terça-feira, 21 de junho de 2016

Estatais são “orgulho nacional”? Petrobras, Eletrobras e Correios dizem o contrário

Caio Augusto de Oliveira Rodrigues

As funções do Estado são e sempre serão motivo de discussão. Existem pessoas que acreditam que este deva fazer parte de todas as ações públicas e privadas por ser capaz de controlá-las; também existe outros que acreditam que tudo que ele toca vira pó (então deveria ficar longe de toda e qualquer atividade). No meio do caminho está o grupo de pessoas – no qual me incluo – que acredita que algumas funções do Estado devem existir, mas que este não deve ser o fornecedor de todos os serviços e produtos mas sim deve agir como uma espécie de formador de regras do jogo.

Independente de qual seja a opinião, partindo para alguns dados vemos que realmente não é um bom negócio ter a figura do poder público sobre o comando de empresas – principalmente pelo fato de que, enquanto os benefícios auferidos por essas instituições geralmente são privados/reduzidos, os prejuízos são totalmente públicos. Um adendo: o termo “estatal” neste artigo se refere não só ao caso de controle total da empresa (como nos Correios) como também dos casos de sociedade mista em que a decisão governamental (que pode ser técnica ou política) é a que vale (como na Petrobras e na Eletrobras).

Sobre o caso da Petrobras é comum encontrarmos como justificativa que o governo deveria encaminhar sua privatização devido aos custosos e notórios casos de corrupção. Porém, não para por aí: a empresa iniciada pela famigerada campanha “o petróleo é nosso” [1] faz muito mais pelos grandes grupos privados do que se pode imaginar. Como? Fixando os preços. A questão de fixar preços é polêmica: busca-se obter um ganho de curto prazo para toda a população quando o preço real está acima dele (mesmo que isso custe em subsídios, cuja conta mais hora menos hora aparece [2]) e perde-se quando o preço está abaixo.

Trazendo para a realidade brasileira: de 2008 a 2013 os combustíveis ficaram numa faixa de preço quase fixa em termos reais (e com altos subsídios, pois o preço do petróleo – que dá base a esses preços – estava muito acima do combustível que era vendido aqui) e, após uma queda vertiginosa da cotação do petróleo internacionalmente, a fim de fazer caixa para a empresa, temos hoje um preço de combustíveis consideravelmente maior do que a média internacional (isso sem falar no efeito de redução de investimento, quebra de empresas e desemprego gerado, em cadeia, sobre o setor sucroalcooleiro durante essa “segurada” de preços) [3]. E como grupos empresariais lucram com isso? Simples: como o preço daqui é 40-60% superior ao internacional [4] [5], eles importam combustível com esse diferencial e o vendem aqui. Outro problema grave iniciado pela empresa foi sua mudança sobre os recursos humanos que, buscando beneficiar os sindicatos de trabalhadores da companhia, agora faz com que ela arque com processos bilionários [6].


Esse aparelhamento estatal todo não garante nem resultados (em 2015 a empresa teve o maior prejuízo de sua história [7]) e nem empregos (estes que estão indo embora não só pelos efeitos da Lava Jato, mas também por investimentos incorretos – politicamente orientados, em muitos casos – realizados [8]).

Na Eletrobras a situação é análoga: a companhia, também de capital misto [9], forçou uma queda de preços na energia elétrica brasileira em uma medida direta do poder executivo federal em 2013 e isso implicou em uma forte queda nos investimentos no setor – apenas no ano de 2015, temos que metade da queda da taxa de investimento sobre o PIB se deveu a políticas públicas equivocadas em estatais [10]. Essa queda tem o seguinte motivo: como contratos de investimento de longo prazo apresentam desembolsos vultosos no tempo presente e retorno em receita ao longo do tempo – tendo um payback (retorno do capital investido) demorado, geralmente –, é natural que, mexendo-se na estrutura de receitas, a confiança para efetuar novos investimentos é reduzida enormemente.

Desde 2012, a empresa encontra-se em dificuldades financeiras e, atualmente, estuda inclusive vender ativos para melhorar seu caixa [11]. Nem as medidas populistas de fixar o preço da gasolina e baixar o da energia tiveram efeitos duradouros: em 2015 (o ano em que a conta chegou), o impacto somado dos aumentos desses dois preços foi de quase um quarto no total da inflação [12].

O caso dos Correios é ainda mais curioso: diferentemente da Petrobras, os Correios são monopolistas em seu setor [13] e, mesmo assim, apresentam prejuízos bilionários e recorrentes, não só financeiramente falando quanto também em qualidade dos serviços prestados [14]. Isso ocorre não apenas pela ausência de incentivos para melhorar sua gestão – essa que advém da competição não enfrentada – como também pela relação de politicagem existente entre seu fundo de pensão e partidos políticos que comandam o governo federal: por motivos que ainda estão sendo apurados (mas, pelo que tudo indica, foram ideológicos), decidiu-se que os investimentos a serem feitos por eles teriam como destino não os títulos mais produtivos e com maior capacidade de pagamento (como se imagina ser racional quando do momento de realizar investimentos) e, como consequência atual, o rombo terá de ser coberto com os salários dos próprios funcionários da empresa [15].

Geralmente é neste momento que quem se encontra no primeiro grupo citado no artigo – o de pessoas que acreditam que o Estado deve controlar tudo – faz a acusação a este autor de ser “entreguista”, “favorecedor dos grandes grupos do capital”, dentre outros “elogios”. Mas fica aqui uma séria reflexão: vale mesmo a pena que o governo siga no comando de empresas que prejudicam toda a nação de algum modo? É inteligente imaginar que tais monopólios garantirão mesmo benefícios a todos nós? É “entreguismo” querer um fornecimento de serviços e produtos mais eficiente? Vale a pena encararmos prejuízos dantescos em prol de um bem maior que fica concentrado e de um retorno em serviços caros e ineficientes?


Estamos vivendo um momento de discussão sobre a extensão do Estado em nosso país e, pontos importantes como esse das estatais não podem ficar de fora – não só pelo ponto “quanto custam para existir” quanto no sentido “qual a razão prática de existirem”. Afinal de contas, se apresentam resultados negativos em diversos aspectos (financeiro, geração de empregos, preço ao consumidor), está provado que há algo errado com essas instituições e que elas precisam de revisão – seja esta a privatização ou a permissão de que existam novos concorrentes.

Caio Augusto de Oliveira Rodrigues 
Bacharel em Economia Empresarial e Controladoria pela FEA-RP/USP e criador do blog Questão de Incentivos.

Terraço Econômico



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