Fernão Lara Mesquita
Desde
que a Lava-Jato demonstrou que o PT é o Eduardo Cunha e vice-versa, e que há
muito pouca coisa entre os dois que se diferencie radicalmente de ambos, o
Brasil está paralisado na sua perplexidade.
Seriam,
de fato, os R$ 0,85 de cada mensalidade embolsados pelo ministro Paulo Bernardo
o maior escândalo desses “empréstimos consignados” com juros subsidiados que já
montam a R$ 281 bi (4,5% do PIB) para a casta dos “com tudo” ao lado dos mais
de 400% ao ano de juros do cartão do desespero dos “sem nada” de quem o Estado
já toma outros 46% do PIB (36% de carga + 10% de déficit)? Pense bem: o Bolsa
Familia, sempre aventado como desculpa para manter os ladrões onde estão, custa
0,3% do PIB…
Este
país de avessos, onde as escolas é que estão “ocupadas” e estudar passou a ser
uma atividade clandestina que a polícia reprime de preferência a quem trata de
impedi-la, teve tempo de sobra para acostumar-se com isto em que se
transformou. Os sindicatos-impostos de Getulio Vargas evoluíram do primeiro e
único ao 15º milésimo de hoje e a metástese prossegue sem combate ao ritmo de
280 novos por ano. E daí saltamos com toda a naturalidade para os nossos por
enquanto 35 partidos-impostos a quem pagamos horários-impostos para que nos
ofendam e humilhem diariamente na TV, tudo sob a proteção dos
“movimentos-sociais-impostos” recheados de militantes-impostos que nos cobram
hora-extra para viajar em ônibus-impostos para onde quer que sejam convocados
para defender a intocabilidade dos “seus” impostos. Passados 80 anos eis-nos
bancando festas nos palácios com impostos diretamente arrancados às favelas…
Com toda
a barreira de silêncio que ainda protege da exposição à execração pública que
merece o mundo da côrte movida a impostos onde “demissão” não consta do
dicionário, “auxílio” não é renda e os salários continuam subindo 60 bilhões
por ano em meio ao pânico aqui fora, bate na cara do país inteiro o verdadeiro
divisor de águas – contribuíntes x “contribuidos” – que separa os dois Brasis e
não se encaixa nem a murro no repertório “esquerda-direita” dos nossos
ditadores de “correção política”.
Agora
temos o ciclo completo. Do imperador ao proletário, todos que estiveram no
comando do “Sistema” colheram variações do desastre que é só o que ele pode
produzir ou, no máximo, suspenderam temporariamente seus efeitos. Caiu
finalmente a ficha. É tudo uma fraude. Tudo tem sido uma fraude. E o país que
não se assume como desonesto calou-se…
Tão perto! Tão longe!
O buraco
é de dar vertigem mas o tamanho do nosso atraso é o nosso maior trunfo. O mundo
está todo numa encruzilhada mas é uma encruzilhada lá na frente. Tudo que
diferencia o 1º do Último Mundo é, hoje, estrada batida. Para percorrê-la basta
se dispor a tanto. Você saberá que o Brasil tem cura quando se começar a
afirmar em voz alta, por aí, as duas balizas mais elementares da democracia
plantadas ha mais de 300 anos. Apoiar o discurso do ajuste das contas públicas
no princípio da igualdade perante a lei colocando na linha de cortes todos os
“direitos” e isenções que não sejam comuns a todos os brasileiros é a única
maneira de desarmar o torneio entre padrinhos de privilégios à custa do
aprofundamento da corrupção e da miséria em que ele, mais uma vez, se vai
transformando. Redefinir o direito de representação confirmando exclusivamente
o dos sindicatos, partidos políticos e entidades que forem capazes de
conquistá-lo e mante-lo por livre eleição e financiamento dos seus
representados é o único modo objetivo de sairmos do feudalismo e começarmos a
nos beneficiar do processo de depuração recorrente inerente aos sistemas
democráticos. A “cláusula de barreira” que o STF matou não era mesmo a melhor
solução pois cuidava só de represar a lama incessantemente produzida por um
sistema torto e corrupto que acabará sempre, inevitavelmente, em “desastres da
Samarco” com “danos ambientais” permanentes.
Para que
“as instituições funcionem” de fato não é a letra, é a essência democrática da
Constituição, definida nos seus artigos iniciais, que tem de ser imposta acima
de tudo e de todos, começando pelo desafio jurídico de toda a vasta massa de
exceções e penduricalhos esboçados nos que lhe foram acrescentados na sequência
e estão em conflito insanável com eles.
Quando
não foram diretamente protagonizadas pelo Poder Judiciário, como as da
Inglaterra do século 17 que criaram a democracia moderna, as poucas revoluções
verdadeiras que a história da humanidade registra – não confundir com os banhos
de sangue recorrentes para troca de comandantes de monarquias ou ditaduras das
culturas latinas – consolidaram-se (ou não) nas reformas jurídicas que foram
empurrando a humanidade para fora do padrão geral do privilégio
institucionalizado e para dentro da igualdade perante a lei cujo corolário
obrigatório é sair do “a cada um segundo o seu grau de cumplicidade para com os
crimes do rei” e enveredar pelo muito menos venenoso “a cada um segundo o
esforço investido na obra coletiva”.
O que
houve de empolgante no atual processo brasileiro foi exatamente o fato de ter ele
partido do Poder Judiciário. Com as condenações do “mensalão” o Brasil acordou
para o fato de que não é obrigatório, afinal, que o crime vença sempre, e foi
às ruas para comemorar esse quase milagre e empurrar para adiante a “marolinha”
que, a partir de Curitiba, assumiu ares de tsunami e ameaça fazer escola.
O Brasil
Velho está vivo como prova o fato de todos os ladrões estarem presos e
continuarem soltos os seus chefes. Mas o Novo não dá sinal de abandonar a
arena. Seria uma excelente bandeira para essa OAB reconciliada com sua tradição
histórica de alinhamento com o que é justo tomar a si, junto com os movimentos
de rua, esse “Mutirão pela Igualdade
Perante
a Lei”, de modo a forçar o país inteiro a tomar posição em relação ao que ha de
mais essencial numa ordem realmente democrática.
VESPEIRO
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