Entrevista
com
Oliver Stuenkel
(*)
Cientista
político alemão afirma que existe uma rejeição a toda a classe política
brasileira, o que forma um cenário ideal para os populistas, como o visto na
Venezuela no fim dos anos 1990 e na Itália pré-Berlusconi.
Nas três
primeiras semanas de governo, o presidente interino Michel Temer viu dois de
seus ministros caírem – o do Planejamento e o da Transparência. Ambos foram
vítimas de gravações, sugerindo a intenção de interferir na Operação Lava Jato.
Em
entrevista à DW, o cientista político Oliver Stuenkel afirma que, caso o
governo Temer se torne insustentável e protestos cresçam, o presidente interino
também pode sofrer um processo de impeachment.
Stuenkel
ressalta, entretanto, que novas eleições podem ser um risco para o Brasil,
onde, segundo ele, existe um clima parecido com a era pré-Berlusconi, na
Itália, e com os acontecimentos que favoreceram a chegada ao poder de Hugo
Chávez, na Venezuela.
"Apenas
uma nova liderança que admita abertamente e lamente os erros do passado será
capaz de evitar uma radicalização, tanto para a esquerda como para a
direita", afirma Stuenkel, que é professor adjunto de Relações
Internacionais da FGV e membro não residente do Instituto Global de Política
Pública (GPPi), em Berlim.
DW: Dois ministros
recém-nomeados renunciaram após gravações sugerirem o desejo deles de evitar
que aliados políticos sejam investigados pela Lava Jato. Eles são apenas
escolhas infelizes de Temer ou seria isso algo sintomático deste governo?
Oliver Stuenkel: Acho que isso é sintomático da
política brasileira em geral. O aspecto incomum da situação atual é que as
investigações sobre corrupção estão desestabilizando profundamente o governo e
a política como um todo. É algo completamente novo no Brasil que investigações
sejam independentes, que pessoas poderosas sejam levadas à Justiça. A Polícia
Federal tem tanto apoio público no escândalo da Lava Jato que é impossível para
o governo controlar as investigações. E essas revelações estão causando grande
instabilidade, porque ninguém sabe o que vem a seguir.
A instabilidade política pode
atrasar a recuperação econômica. No entanto, a incapacidade do governo para
controlar as investigações sobre corrupção soa como coisa boa.
Elas são
definitivamente um passo doloroso, mas necessário para um amadurecimento da
democracia. E muitas pessoas esperam que este seja o início de uma política
mais limpa. Mas uma regra de ciência política na América Latina diz: as pessoas
se preocupam com a corrupção apenas quando o crescimento econômico é baixo. E
crescimento econômico no Brasil agora é negativo. Então, o grande teste para a
democracia brasileira virá quando os preços das commodities subirem, e a
economia crescer novamente. Tradicionalmente, as pessoas no Brasil deixam os
políticos corruptos escaparem, justificando que eles "roubam, mas
fazem".
Você acha que têm razão aqueles que
afirmam que Dilma foi removida do cargo mais por razões políticas do que pela
alegada manipulação do orçamento?
Dilma
certamente não caiu por causa das supostas pedaladas fiscais, mas porque
fracassou em governar adequadamente. Se ela não tivesse caído por isso, tinha
caído por outra coisa.
Então, mesmo o governo Temer tendo
perdido muito de seu já minguado apoio, é improvável que Dilma volte?
Nem
mesmo o Partido dos Trabalhadores (PT) de Dilma quer que ela volte, porque todo
mundo sabe que ela foi uma péssima presidente. Ela pode ser uma boa pessoa, mas
é uma péssima política. Tirando um grupo bastante radical, ela não tem apoio
público e nenhuma autoridade política.
Então, o Brasil estaria caminhando
para novas eleições?
Temer
fez uma série de erros amadores em público. Ele pode simplesmente renunciar,
mas a coisa mais provável de acontecer é a seguinte: se o governo Temer se
tornar insustentável e protestos crescerem, os tribunais vão mover um processo
de impeachment também contra o governo Temer. Não quero dizer que eles venham a
emitir sentenças falsas, mas considero que eles têm um senso muito agudo de
responsabilidade em evitar mais instabilidade. E há acusações contra ambos,
Temer e Dilma, de terem financiado de forma ilícita suas campanhas
presidenciais em 2014.
Quem tem interesse em novas
eleições?
Isso é
difícil de dizer. O PT está em péssima forma depois de tudo o que aconteceu, e
o PSDB enfrenta uma batalha interna de poder. Mas há pressão da opinião
pública: cerca de 70% da população brasileira querem novas eleições.
Considerando que não há
aparentemente nenhum político com uma ficha limpa, em que novas eleições
poderiam contribuir para uma maior estabilidade?
É fato
que existe um tipo de pulverização na política brasileira e uma rejeição a toda
a classe política – um cenário ideal para os populistas. No Brasil, há um clima
pré-Berlusconi ou pré-Chávez. O mesmo aconteceu na Itália durante as
investigações da Operação Mãos Limpas no início dos anos 90, que levaram à
eleição de Silvio Berlusconi, e também na Venezuela, no processo que ajudou
Hugo Chávez a se tornar presidente. Em novas eleições poderá haver dez ou mais
candidatos, variando de moderados, como o ex-presidente Lula e seu adversário
nas eleições de 2002, José Serra, até o radical de direita xenófobo Jair
Bolsonaro. Com tantos candidatos, os radicais têm uma boa chance de avançar
para um segundo turno, com apenas 10% dos votos. Essa é a grande preocupação no
momento.
Essa é uma perspectiva bastante
tenebrosa. Haveria uma mais favorável?
Embora
eu tenha tendência em preferir eleições antecipadas, entendo o argumento de que
deixar que Temer cumpra seu mandato possa ajudar a acalmar um pouco as coisas.
Então, se o governo Temer levar o Brasil a sair da UTI, o governo eleito
posteriormente pode levar o país a sair do hospital. Mas isso não vai acontecer
até 2020.
E a longo prazo?
A grande
maioria no Brasil rejeita a classe política dominante, mas continua a acreditar
na democracia. Assim, será crucial para o Brasil que os grandes partidos
moderados, o PT na centro-esquerda e do PSDB, na centro-direita, se renovem
completamente. Apenas uma nova liderança que admita abertamente e lamente os
erros do passado será capaz de evitar uma radicalização, tanto para a esquerda
como para a direita.
Deutsche Welle –
DefesaNet
(*)Comentário do blog: é
interessante observar que os cientistas políticos consideram que a democracia
não pode funcionar sem partidos. Admitem candidatos independentes, mas com a
participação majoritária dos partidos.
Agora
mesmo, na entrevista acima, Oliver Stuenkel reafirma a necessidade de que dois
dos principais partidos que hoje dominam a cena política brasileira, PT e PSDB,
se renovem completamente. E nem cita
o maior deles, PMDB, sempre presente na distribuição das benesses entre os
partidos.
Esquerda
e direita são faces da mesma moeda. Um quer a predominância do Estado e outro
da iniciativa privada.
- Predominância
do Estado para melhor atender a população, mas sem atentar para a necessidade
de primeiro produzir para depois distribuir. Não levam em conta que o Estado
como produtor fracassou em todo mundo.
- Predominância
da iniciativa privada para produzir é correto, mas pecam por ir deixando pelo
caminho quem não conseguir acompanhar a fobia pelo lucro, para quem justiça
social é desperdício de dinheiro.
O Estado
democrático de direito requer Leis claras e bem dosadas, sem permitir que
privilégios sejam considerados legais seja para quem for, para
indivíduos
ou empresas.
E este é
o problema tanto dos estatizantes quanto dos ditos liberais. Um quer
privilegiar o pleno emprego mesmo sem trabalho. Não funciona.
Outro
quer privilegiar somente o lucro. No aspecto econômico funciona e mantém a
atividade em funcionamento. No aspecto de justiça social e mesmo de
desenvolvimento sustentado, não funciona. Para eles o ser humano que não
estiver em sua plena capacidade de servir, deixa de interessar. É dispensável.
Quem
precisa de ideologia é o Estado. E uma vez tendo o Estado leis claras sobre
produção e atendimento à população, o debate político passa a girar em torno de
manter esses dois aspectos em crescimento harmônico. Para isso os partidos
servem apenas para agrupar tendências e radicalizar posições, sem falar da
costumeira transformação dos mesmos em quadrilhas, especializadas em assalto aos cofres
públicos.
A
democracia funcionará melhor sem elas.(MBF).
Nenhum comentário:
Postar um comentário