terça-feira, 29 de março de 2016

Contra impeachment, governo abre o cofre

Paulo de Tarso Lyra

O Palácio do Planalto mapeia votos de aliados e faz as contas para liberar recursos com o objetivo de obter maioria na comissão que analisa o afastamento e nos plenários da Câmara e do Senado

O governo quer esquecer o ajuste fiscal e liberar investimentos, emendas e acelerar a nomeação de cargos para tentar fidelizar a base de apoio na Câmara e impedir o impeachment da presidente Dilma Rousseff. PSD, PTB, PR, PDT e PP, legendas rebeldes, comandam, juntas, um orçamento de R$ 49,4 bilhões em seus ministérios. Somadas, as respectivas bancadas totalizam 160 deputados.

A conta é fria: o apoio de cada deputado destes partidos significa um desembolso de R$ 308,7 milhões por parlamentar. Essa conta não inclui, obviamente, o PMDB e seus sete ministérios, pois a legenda vive a expectativa de poder com Michel Temer. Nem tampouco PT e PCdoB, legendas fechadas contra o afastamento da presidente.

O governo precisa, de fato, abrir o cofre. Para onde o Planalto se vira, há problemas. Na comissão do impeachment, que analisa neste momento o processo de afastamento da presidente, o governo tem, garantido, 32 dos 65 votos, uma conta na risca, já que o presidente do colegiado, Rogério Rosso (PSD-DF) só vota se houver empate.

No plenário da Câmara, para barrar o processo de impeachment, o Planalto e seus articuladores calculam contar com 150 votos cristalizados. São necessários, ao menos, 171, para impedir o afastamento precoce de Dilma. A matemática tem sido cruel para os governistas. A estimativa é de que haja uma margem de 50 a 60 deputados ainda indecisos, maleáveis a possíveis argumentos. Na prática, isso significa que 90% dos 513 deputados já se decidiram pela permanência ou afastamento da presidente.

“Para respirar aliviada, Dilma teria de ter uma margem de 200 a 220 votos cristalizados, para evitar os riscos de uma votação aberta. Essa é a base aliada que persegue desde que foi reeleita em 2014 e que jamais conseguiu”, admitiu, desolado, um petista bom de conta. “Se formos para o plenário com 150 apoios, esse número despenca para 100. Mas se chegarmos com 200, podemos crescer para os 220. É o efeito manada”, disse o mesmo estrategista.

Se for derrotada na Câmara, Dilma ainda tenta contar com os senadores para preservar o mandato. Se o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL) aceitar a abertura do processo encaminhada pelos deputados, automaticamente Dilma é afastada do cargo por até 180 dias. Renan já avisou que, ao contrário do que prometia em dezembro, não decidirá essa questão monocraticamente. Passará para o plenário da Casa. A oposição precisa de 54 votos para cassar a petista. Hoje, pelos cálculos dos próprios governistas, os adversários do Planalto já têm 41.

O cálculo de um defensor do impeachment é cruel para o Planalto. “Se eu disser que defendo a Dilma, hoje, nas ruas, eu apanho”, admitiu ele, não se sabe se utilizando linguagem figurada ou concreta. Mesmo que ele compre a briga, a batalha não renderá dividendos políticos. “Quem hoje defende a Dilma vota no PT, no PCdoB ou está nos movimentos sociais. Não é meu eleitorado. Ou seja, ser contra o impeachment não me dá um voto a mais e ainda afasta aqueles que me elegeram em 2014”, disse um parlamentar, pedindo anonimato.

A conta prática, em ano de eleições municipais, é cristalina. O PSD de Rogério Rosso (DF), presidente da Comissão do Impeachment, liberou a bancada para votar como bem entender. O ministro das Cidades, Gilberto Kassab, não pretende abandonar o cargo, mas tem pouca ascendência na bancada. “Hoje o cálculo é de 55% deputados fieis ao governo e 45% defensores do impeachment”, disse um dirigente pessedista. “Antes dos grampos envolvendo com as conversas de Dilma com o ex-presidente Lula, essa margem pró-planalto era muito maior”, admitiu o cacique do PSD.

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (RS), que teve de intervir na eleição de líder da bancada na Câmara para evitar que o partido derrapasse para a oposição, aposta ainda que a maior parte da legenda mantenha-se alinhada ao Planalto após ter mantido — com um técnico, não um político — o comando do Ministério da Integração Nacional. A aposta pode ser arriscada.

Vinte e dois deputados e quatro senadores aprovaram uma resolução exigindo que Ciro marque uma reunião do comando do partido no próximo dia 30 para definir se o PP é base ou oposição. “É quase a metade dos deputados e 2/3 dos senadores. Queremos uma definição em convenção de emergência da legenda antes da votação do impeachment na Câmara, prevista para a segunda quinzena de abril”, disse o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS).

O PR também está dividido. Um integrante do comando partidário faz e refaz as contas e não sabe se a titularidade no Ministério dos Transportes será suficiente para manter a bancada coesa em torno do Planalto. “Tivemos manifestações de rua marcadas e espontâneas pelo impeachment, grampos de Dilma e Lula, do ministro da Educação, Aloizio Mercadante e as delações do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS). É muita notícia ruim para um governo só”, reconheceu um deputado do PR.

Correio Braziliense


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