Caio Augusto de
Oliveira Rodrigues
As
funções do Estado são e sempre serão motivo de discussão. Existem pessoas que
acreditam que este deva fazer parte de todas as ações públicas e privadas por
ser capaz de controlá-las; também existe outros que acreditam que tudo que ele
toca vira pó (então deveria ficar longe de toda e qualquer atividade). No meio
do caminho está o grupo de pessoas – no qual me incluo – que acredita que
algumas funções do Estado devem existir, mas que este não deve ser o fornecedor
de todos os serviços e produtos mas sim deve agir como uma espécie de formador
de regras do jogo.
Independente
de qual seja a opinião, partindo para alguns dados vemos que realmente não é um
bom negócio ter a figura do poder público sobre o comando de empresas –
principalmente pelo fato de que, enquanto os benefícios auferidos por essas
instituições geralmente são privados/reduzidos, os prejuízos são totalmente
públicos. Um adendo: o termo “estatal” neste artigo se refere não só ao caso de
controle total da empresa (como nos Correios) como também dos casos de
sociedade mista em que a decisão governamental (que pode ser técnica ou
política) é a que vale (como na Petrobras e na Eletrobras).
Sobre o
caso da Petrobras é comum encontrarmos como justificativa que o governo deveria
encaminhar sua privatização devido aos custosos e notórios casos de corrupção.
Porém, não para por aí: a empresa iniciada pela famigerada campanha “o petróleo
é nosso” [1] faz muito mais pelos grandes grupos privados do que se pode
imaginar. Como? Fixando os preços. A questão de fixar preços é polêmica:
busca-se obter um ganho de curto prazo para toda a população quando o preço
real está acima dele (mesmo que isso custe em subsídios, cuja conta mais hora
menos hora aparece [2]) e perde-se quando o preço está abaixo.
Trazendo
para a realidade brasileira: de 2008 a 2013 os combustíveis ficaram numa faixa
de preço quase fixa em termos reais (e com altos subsídios, pois o preço do
petróleo – que dá base a esses preços – estava muito acima do combustível que
era vendido aqui) e, após uma queda vertiginosa da cotação do petróleo
internacionalmente, a fim de fazer caixa para a empresa, temos hoje um preço de
combustíveis consideravelmente maior do que a média internacional (isso sem
falar no efeito de redução de investimento, quebra de empresas e desemprego
gerado, em cadeia, sobre o setor sucroalcooleiro durante essa “segurada” de
preços) [3]. E como grupos empresariais lucram com isso? Simples: como o preço
daqui é 40-60% superior ao internacional [4] [5], eles importam combustível com
esse diferencial e o vendem aqui. Outro problema grave iniciado pela empresa
foi sua mudança sobre os recursos humanos que, buscando beneficiar os
sindicatos de trabalhadores da companhia, agora faz com que ela arque com
processos bilionários [6].
Esse
aparelhamento estatal todo não garante nem resultados (em 2015 a empresa teve o
maior prejuízo de sua história [7]) e nem empregos (estes que estão indo embora
não só pelos efeitos da Lava Jato, mas também por investimentos incorretos –
politicamente orientados, em muitos casos – realizados [8]).
Na
Eletrobras a situação é análoga: a companhia, também de capital misto [9],
forçou uma queda de preços na energia elétrica brasileira em uma medida direta
do poder executivo federal em 2013 e isso implicou em uma forte queda nos
investimentos no setor – apenas no ano de 2015, temos que metade da queda da
taxa de investimento sobre o PIB se deveu a políticas públicas equivocadas em
estatais [10]. Essa queda tem o seguinte motivo: como contratos de investimento
de longo prazo apresentam desembolsos vultosos no tempo presente e retorno em
receita ao longo do tempo – tendo um payback (retorno do capital
investido) demorado, geralmente –, é natural que, mexendo-se na estrutura de
receitas, a confiança para efetuar novos investimentos é reduzida enormemente.
Desde
2012, a empresa encontra-se em dificuldades financeiras e, atualmente, estuda
inclusive vender ativos para melhorar seu caixa [11]. Nem as medidas populistas
de fixar o preço da gasolina e baixar o da energia tiveram efeitos duradouros:
em 2015 (o ano em que a conta chegou), o impacto somado dos aumentos desses
dois preços foi de quase um quarto no total da inflação [12].
O caso
dos Correios é ainda mais curioso: diferentemente da Petrobras, os Correios são
monopolistas em seu setor [13] e, mesmo assim, apresentam prejuízos bilionários
e recorrentes, não só financeiramente falando quanto também em qualidade dos
serviços prestados [14]. Isso ocorre não apenas pela ausência de incentivos
para melhorar sua gestão – essa que advém da competição não enfrentada – como
também pela relação de politicagem existente entre seu fundo de pensão e
partidos políticos que comandam o governo federal: por motivos que ainda estão
sendo apurados (mas, pelo que tudo indica, foram ideológicos), decidiu-se que
os investimentos a serem feitos por eles teriam como destino não os títulos
mais produtivos e com maior capacidade de pagamento (como se imagina ser
racional quando do momento de realizar investimentos) e, como consequência
atual, o rombo terá de ser coberto com os salários dos próprios funcionários da
empresa [15].
Geralmente
é neste momento que quem se encontra no primeiro grupo citado no artigo – o de
pessoas que acreditam que o Estado deve controlar tudo – faz a acusação a este
autor de ser “entreguista”, “favorecedor dos grandes grupos do capital”, dentre
outros “elogios”. Mas fica aqui uma séria reflexão: vale mesmo a pena que o
governo siga no comando de empresas que prejudicam toda a nação de algum modo?
É inteligente imaginar que tais monopólios garantirão mesmo benefícios a todos
nós? É “entreguismo” querer um fornecimento de serviços e produtos mais
eficiente? Vale a pena encararmos prejuízos dantescos em prol de um bem maior
que fica concentrado e de um retorno em serviços caros e ineficientes?
Estamos
vivendo um momento de discussão sobre a extensão do Estado em nosso país e,
pontos importantes como esse das estatais não podem ficar de fora – não só pelo
ponto “quanto custam para existir” quanto no sentido “qual a razão prática de
existirem”. Afinal de contas, se apresentam resultados negativos em diversos
aspectos (financeiro, geração de empregos, preço ao consumidor), está provado
que há algo errado com essas instituições e que elas precisam de revisão – seja
esta a privatização ou a permissão de que existam novos concorrentes.
Caio Augusto de
Oliveira Rodrigues
Bacharel
em Economia Empresarial e Controladoria pela FEA-RP/USP e criador do blog
Questão de Incentivos.
Terraço Econômico
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