Jorge
Maranhão
As iniciativas do recém-empossado presidente da
Argentina, Mauricio Macri, trazem a esperança de que, pelo menos do lado dos
“hermanos”, o país finalmente vai trilhar o caminho do livre mercado, bem
distante do que se viu nos tempos do intervencionismo kirchnerista. Menos
impostos, menos demagogia social e menos tutela; mais liberdade de escolha e de
iniciativa dos cidadãos.
E aqui no Brasil, como estamos?
Ainda no ano passado, em um de seus oportunos
artigos, o economista Gustavo Franco já fazia o alerta: “o Brasil não gosta do
sistema capitalista. Os congressistas, jornalistas e universitários não gostam
do capitalismo.” Mas se, de fato, temos um país eminentemente capitalista, de
que tipo ele seria? Na verdade, trata-se de um grande erro chamar o que temos
hoje no Brasil de capitalismo, como tantos fazem através de expressões como
“capitalismo de Estado, de compadrio”, “neopatrimonialista”, “capitalismo
oligopolista” e outros. Ora, quando começamos a adjetivar muito um substantivo
é sinal de que o mesmo está perdendo a substância. Classicamente, o capitalismo
é o sistema econômico baseado no livre mercado, onde a concorrência é o melhor
traço para lhe definir a natureza. Além de outros consagrados valores morais da
tradição ocidental judaico-cristã, como a propriedade privada, a liberdade de
empreender, o respeito à lei e aos contratos, e a competitividade dos agentes
econômicos que determina preços.
Diríamos mesmo que o fenômeno da concorrência
capitalista, para além de garantir a riqueza das nações, garante a própria
liberdade de escolha do cidadão, e, por consequência, a sua soberania política.
Não é apenas um, dois ou três desses quesitos. Só há capitalismo de fato quando
todos eles estão presentes. E quem, em sã consciência, pode garantir isso em se
tratando de Brasil?
Medidas que vêm sendo tomadas há mais de uma
década, como a polêmica “nova matriz econômica” – e seus campeões nacionais,
subsídios setoriais pontuais e crédito a fundo perdido para alguns eleitos
nacionais ou estrangeiros – fracassaram de maneira retumbante, jogando o país
na pior crise de sua história. Não por outra razão, nenhuma delas expressa
traços mínimos do que possa se chamar de livre mercado ou mesmo de capitalismo
concorrencial. Ao contrário, observou-se no Brasil um fenômeno de oligopolização
de vários setores produtivos, não por acaso financiados pelo Estado, e
responsáveis diretos pelo recrudescimento inflacionário dele decorrente. Ainda
assim, o nosso imaginário social vê o livre mercado e o capitalismo como
aqueles dos primórdios da revolução industrial inglesa da virada dos séculos
XVIII para o XIX, com sua produção em ritmo cada vez mais acelerado, zero de
direitos trabalhistas, salários aviltantes e um índice altíssimo de mortes no
trabalho.
Esta é a imagem que nos é repetida constantemente
por setores da mídia, acadêmicos e grupos políticos esquerdistas. Ricos
espoliando pobres, e só. E mais: que a economia planejada, controlada pelo
Estado, é a única forma de se evitar desigualdades sociais e garantir vida
digna a toda população. Pura e perversa falácia. Ainda em 1920, Ludwig Von
Mises demoliu essa tese, ao mostrar que, sem a propriedade privada dos meios de
produção, o cálculo econômico é impossível. Mises explicou que, nesse sistema,
nenhum governo é capaz de saber o que produzir, quanto produzir e quais
recursos utilizar para produzir o que quer que seja, pois somente aqueles
que são proprietários dos meios de produção podem alocar racionalmente o
escasso capital de investimento. Ou seja, são capazes de determinar custos efetivos
e fixar preços de maneira competitiva. E, sem preços competitivos, não temos
ganhos de produtividade, não temos eficiência econômica, e muito menos
condições de planejar os rumos da economia. E isso torna a tal “economia
planejada” uma contradição em termos. A academia sabe disso muito bem. Daí ser
maior a sua responsabilidade na perpetuação dessa falácia em nosso imaginário
social. Junte-se políticos demagogos a esta academia amestrada pelo Estado, e
não teremos outro resultado se não a maior desigualdade social, o imposto
perverso da inflação e a crise de escassez e desemprego flagelando exatamente
os mais pobres.
Todavia, existe hoje no mundo uma conscientização
sobre a importância de se esclarecer isso aos cidadãos comuns. Alguns
movimentos internacionais, como o Capitalismo Consciente, se dedicam a essa
tarefa, ao mesmo tempo em que divulgam para os empresários novas práticas, em
direção a uma nova forma de se aperfeiçoar o livre mercado e fazer do
capitalismo oligopolista um capitalismo concorrencial e moderno. André
Kaufmann, um dos representantes do movimento no Brasil, declarou em depoimento
ao programa Agentes de Cidadania, aqui da Voz do Cidadão, que, hoje, o mundo
empresarial reconhece que a percepção sobre o que é o capitalismo vem sendo deturpada,
o que vem gerando uma rejeição pela sociedade. Para ele, o movimento procura
conscientizar o mundo corporativo de que “ganhar muito dinheiro e fazer o bem
não são incompatíveis.”
É preciso uma grande campanha da cidadania para
esclarecer as distorções sobre o capitalismo e resgatar o valor do mercado da
corrupção geral dos valores. Pois se a mídia de massa sensacionaliza a
onipotência do Estado, esquece que este surgiu exatamente para servir ao
mercado e não o contrário. Pois, o que o Estado não pode ser de maneira alguma
é empreendedor, interventor e tutelador do cidadão.
Como disse Gustavo Franco: “Seria maravilhoso se,
junto aos desdobramentos da Operação Lava-jato, pudéssemos rever a vasta
constelação de políticas públicas discricionárias e seletivas que tanto
favorecem mercados cativos, desvios éticos e prejuízos ao nosso crescimento”.
Para tanto,
precisamos urgentemente, e antes de mais nada, decidir que capitalismo
queremos. O que não podemos é continuar nos autoenganando de que há alguma alternativa
viável de economia planejada e coletivista para o país.
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