucionária. Um funcionário do Partido Bolchevique mostrou-se mais específico, ao ser indagado sobre o que aconteceria se os membros da Assembléia se manifestassem contra os bolcheviques: “Primeiro nós tentaremos dissuadi-los, se persistirem, nós os fuzilaremos”.
No dia da instalação da Assembléia, Petrogrado parecia uma cidade sob estado de sítio. Destacamentos de soldados e marinheiros de confiança guardavam os pontos estratégicos. O bolchevique Moisei Solomovitch Uritsky, chefe da Checka (Polícia Secreta dos Bolcheviques) de Petrogrado, era o mestre-de-cerimônias. O Palácio Tauride, onde a Assembléia iria ser instalada, estava policiado por 200 marinheiros chefiados por Arkadiy Ykovlevich Zhelezniyakov, um anarquista, chefe de uma gang que roubava e raptava em Petrogrado. Ele era o elemento indicado para vigiar a Assembléia, pois se viessem a ocorrer incidentes, estes seriam imputados aos anarquistas.
Viktor Mikhailovitch Chernov, líder do Partido dos Camponeses, eleito presidente da Assembléia, iniciou o seu discurso. Nas galerias, os marinheiros, impacientes, entretinham-se fazendo pontaria com suas armas na cabeça do orador. Após tornar impossíveis os demais discursos, os constituintes bolcheviques retiraram-se do recinto.
Os constituintes dos demais partidos, visando garantir a reunião do dia seguinte, evitando um possível ardil, não abandonaram as dependências do Palácio Tauride. Mas, às quatro horas da manhã Zhelezniyakov deu um soco na mesa do presidente da Assembléia e bradou para Chernov:“Nós já estamos cansados! Encerrem essa reunião e vão-se embora!”
E assim, a única assembléia eleita democraticamente na história da Rússia foi dispersada com um soco na mesa e nunca mais voltou a reunir-se.
Afora pequenas manifestações nas ruas de Petrogrado, nenhuma força apareceu para amparar os representantes do povo russo. A Assembléia foi, então, oficialmente dissolvida pelo Comitê Central do Congresso dos Sovietes. No decreto de extinção foi alegado que “havia indícios de que a Assembléia Constituinte poderia ser apenas uma camuflagem para a luta dos contra-revolucionários visando a derrubada do poder soviético”.
O destino dado à Assembleia Constituinte demonstra a rápida erosão de quaisquer sentimentos democráticos remanescentes entre os adeptos de Lênin. Também, ao contrário do que aconteceu em outubro, quando da luta pela derrubada do governo de Kerensky, nenhum bolchevique argumentou em favor da ampla coalizão de todo o povo.
O governo de um partido único tornou-se, assim, a norma aceita e inquestionável que vigorou na União Soviética até dezembro de 1991, quando ela foi extinta por Boris Yeltsin, e nos demais países em que, pela força, os comunistas se instalaram.
Carlos I. S. Azambuja é Historiador.
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
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