Hélio Duque
Na Argentina, ao contrário dos personagens bíblicos, o encontro
de José, com Jesus e Maria no Convento Monjas Orantes y Penitentes de Nuestra
Senõra del Rosario de Fátima foi devastador. José Lopez, ex-secretário de Obras
Públicas do governo de Cristina Kirchner, na madrugada, arremessava
bolsas sobre o muro do convento contendo US$ 8,9 milhões.
O granjeiro Jesús Omar Ojeda, vizinho do convento, ao ver em
seguida José saltar o muro, pensou ser assaltante e, temeroso do que poderia
acontecer com as religiosas, avisou a polícia. Com o cerco policial, diante da
freira Maria, de 95 anos, gritou: “Roubei esse dinheiro para vir ajudar aqui”.
Escoltado e detido com os seus volumosos pacotes, a polícia levou 22
horas para contar, manualmente, a fortuna de U$ 8,9 milhões. Os argentinos,
ante o “escândalo do convento”, o governo de Mauricio Macri e setores do
Parlamento empenham-se na aprovação de uma Lei de delação premiada para
aprofundar as investigações e alcançar os corruptos.
No Brasil, a república da delação vai ganhando velocidade com
velhos e novos personagens denunciando a corrupção sistêmica em obras públicas.
Fortes emoções frequentam o radar da política nacional. Anteriormente, o
ex-senador e líder do governo, Delcídio Amaral, quando preso na Polícia
Federal, elencou fatos, dados e personagens na trama criminosa que viveu e
conviveu ao longo de vários anos. O mais recente foi o ex-senador Sérgio
Machado, por quase 12 anos presidindo a Transpetro, nos governos Lula e Dilma.
Empresa estratégica da Petrobrás, na movimentação marítima da sua produção de
petróleo e derivados no País e no exterior.
Foi senador pelo PSDB de 1994 a 2001. Tendo inclusive ocupado a
sua liderança. Em 2002, filiou-se ao PMDB. A partir de 2003, ficando sem
mandato parlamentar, foi indicado pela bancada peemedebista, no Senado, para
ocupar a presidência da segunda maior subsidiária da Petrobrás. Por mais de
década comandou o Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro, o
Promef I e II.
Coordenou a licitação para construção de navios, com a compra de
49. Em 2010, o estaleiro Atlântico Sul, construiu e entregou o petroleiro João
Cândido, 100% nacional. Fruto da política de conteúdo nacional, o navio, ao ser
colocado no mar, tinha defeitos estruturais que impedia a navegabilidade. Foi
obrigado a retornar ao estaleiro sob o risco de afundamento, praticamente
reconstruído com grandes prejuízos para a Petrobrás.
Em 2009, a “Operação Castelo de Areia”, já apontava valores e
cálculos na divisão de propina na Transpetro. A força tarefa daquela operação
encontrara anotações do diretor financeiro Pietro Bianchi, da construtora
Camargo Corrêa, associadas a Sérgio Machado. O Ministério Público detalhava a
conta da Camargo Corrêa no Banco de Andorra transferindo valores para o HSBC
Private Bank Zurich, em benefício da Jaravy Investments Inc. com sede no
Panamá. Tristemente ,o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao anular a
“Operação Castelo de Areia”, com a atuação determinante do ex-ministro da Justiça
de Lula, Marcio Thomaz Bastos, impediu as investigações, só retomadas com a
“Operação Lava Jato”.
Como o tempo é o senhor da razão, em dezembro, a Polícia Federal
executou mandados de busca e apreensão na Transpetro e nos endereços de Sérgio
Machado. Ele era alcançado pela chamada República de Curitiba. Apareciam
contas no exterior envolvendo seus filhos no esquema de corrupção montado na
estatal. Antecipando a possível prisão pela Lava Jato, buscou em Brasília, a
Procuradoria Geral da República (PGR), garantindo entregar todo o esquema
corrupto e os beneficiários políticos dos desvios milionários dos recursos
transferidos para os senadores que garantiram sua nomeação, por longo tempo, na
presidência da Transpetro.
Na delação premiada agregou a novidade de sair de gravador
escondido, captando conversas com José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá,
surgindo diálogos anti republicanos. Não conseguindo gravar os senadores Edson
Lobão e Jader Barbalho, nominou os cinco parlamentares como recebedores de
vários milhões de reais da fortuna corrupta que administrava. Na PGR garantiu a
devolução de R$ 75 milhões incorporados ao seu patrimônio. Ao final teve
homologada pelo ministro Teori Zavascki do STF, a sua delação que atingiu a
cúpula do Senado do PMDB.
Cumprirá pena de três anos na confortável residência na praia do
Futuro, em Fortaleza, em paz com a sua consciência, como afirma. Certamente,
nesse tempo de reclusão, contemplará os verdes mares cearenses sonhando com
“pedras preciosas” de riqueza no seu “dolce far niente”.
A estimada jornalista Eliane Cantanhêde em “O Estado de S.Paulo”
(19-6-2016), sob o título “Pena Leve”, constatou: “Sérgio Machado roubou mais
para ele do que para qualquer partido. Quem devolve R$ 75 milhões desviou
quanto? Ainda fica com quanto? Pena de multa e tornozeleira desacredita a
máxima de que o crime não compensa”.
Helio Duque
Doutor em Ciências, área econômica, pela
Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É
autor de vários livros sobre a economia brasileira.
Alerta Total – www.alertatotal.net
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