Depoimento
de Ilona
Becskeházy, em 13.06.2016
Nas
reuniões públicas sobre política educacional de que participei nas últimas
semanas sobre a BNCC, incluindo uma na Câmara dos Deputados, o assunto
principal em pauta foi flagrantemente desviado para o tema do Movimento Escola
sem Partido. Eu já tinha ouvido falar, sem nunca ter realmente entendido como o
Movimento atuava. Mas como nessas reuniões o Movimento estava sendo acusado de
promover leis de censura e mordaça ao trabalho do professor, fui ver do que se
tratava.
Não é
bem isso, o Movimento
Escola sem Partido é uma organização de pais e estudantes contra o uso
das salas de aula e ambientes educacionais, tanto na educação básica quanto no
ensino superior, para o proselitismo político, religioso e ideológico de
qualquer natureza. O grupo existe desde 2004 e é coordenado por Miguel Nagib,
Procurador de Justiça do Estado de São Paulo.
Li
praticamente todo o site e não vi ali nenhuma proposta de censura ou de
cerceamento ao trabalho do professor ou de doutrinação de direita para escolas,
professores ou alunos, como vem sendo acusado por algumas pessoas ou grupos.
Pelo contrário, o que o Movimento defende é a garantia da pluralidade de visões
a cerca de temas tratados em escolas e universidades.
Há 3 pontos que gostaria de destacar
no site:
1) eles
representam, entre outras iniciativas, um conjunto de ações de judicialização
do direito dos alunos a terem aulas sem nenhum tipo de doutrinação política,
religiosa, ideológica ou de gênero, os exemplos são propostas de projetos de
lei que garantam esse direito a serem analisadas por assembleias legislativas
estaduais ou câmaras municipais – em cada local cada corpo legislativo decide
que texto vai fazer avançar. A proposta inicial do Movimento não é de forma
nenhuma restritiva às liberdades individuais. Pelo contrário.
2) o
site traz vários exemplos de como essa doutrinação acontece e como se proteger
dela, mesmo que sem a ajuda de legislação
3)
também há no site uma sessão chamada “flagrando o
doutrinador“, com a qual me identifiquei muito e a qual gostaria de
detalhar aqui.
Eles
apresentam uma lista de 17 situações típicas de doutrinação ou de cerceamento
da liberdade de expressão dos alunos, pelas quais uma pessoa pode identificar
sutilezas da doutrinação. Fiz um exercício de memória e me senti
representada, lembrando de situações pelas quais passei, em 10 delas. Acho
sim que o tema e o Movimento são assuntos relevantes no debate educacional no
Brasil, que precisam ser levados a sério e ser melhor conhecidos por
professores, pais e alunos, além dos agentes governamentais. Mesmo não sendo
prioridade neste momento quem que se debate a base nacional curricular, essas
situações são sim reais e podem cercear o direito de alunos e de profissionais
da educação à liberdade de pensamento e de expressão. Portanto, devem ser
abordadas com atenção e serenidade em algum momento.
Ao longo
de toda a minha vida escolar, universitária e acadêmica, me senti cerceada,
oprimida e desrespeitada em situações como essas abaixo:
- se
desvia freqüentemente da matéria objeto da disciplina para assuntos
relacionados ao noticiário político ou internacional;
impõe a
leitura de textos que mostram apenas um dos lados de questões controvertidas;
- ridiculariza
gratuitamente ou desqualifica crenças religiosas ou convicções políticas;
- pressiona
os alunos a expressar determinados pontos de vista em seus trabalhos;
- alicia
alunos para participar de manifestações, atos públicos, passeatas, etc.;
- permite
que a convicção política ou religiosa dos alunos interfira positiva ou
negativamente em suas notas;
- não só
não esconde, como divulga e faz propaganda de suas preferências e antipatias
políticas e ideológicas;
- omite
ou minimiza fatos desabonadores à corrente político-ideológida de sua
preferência;
- promove
uma atmosfera de intimidação em sala de aula, não permitindo, ou desencorajando
a manifestação de pontos de vista discordantes dos seus;
- não
impede que tal atmosfera seja criada pela ação de outros alunos;
Engraçado
é que essas situações ocorreram em instituições ditas laicas e modernas. Nunca
passei por uma situação dessas no colégio de freiras católicas onde fiz o
fundamental II, ou na Fundação Getúlio Vargas, onde fiz uma longa
especialização. Essas situações aconteceram de forma mais grave e agressiva na
UFRJ, onde fiz minha graduação e no Departamento de Educação da Puc-Rio, onde
fiz meu mestrado.
O
Movimento Escola sem Partido faz ainda uma proposta de campanha de
esclarecimento aos alunos e pais que deveria ser disseminada nas escolas e
ambientes de ensino sob a forma de cartazes ou similares. Leiam e julguem por
si mesmos.
Proposta:
- O
professor não abusará da inexperiência, da falta de conhecimento ou da
imaturidade dos alunos, com o objetivo de cooptá-los para esta ou aquela
corrente político-partidária, nem adotará livros didáticos que tenham esse
objetivo.
- O
professor não favorecerá nem prejudicará os alunos em razão de suas convicções
políticas, ideológicas, religiosas, ou da falta delas.
- O
professor não fará propaganda político-partidária em sala de aula nem incitará
seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas.
- Ao
tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas, o professor
apresentará aos alunos, de forma justa – isto é, com a mesma profundidade e
seriedade –, as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas
concorrentes a respeito.
- O professor
não criará em sala de aula uma atmosfera de intimidação, ostensiva ou sutil,
capaz de desencorajar a manifestação de pontos de vista discordantes dos seus,
nem permitirá que tal atmosfera seja criada pela ação de alunos sectários ou de
outros professores.
Ilona Becskeházy
Atua
desde 1996 no desenho e implementação de projetos de educação. É Mestre em
Educação pela PUC-Rio, com bolsa Proex da Capes (2012/13) e bolsa Nota 10
Faperj (2013/14) e Doutoranda em Educação na USP. Atua como consultora e atualmente
é colunista do boletim Missão Aluno da Rádio CBN e da Revista Gestão
Educacional.
https://exequi.com/2016/06/13/1817/
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