sábado, 19 de julho de 2014

A independência como marca da ação política dos BRICS

por Aleksander Medvedovsky

Faz quase 14 anos que a sigla BRIC surgiu no vocabulário do mundo. Em 2001, cunhada por Jim O'Neill, ela se tornou conhecida no estudo "Building Better Global Economic BRICs" e é lembrada toda vez que se fala no clube, grupo ou bloco de que fazem parte o Brasil, a Rússia, a Índia e a China (e, depois, também a África do Sul – no bloco BRICS).


Por iniciativa de Vladimir Putin, os líderes daqueles quatro países se reuniram pela primeira vez na cidade de Ekaterinburgo, na Rússia, em 2009, e desde então se encontram regularmente uma vez por ano numa reunião de cúpula. Agora, em Fortaleza.

A literatura econômica contemporânea não tem seguramente exemplos parecidos com este, em que de repente uma sigla se torna tão falada e discutida, passando de "menina dos olhos" para "o patinho feio" da história. E não é por menos. Entre 2003 e 2007 o crescimento econômico dos quatro países que fazem jus à sigla original representou 65% da expansão do PIB mundial. Atualmente, com a crise, cujas origens são bem conhecidas, os países em desenvolvimento, os BRICS entre eles, obviamente têm passado por dificuldades maiores do que os outros, e apresentam resultados muito mais modestos.

Na opinião de vários analistas econômicos, o BRICS acabou, mas, considerando os números, torna-se difícil concordar com essa conclusão.
Vejam só: de acordo com o FMI, nas últimas duas décadas o peso econômico do BRICS no mundo passou de 5,6% para 21%. Os BRICS representam 40% da população mundial e têm como características próprias o baixo custo de mão de obra, a crescente produtividade, o grande e ávido mercado interno, o incentivo aos investimentos estrangeiros e, em alguns deles, uma inesgotável oferta de recursos naturais. O conjunto desses fatores oferece e cria as oportunidades para o BRICS terem grande potencial de crescimento.

As reservas internacionais dos BRICS representam 5,2 trilhões de dólares. O grupo, que inicialmente não conseguiu ser chamado nem de clube, hoje está se tornando um bloco com posições conjuntas em vários assuntos internacionais, como por exemplo, ultimamente, nos casos da Síria e da Ucrânia. A marca da ação política dos BRICS é o caminho da independência, da livre escolha, da reforma financeira global e do mundo multipolar.

Na parte econômica, as coisas não estão tão claras ainda, mesmo porque alguns membros do grupo têm objetivos diferentes e várias vezes distantes.
Na opinião de Vladislav Inozemtsev, professor de Economia da Universidade Estatal de Moscou, exposta no artigo "Uma Pauta para Amanhã", publicado na revista BRICS Business Magazine, para o BRICS se tornar uma influente instituição internacional é necessário fortalecer as ainda fracas relações comerciais entre os parceiros, além de oferecer ao mercado, inclusive ocidental, as ideias que podem se tornar um importante caminho para a aproximação.

Em relação às ligações entre parceiros dentro do BRICS, estão começando a surgir os primeiros resultados significativos, isto é, as assinaturas recentes de grande número de volumosos contratos entre a China e a Rússia, incluindo fornecimento de gás no valor de US$ 400 bilhões, e as intenções da China de aumentar o volume de comércio com os demais países do BRICS, particularmente com o Brasil.

O diálogo com o Ocidente – continua o professor Inozemtsev – ainda está fraco.
Caso os BRICS realmente desejem, dentro de 30 ou 40 anos, tornar-se líderes da moda econômica mundial, eles devem tomar iniciativa nos assuntos que são os principais na política global.

De acordo com o professor, são três os principais.

Primeiro, o aquecimento global, como principal problema ambiental planetário, em que ele sugere participação mais ativa dos países do BRICS num debate mundial, principalmente a Rússia, a China e a Índia.

Segundo, a avaliação da dívida interna dos Estados Unidos e da União Europeia, uma situação que estamos vivendo atualmente e que dificilmente vai mudar nos próximos dez anos.
O problema é que até 1990 o Ocidente foi credor global, mas na atualidade tudo mudou drasticamente, e enquanto Rússia, Índia e Brasil possuem reservas mundiais de 5,2 trilhões de dólares (em novembro de 2013), o Ocidente está com uma dívida interna altamente preocupante.
O autor do artigo publicado na revista BRICS Business Magazine sugere aos líderes dos países do BRICS preparar propostas que, por um lado, possam diminuir as dívidas mas, por outro, contribuir para o desenvolvimento dos próprios BRICS.

O terceiro assunto para ser discutido é o problema da corrupção e da falta de transparência – tema que tem a maior importância para o crescimento dos países em desenvolvimento, e que assusta os investidores, os bancos e o mundo dos negócios ocidental.

A própria política anticorrupção de cada país do BRICS tratada pelo governo e órgãos competentes e seguida de ações conjuntas com o sistema financeiro mundial torna cada vez mais difícil a transferência ilegal de dinheiro para os bancos do Ocidente.

Fortalecendo as ações conjuntas na área política internacional, aperfeiçoando as relações comerciais dentro do bloco, criando uma agenda conjunta com os países do Ocidente, definindo a sua estratégia e captando novos sócios, o BRICS tem tudo para se tornar um importantíssimo player nas relações globais.

A impressão que se tem é de que os líderes dos países do grupo estão entendendo isso, como demonstram a decisão rápida da criação do banco de investimento com capital de US$ 50 bilhões e o acordo do contingente de reservas, com US$ 100 bilhões disponíveis. Eles mostram a clara decisão de transformar o BRICS num organismo político e econômico com objetivos bem definidos.


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