quarta-feira, 2 de julho de 2014

Um Governo de Merda

Por Carlos I. S. Azambuja

“Esta é uma guerra não declarada. Um Vietnã calado, como disse o companheiro Salvador Allende” (Carlos Altamirano, 10 de janeiro de 1973, no teatro Caupolicán). Carlos Altamirano foi Secretário-Geral do Partido Socialista, deputado e senador. Durante o governo de Salvador Allende, em sua qualidade de Secretário-Geral do PS se distinguiu por ser um dos dirigentes mais intransigentes e mais esquerdistas; convocava à revolução armada com seu popular slogan‘avançar sem transar’

Liderando a via da insurreição armada contra a burguesia, em 9 de setembro de 1973, no Estádio Nacional do Chile, dois dias antes da deposição de Allende, clamou por um enfrentamento armado, por todos os meios, à ofensiva golpista, descartando qualquer tipo de diálogo, incitando os marinheiros a atentar contra a oficialidade da Armada em uma alegoria à figura do Encouraçado Potenkim. Após o 11 de setembro exilou-se em Cuba e, no exílio, em Argel, em 1978, foi reeleito Secretário-Geral do Partido Socialista. É autor do livro “Dialética de uma Derrota” (1977). Regressou ao Chile em 1993, onde vive, desvinculado da política ativa.

O livro “La Verdad Histórica-El Ejercito Guerrillero”, editado no Chile em setembro de 2000, nos ajuda a entender a tragédia chilena, o absoluto desprezo pelos direitos humanos que caracterizou o governo da Unidade Popular chefiado por Salvador Allende, um senador do Partido Socialista eleito em 1970, empossado em 4 de novembro desse ano e deposto em 11 de setembro de 1973. 

Nesses três anos foram 96 mortos, 919 feridos, 165 sequestrados e 18 torturados, num total de 1.198 vítimas do arbítrio esquerdista, 68 expropriações a bancos, 34 mil ocupações de indústrias e empresas privadas e 9 mil ocupações de fazendas e casas na área rural. Os direitos humanos dos cidadãos foram violados no econômico e no social. No dia seguinte à sua posse, no Estádio Nacional de Santiago, falando para uma multidão, Allende expressou “Hago mía la frase de Fidel Castro: en este gobierno se podrán meter los pies, pero jamás las manos”.

Menos de um ano depois, em 4 de fevereiro de 1971, em Valparaíso, Allende declarou: “Yo soy presidente de la Unidad Popular, tampoco soy presidente de todos los chilenos, no soy hipócrita, yo no soy presidente de todos los chilenos”. Em 8 de dezembro de 1971, Allende declara: “Esta revolución tiene un costo social mínimo”.
Mais de 20 mil estrangeiros indesejáveis – guerrilheiros, em sua maioria - em seus próprios países ingressaram no Chile nesse período e passaram a instruir e integrar o Exército Guerrlheiro chileno para a tomada do poder, e a implantação de uma república democrática popular semelhante às do Leste-Europeu. 

Esses indesejáveis em seus próprios países foram milhares de indivíduos de 46 nacionalidades, com exceção do general cubano Patrício de La Guardia Font e dos Oficiais e Soldados desse país enviados por Fidel Castro, como integrantes e instrutores do Exército Guerrilheiro que se organizava no Chile desde 1970. Também escapam ao conceito de expulsos de seus países por indesejáveis, os 1.916 Oficiais e Suboficiais do Exército e da Marinha soviética, chegados ao Chile como engenheiros e assessores.

Em 1967, quando o senador Salvador Allende, presidente do Senado, foi eleito em Cuba presidente da OLAS-Organização Latino-Americana de Solidariedade – um organismo que deveria revolucionar o continente -, eclodiram no Chile e em outros países da América Latina os primeiros atentados, assaltos e assassinatos, porém em 1970 teve início a verdadeira guerra subversiva até sua total e absoluta derrota em 1976, pelas Forças Armadas chilenas, ao passo que no Brasil essa derrota ocorreu em 1974.

O envio de milhares de chilenos dos partidos Comunista, Socialista e do MIR a cursos de instrução militar em Cuba, Argentina, Alemanha Oriental, Argélia, Líbia, União Soviética e outros países, nos quais os comunistas chilenos receberam treinamento nas formas mais sofisticadas de extremismo, foi a contribuição do governo Allende ao Direito e à cultura dos chilenos: a construção de um Exército Guerrilheiro que assassinou, roubou, torturou e seqüestrou. O “La Verdad Histórica-El Ejército Guerrillero” dá a conhecer os nomes e nacionalidades de mais de 20 mil homens e mulheres que integravam o Exército Guerrillero Internacional que se queria construir no Chile.

A quantidade total de cubanos que ingressaram no Chile é desconhecida, porém se sabe que entre 1970 e dezembro de 1972 foram autorizados pelo governo a entrar no país 4.875 cubanos, dos quais 721 eram mulheres. Todos utilizaram passaportes oficiais ou diplomáticos, o que lhes dava imunidade, obrigando as autoridades chilenas a deixá-los sair do Chile sem problemas após o 11 de setembro de 1973. Patrício de La Guardia Font – amigo pessoal de Fidel Castro foi, posteriormente, em 1987, em Cuba, submetido a processo e condenado a 30 anos de prisão, sob a acusação de ser narcotraficante -, por exemplo, nascido em 1938, entrou no Chile em 27 de agosto de 1973 com o passaporte diplomático número 1050. 

Patrício de La Guardia, no entanto não era um diplomata, e sim o General Comandante-em-Chefe das Forças Cubanas no Chile e, ao mesmo tempo, comandante do Exército Guerrilheiro que se organizava para a tomada definitiva do país pelos marxistas. Ao voltar a Cuba foi condecorado por Fidel Castro.

Na embaixada cubana estavam lotados, como diplomatas, 12 oficiais do Exército cubano e da Direção Geral de Inteligência. Além disso, cerca de 100 guerrilheiros cubanos entraram clandestinamente no Chile através da Bolívia.

Entre os “diplomatas” que ingressaram no país, o segundo chefe da Inteligência cubana, Luis Fernandez de Oña, que se casou com a filha de Salvador Allende, Beatriz “Taty” Allende, passou a desempenhar funções de chefia do GAP-Grupo de Amigos do Presidente, responsável pela segurança de Allende. Em Cuba, no ano de 1977, Beatriz Allende, já separada de Luiz Fernandez de Oña, teria sido assassinada e sua morte apresentada como suicídio.

Como se recorda, Allende, por não ter obtido maioria absoluta e sim apenas 36,5% dos votos na eleição presidencial, teve sua eleição confirmada pelo Congresso após assinar um termo afirmando que respeitaria a Constituição. Ao final de seu governo, 80% da economia estava em poder do Estado. Allende, que nunca fez segredo de sua ligação com a Unidade Popular, o MIR, os partidos comunista e socialista, do qual era militante, e o Movimento de Unidade Popular Unitária (MAPU), tão logo assumiu a presidência colocou em liberdade todos os militantes do MIR e, entre eles, diversos líderes ganharam a liberdade - Luciano Cruz, Miguel Enriquez, Edgardo Enriquez, Humberto Sotomayor, Sergio Zorrila, Bautista Von Schouwen, Joel Marambio e seu sobrinho Andrés Pascal Allende, filho de sua irmã, deputada Laura Allende -, que se encontravam presos por diversos delitos, entre os quais expropriações a bancos, cometidas no governo anterior. 

Um dos guerrilheiros então libertados, Adrian Vasquez, foi imediatamente nomeado presidente do INDAP-Instituto de Desarrollo Agropecuario. O MIR, através de Andrés Pascal Allende mantinha contatos com setores democráticos das Forças Armadas. Nesses setores democráticos, muitos militares eram militantes miristas.

Um dólar, quando Allende assumiu o governo, valia 20 escudos e, em setembro de 1973, quando foi deposto, o dólar estava a 2.500 escudos. Ou seja, uma inflação de cerca de 12 mil por cento! Dos cerca de 3 mil produtos domésticos básicos, 2.500 não eram encontrados pelo povo. Em 7 de setembro de 1973, quatro dias antes de sua deposição, Allende declarou publicamente que havia farinha de trigo somente para mais três dias.

Na residência oficial de El Cañaveral foram apreendidos 147 fuzis semi-automáticos, 10 carabinas semi-automáticas, 10 carabinas Mauser, 1 carabina Winchester, 54 pistolas automáticas, 13 rifles, 28 pistolas semi-automáticas, 11 revólveres, 2 pistolas para disparo de bombas de gás lacrimogênio, 3 metralhadoras, 9 lançadores de foguetes, 2 canhões sem recuo, 1 morteiro, 58 baionetas para fuzis, 38 granadas de mão, 625 bombas-caseiras, 832 bombas com alto poder explosivo, 68 lança-granadas, 236 minas anti-tanque, 432 bombas e gás lacrimogênio, 12 lança-gás paralisante, 25.000 detonadores elétricos, 1.500 detonadores a mecha, 22.000 metros de estopim, 3.600 metros de cordão detonante, 625 kg de cloreto de potássio, 50 caixas de dinamite, 250 kg de TNT, 750 coquetéis molotov, 230 litros de éter sulfúrico, mais de 80.000 carregadores de todos os tipos e outros equipamentos. Todo esse armamento foi exposto à imprensa, nos jardins de El Cañaveral, após a deposição de Allende e as fotos publicados em jornais nacionais e internacionais.

Toda essa introdução nos conduz ao principal tema deste artigo: conhecer o órgão de segurança pessoal de Salvador Allende, o Grupo de Amigos do Presidente (GAP). A segurança de Allende não estava a cargo das Forças Armadas ou da Polícia, como ocorre em todos os países. Para custodiar um presidente permanentemente desconfiado e seguindo os conselhos de seu assessor espanhol Joan Garcés, Allende preferiu um grupo de militantes do MIR e de seu Partido Socialista, com armamento de guerra. 

O GAP, constituído por militantes comunistas e por vários delinqüentes comuns, era um grupo de indivíduos soberbos e altaneiros que não respeitava as leis e nem ninguém. Foram descobertos vários casos de membros do GAP comprometidos com assaltos, roubos e assassinatos. A secretária particular de Allende, Myria Contreras, conhecida como “La Payta” tinha registradas em seu nome cerca de 30 viaturas utilizadas pelo MIR e pelo GAP.

O treinamento militar dos membros do GAP era mantido, no Chile, no Centro de Instrução Militar El Canaveral, local onde se encontrava o seu principal depósito de armamento. “El Canaveral”, como se sabe, nada mais era do que a casa de campo do presidente Allende. O GAP era, na verdade um grupo armado de combatentes com instrução militar completa, chefiado por um membro do Serviço de Inteligência cubano. 

Todos haviam recebido instrução militar avançada no Exército cubano. O GAP era, enfim, uma associação ilícita, que cometeu delitos que jamais foram julgados, como, por exemplo, o roubo de numeroso armamento por militantes do MIR desertores do GAP.

A chefia do GAP era constituída por dez pessoas: um cubano do Diretório Geral de Inteligência (DGI), Luiz Fernandez de Oña e nove militantes do MIR – Max Joel Marambio (“Ariel Fontana”), Domingo Bartolome Blanco Tares (“Bruno Gonzalez”), Marcelo Shilling (“Luiz Fernandez”, “Gaston” ou “Tribilin”), Jaime Gilson Sotelo Ojeda (“Carlos Alamos”), Mario Ramiro Melo Pradenas, Danilo Bartulin Zodie (“Ariel”), Juan José Montiglio Murua (“Aníbal Salcedo”), Fancisco Argandoña Donoso (“Mariano Veliz”) e Pablo Fernando Sanchez Garrido (“Rubén Azócar”), todos treinados pelo Exército cubano e todos utilizando codinomes ou nomes falsos. O efetivo do GAP era de 134 membros, inclusive um brasileiro exilado, Tulio Roberto Cardoso Quintiliano, fuzilado ao ser preso, no próprio dia 11 de setembro.

O GAP contava com um centro de instrução muito especial: a casa de campo do presidente Allende, conhecida como Centro de Instrução Militar El Cañaveral. Nesse Centro era ministrada a seguinte instrução militar:

- instrução de armamento e tiro com diversos tipos de pistolas, fuzis e metralhadoras;
- instrução de explosivos, repassando o que foi aprendido em Cuba;
- instrução de Táticas Militares, também repassando o aprendido em Cuba;
- instrução de Segurança Pessoal, voltada principalmente para a segurança pessoal de Allende;

A Casa Presidencial de Tomás Moro, onde vivia o presidente era, ao mesmo tempo, outro quartel do GAP, e ali se encontrava o segundo depósito de armamento do grupo.
No palácio La Moneda, local de trabalho do presidente, o GAP, com autorização de Allende, como em El Cañaveral e Tomás Moro, possuía o terceiro depósito de armamento.

Após 2 anos de governo (1971-1973), ignorando o documento que assinara se comprometendo a cumprir a Constituição, a Câmara dos Deputados informou aos ministros e às Forças Armadas, em 22 de agosto de 1973, que Salvador Allende estava na ilegalidade, por “grave quebra da ordem constitucional e legal”, selando a sorte do governo. Dia 11 de setembro, vinte dias depois, as tropas das Forças Armadas amanheceram nas ruas das principais cidades. Allende foi, por várias vezes, instado pelos ministros militares a renunciar, conforme se pode ouvir no CD vendido anexo ao livro “Interferência Indevida”, escrito por Patrícia Verdugo – esse CD narra, ao vivo, as comunicações entre os comandantes militares desde as primeiras horas de 11 de setembro. 

Allende recusou-se a renunciar, pois se dizia muy macho. Foi avisado que o PalácioLa Moneda, onde se encontrava, seria bombardeado. Fez pouco caso e parece não ter acreditado, mesmo porque o La Moneda está localizado no centro de Santiago e não em um local isolado. Vendo o bombardeio e o Palácio começando a arder, cometeu o suicídio com uma arma que lhe fora presenteada por Fidel Castro.

O MIR, o PC e o PS chilenos, o MAPU e os demais grupos de esquerda então existentes, bem como os famosos cordones industriales, que por várias vezes anunciaram seu respaldo a Allende, chegando a pichar paredes com a consigna “Este gobierno es una mierda, mas es nuestro gobierno”, não apareceram em 11 de setembro de 1973 para defender “la mierda”.

Finalmente, um detalhe muito pouco conhecido, divulgado no Brasil por Olavo de Carvalho em 24 de setembro de 2005 com o artigo O Mensalão de Allende e talvez nunca antes pela mídia nacional: Salvador Allende, assim como Luiz Carlos  Prestes, foi um funcionário remunerado do KGB desde os anos 50. Após ter sido eleito presidente do Chile, em 1970, quem recebia seus informes e efetuava os pagamentos era o kamarada Svyatoslav Kuznetsov, o representante do KGB no Chile. Portanto, em castellano, muy macho, pero un traidor de su pátria!.


Carlos I. S. Azambuja é Historiador.

Transcrito: www.alertatotal.net/   01 07 14

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